Capítulo 2- Pesadelos & Confusões

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Três dias se passaram desde que o agente Ethan Uchida deixou seu telefone com Carolyn. Ela não ligou. Devido ao excesso de outros casos, alguns prioritários para a agência, os agentes envolvidos esqueceram a atenção especial ao caso Mattel.

A vida de Christopher decorreria de modo pragmático, tudo arquitetado, não fossem os traumas que o atormentavam. Mais uma noite rolava na cama, suando frio, com as mãos fechadas em punho e lençóis presos nos dedos. Em seu repetido sonho, ajoelhava-se frente a um espelho d'água, procurava seu próprio reflexo entre uma e outra vitória-régia. Algo começara a emergir lentamente na água. Christopher debateu-se de um lado ao outro na cama, negando a lembrança. Queria gritar por ajuda, que a tirassem de lá, mas o ar lhe sufocava os pulmões. O grito saiu alto, e o som de seu próprio horror lhe acordou. O choro estava em sua garganta. Sentou-se com os cotovelos nas coxas, agarrou os cabelos e sentiu lágrimas inundarem sua face.

O dia amanheceu, tomou um banho demorado e vestiu um alinhado terno Gucci. Por diversas horas no dia quis sucumbir à depressão que a lembrança suscitava, mas com a agenda lotada de trabalhos, conseguiu mascarar a amargura com o distanciamento. Ele teria que acompanhar a investigação das equipes que atuavam nas docas e ouvir o relatório da equipe que trabalha monitorando o cartel de Tijuana.

Quarta-feira, uma denúncia anônima informou a iminência de uma negociação alta de êxtase em uma boate em Beverly Hills. Ao registrar que a informação levava à boate de Aleksey Mattel, Christopher dispôs-se a cabecear ele mesmo a equipe de investigação.

Por noites seguidas não dormiu, usando cápsulas de guaraná e cafeína para manter-se acordado. De dia cumpria sua rotina na Agência e à noite seguia com a investigação nas ruas onde jovens de classe alta transitavam pelas calçadas drogados e bêbados.

Uma parte defensiva de seu organismo protelava ao máximo dormir para evitar os pesadelos que iniciavam no mínimo espaço de inconsciência. Após o banho frio na madrugada de sábado ao chegar da noite de plantão, pôs na boca mais algumas cápsulas de composto de cafeína e guaraná e assistiu a documentários com um copo fumegante de café com chocolate amargo na mão até o sol surgir.

Christopher costumava caminhar ou pedalar aos sábados pela manhã. Desceu pelas escadas nove andares para se aquecer, ajustou no rosto os óculos aviador e arrumou o boné. Antes de sair do prédio, seu telefone tocou.

Bom dia, Chris ‒ seu pai o cumprimentou empolgado do outro lado da linha.

‒ Olá, pai.

Que voz desanimada é essa?

‒ Estou exausto ‒ confessou. ‒ Não tenho boas noites de sono ‒ explicou ao pisar o calçadão.

Então acho que meu telefonema será proveitoso. Estou pensando em voar para Nevada. Vamos comigo? ‒ propôs. ‒ Podemos ver se seu irmão larga um pouco Mariah e vai conosco a um cassino em Vegas.

O filho suspirou e balançou a cabeça.

‒ Eu estou em uma investigação ‒ revelou sem ânimo. ‒ Não posso sair da cidade.

E essa investigação seria sobre Aleksey Mattel? ‒ seu velho questionou preocupado. Christopher avistou um banco e sentou-se. A conversa renderia, presumiu.

‒ Sim.

Ouviu um suspiro longo.

Filho, eu já disse para deixá-lo em paz ‒ advertiu austeramente.

‒ Só vou deixá-lo em paz quando a justiça for feita. Não posso ser um profissional completo se não resolvo um caso de casa.

Não existe um caso de casa... Se quer fazer justiça, faça outra faculdade e vá para os tribunais acusar, como seu irmão. E, se prefere julgar, siga a minha carreira. Você não precisa perseguir ninguém para contribuir para a Justiça no país ‒ discursou cansado.

Flor de LótusOnde histórias criam vida. Descubra agora