Despertei naquela manhã devido à brisa gelada em minhas costas. Estava deitada de bruços e as costas descobertas, e mesmo de camisola, o vento gelado me fez arrastar o cobertor mais para perto e virar para o lado, incomodada. Eu não duvidava que Clarkson tivesse puxado a coberta para si, ele se mexia constantemente durante a noite, coisa com a qual eu me acostumara depois de doze anos de casamento. Porém um par de braços fortes que me envolveram assim que eu encostei em seu peito descoberto me fez abrir os olhos, sorridente. Era incrível como Clarkson conseguia tirar rapidamente qualquer mau humor matinal meu mesmo em sono profundo.
Olhei para o relógio de cabeceira com os olhos semi cerrados por cima do ombro de meu marido. Meu coração pulou uma batida quando vi que eram quase dez da manhã. Eu nunca dormia até tão tarde! O que aconteceu? Provavelmente a festa de recepção ao franceses deve ter me cansado dessa forma. Em dois dias dormi pouquíssimo preparando cada detalhe, aquilo cabia somente à mim, já não era tão complicado quanto nos primeiros anos, afinal já me acostumara com como os franceses gostavam das festas. Cada costume respeitado, tudo organizado e a culinária tipicamente deles. Não apreciavam muito o inglês; mas nem todos ali falavam francês. Ainda lutava para consertar esse pequeno detalhe.
Havíamos nos aliado ao país há pouco tempo. O rei e a rainha, junto com a princesa Daphne, dormiram no palácio somente naquela noite, e eu sabia perfeitamente bem que era contra qualquer regra de etiqueta acordar tão tarde assim e deixá-los esperando. Não pensei muito em pular da cama, o frio de meu corpo desvanecendo rapidamente. Clarkson resmungou com minha repentina ação, e tomei um tempo para sorrir para seu rosto perturbado e mau humorado da manhã. Mesmo assim, seus olhos azuis recém abertos e sonolentos distraíam minha mente a lugares que não deveriam ser visitados naquele momento.
¬– Querido, uhm... sinto muito em te acordar. São quase dez horas. Devem estar nos esperando. – passei uma mão por seu braço delicadamente, balançando-o um pouquinho para chamar sua atenção.
Levantando de solavanco, quase me fez cair deitada na cama novamente, mas me mantive firme segurando em seu braço.
– Dez horas?! Desde quando perdemos hora assim?! – estava prestes a concordar. Mas uma pequena abertura na porta me fez olhar assustada para a mesma, quem entraria assim sem bater? Por todos os céus, eu estava de camisola! Assustada, cobri o corpo com o lençol.
Soltei um suspiro aliviado e larguei o lençol vendo que era apenas Maxon, levantando para abraçá-lo. – Mamãe, a senhora está bem? Eu e Daphne tivemos que ir na cozinha pegar alguma coisa para comer, estávamos esperando você e o papai para o café da manhã. – ele revelou em toda sua inocência, aumentando ainda mais minha preocupação e pensando qual desculpa daríamos aos monarcas visitantes.
– E os pais de Daphne, Maxon? Onde estão? – Clarkson perguntou, parecendo ler meus pensamentos.
– Eles disseram para não se preocuparem com isso e que comeriam nos quartos. Acho que já tomaram café.
– Ah, Deus... – vindo da boca de Maxon, como saberíamos se eles disseram aquilo para realmente não nos preocuparmos ou sendo cínicos? Não os conhecia muito bem, mas sabia que era uma falta com a família real. – Meu amor, por que não volta a brincar com Daphne? Estão livres por hoje. Eu e seu pai precisamos nos trocar e ir falar com os pais dela. Se os encontrar, já adiante que estamos indo e que sentimos muito, tudo bem? – beijei o topo de sua cabeça e ajeitei a coroa que pendia para o lado em sua cabeça. Ele assentiu e se retirou, enquanto eu analisava o vestido que as criadas preparam para aquela manhã e deixaram no quarto na noite anterior. Era um azul profundo e escuro de mangas longas e brilhos na barra e na cintura para quebrar a cor escura, mas não tão quente quanto eu esperava para o dia frio que nos esperava. Arrumei-me no banheiro enquanto Clarkson fazia o mesmo e trocava suas roupas silenciosamente, e ao chegarmos a porta esperei que ele estendesse o braço para que eu o tomasse como sempre. Ao invés disso, Clarkson apenas ficou ali, me encarando, como se tivéssemos tempo, mas mesmo assim permiti, corando profundamente com seus olhos cravados em mim. Ele nunca falhara em me deixar sem fôlego.
– Não sei por que ainda me admiro como você consegue ficar tão bela mesmo depois de se arrumar na pressa. Na verdade, você ficaria bela com qualquer coisa. Mas sabe disso. – ele depositou um breve beijo em meus lábios e apertou minha mão – Vamos. Temos que lidar com os simpaticíssimos monarcas da França. – ele me encorajou e voltou a postura de sempre, enquanto eu ainda permanecia boba com suas palavras. Nunca me cansava de ouvir tais coisas, mas mal ele sabia que o efeito que ele causava em mim era milhares de vezes mais intenso.
Maxon e Daphne brincavam no jardim, correndo um atrás do outro. Eles tinham quase a mesma idade, com a diferença de que ela era alguns meses mais velha. Eu era verdadeiramente grata por Daphne ter entrado na vida de Maxon, afinal, ele não tinha e nem podia fazer muitos amigos. Sua vida era restrita aos muros do palácio, tendo permissão para explorar quando viajava com Clarkson apenas. Doía-me o coração vê-lo tão solitário, por isso ainda não desistira de engravidar uma última vez, mas nada ainda. Eu e meu marido decidimos que não colocaríamos tanta pressão e expectativa desta vez, o que tivesse de ser seria, mesmo assim, por Maxon, eu faria até o impossível. Clarkson dizia que eu só não ainda lhe dera a lua porque ele não havia pedido, e era verdade. Um irmão com certeza traria felicidade aos seus dias, mas agora ele já seria bem mais velho.
E se fosse uma menina?, pensei, começando a me perder em meus pensamentos. Observar Maxon e Daphne trazia pensamentos os quais eu não queria por enquanto, ainda que de qualquer forma vê-lo feliz com ela por perto aquecia meu coração.
Caminhamos até o Grande Salão e nos encontramos com o rei e a rainha. Eles não pareceram felizes com a nossa nada agradável recepção naquela manhã, não os culpava. Clarkson parecia nervoso em relação à aliança que tínhamos acabar ali, e para mim aquilo era um exagero sem cabimento. Mas afinal, quem entendia a realeza por inteiro?
Saímos da reunião mais relaxados em questões de política. Não havíamos comido desde que acordamos e eu sentia minha pressão começar a cair, percebi que Clarkson também não estava lá em suas melhores condições. Acenei com um último sorriso que pude dar aos convidados e saí dali com uma mão na barriga, sentindo que cairia ali mesmo se não comesse imediatamente, Clarkson começando a notar que algo estava errado. Eis que duas crianças de dez anos aparecem dobrando o corredor correndo com uma bandeja na mão. Maxon e Daphne pararam à nossa frente, os fios de cabelo desordenados na testa, as roupas sujas de farinha ou seja lá o que fosse.
– Maxon! – ri baixinho, abaixando e vendo que se tratava de uma bandeja de biscoitos. – Vocês que fizeram? – questionei, olhando para Daphne. Aquilo com certeza havia sido ideia de Maxon.
– Sim, mamãe... – ele olhou para baixo, aproveitando para tentar limpar o paletó. – Está brava? – ele amassava a borda do paletó com os dedos, claramente nervoso. Como assim nervosa por algo tão inocente? Eu não privaria meu filho de ser uma criança normal quando pudesse.
– Só estou brava por ainda não terem me oferecido um destes biscoitos. – sorri, e Maxon levantou os olhos com um misto de surpresa e alívio. Pegou um dos biscoitos e me ofereceu, eu imediatamente o tomei e dei uma mordida. Meu estômago se aliviou e pude sentir que minha pressão logo se restabeleceria. O gosto não estava nada ruim; de fato não teria como, certamente a equipe da cozinha não teria recusado ajuda.
– Está delicioso, Max. Por que não oferece ao seu pai? – levantei e virei para Clarkson, que observava a cena com os braços cruzados. Ele arqueou a sobrancelha mas logo se deu conta e virou para Maxon, a expressão suavizada.
– Pai? – ele chamou-o baixinho, acredito que com receio dele desaprovar tal ato. Eu esperava que não, ou teria que passar outro sermão em Clarkson de como ele estava estritamente proibido de brigar com Maxon por coisas tão bobas. Ele seria rei algum dia, mas por enquanto era apenas uma criança, e deveria agir como tal para não crescer alguém frio e calculista. Eu daria uma infância ao meu filho, na medida do possível, do jeito que desse.
Clarkson deu uma larga mordida no biscoito, sabia que ele estava com tanta fome quanto eu. Sorriu de canto e foi até Maxon, bagunçando seu cabelo com uma mão carinhosamente. – Olha só, filho. Já pode casar. ¬– Maxon deu de ombros com o comentário, radiante. Qualquer elogio de Clarkson o deixava assim, eu sabia perfeitamente que ele almejava ser o espelho do pai, afinal, que filho não quer? Ele o admirava em tantas formas. Quando recebia sermão era uma decepção que ele guardava. Eu presenciara várias vezes Maxon tornando-se cada vez mais perfeccionista e autocrítico com apenas dez anos. Em doses exageradas.
Decidimos que era hora de tomar café, aliás, era um quase almoço. Deixara uma pilha de trabalho na noite anterior, por conta da festa de recepção aos franceses me faltou tempo para terminar tudo aquilo. Clarkson também tinha suas tarefas, portanto depois de comer nos separamos com a promessa de arrumar tempo para nós urgentemente. Às vezes era insuportável passar a tarde inteira longe dele, imersa em uma papelada para assinar e resolver.
Caminhei até o Salão das Mulheres, o único lugar onde era silencioso o bastante para eu trabalhar sem distrações. E de fato, por umas duas horas me mantive concentrada e imersa na papelada, até que a porta abriu e Maxon entrou correndo com dois carrinhos nas mãos e parou na minha frente. Levantei os olhos dos papéis e sorri, imaginando o que de tão grave havia acontecido para ele aparecer do nada daquela forma.
– Filho... está tudo bem? – fiz menção de levantar, mas ele sentou na poltrona ao meu lado e começou a brincar com os carrinhos. Algo com certeza estava errado.
– Sim, mamãe. – ele murmurou, ainda olhando para os carrinhos. Larguei a caneta na mesa e virei o corpo para ele, levantando sua cabeça com um dedo, chamando sua atenção por completo.
– Vamos, Max. O que houve? – questionei baixinho, preocupada, afinal que problemas um garotinho de dez anos teria para ficar tão abalado? Principalmente Maxon. Esperava que Clarkson não tivesse brigado com ele de novo.
– Briguei com Daphne... – ah. Claro. – ... ela não quis brincar comigo, mãe. Será que eu sou chato? O que eu fiz? – vi em seus olhos uma faísca de desespero. Segurei um sorriso e tentei parecer genuinamente preocupada, mas eu entendia, brigar com sua melhor amiga não é nada bom. Paciente, suspirei e passei a mão por sua bochecha.
– E do quê você queria brincar, filho?
– Com meus carrinhos, ora... corremos o dia inteiro. Pensei em brincar de outra coisa! – ele exclamou, frustrado. Ri baixinho e peguei sua mão.
– Querido, ela é uma garota. Garotas não gostam muito de brincar de carrinhos. Aposto que Daphne prefere de brincar de boneca, ou de se maquiar, não sei... – parecia um pensamento retrógrado, mas o que eu poderia fazer se era verdade? Daphne era uma verdadeira princesinha.
– Garotas são tão estranhas... – Maxon virou o corpo, cruzou o braços e ficou de bico olhando para frente. Ri e o abracei pelo ombro.
– Não, filho. As pessoas são diferentes. Não só por serem menino e menina. Ela poderia sim gostar de brincar de carrinho, não há problema nisso, mas ela não gosta mesmo. Eu sugiro que vá conversar com ela e que se entendem. Encontrem algo que os dois gostem de fazer.
Ele suspirou e voltou a me encarar.
– Ela foi para o quarto dela. Acho melhor não incomodar agora.
– Então eu tenho uma companhia para a tarde? – arqueei uma sobrancelha e sorri, Maxon fez o mesmo e deixou um beijo estalado em minha bochecha.
– Claro, mamãe. Prometo ficar quietinho.
Depositei um beijo em sua testa e arrumei sua roupa brevemente. Ele se sentou um pouco mais afastado para brincar, e eu fiquei ali por alguns minutos, olhando-o. Havia muito que Maxon não entendia por viver um pouco isolado, como por exemplo o convívio com outras pessoas. Os funcionários, claro, faziam tudo para agradá-lo e ele só conversava de verdade comigo, com o pai e com Daphne. Suspirei e apoiei a cabeça em uma mão, pensando nas milhares de coisas que gostaria que ele visse e tivesse experiência, mas que o título não permitia. Não queria que ele crescesse ignorante e alheio à tudo, afinal para governar seu povo teria que conhecê-lo primeiro. Isso começava com os ataques rebeldes, os quais eu tratava exatamente naquela tarde com aqueles papéis. Ele tinha medo de ultrapassar os muros do palácio justamente por conta da população insatisfeita com nosso governo, mas certas coisas não podíamos mudar ou abrir mão. Eu dava meu melhor, mas claro que tudo tinha que ser aprovado por Clarkson. Maxon pensava que seu povo seria assim? Não. Ele saberá fazer a diferença. E para isso, terá uma esposa maravilhosa ao seu lado.
Esperava que ele encontrasse alguém na Seleção. Ele apenas convivera com Daphne e até agora não possuía experiência no assunto. Esperava que ele continuasse crescendo o príncipe maravilhoso, humano e preocupado com as pessoas que ele era. Eu torcia e rezava por ele todas as noites, Maxon fora o maior milagre da minha vida e eu só pedia que ele fosse feliz nas condições que fosse. Ele teria 35 opções futuramente para se casar, claro, mas mesmo assim era limitado. Queria que ele encontrasse o amor algum dia. Tantas coisas que a realeza nos oferece, ao mesmo tempo que tira algumas das mais preciosas.
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Meu Maxon
FanfictionEscrita por Amberly Schreave São apenas alguns relatos de quando Maxon era menor, já que lhes pode ser curioso.