v i n t e e s e i s

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Eu estava deitada de barriga para baixo em minha cama, fuçando alguma coisa no meu notebook pelo que pareciam ser horas. Cruzei as pernas no ar e mordi um pedaço do pequeno sanduíche que estava em minhas mãos. Meu cabelo preso em um coque desajeitado se movia de acordo com o vento que soprava regularmente pela janela. Apoiei meu queixo nas costas de minhas mãos, uma vez que o sanduíche já havia acabado, e resolvi assistir um filme qualquer. Mas logo me cansei e deixei minha testa cair de encontro ao coxão macio abaixo de mim.

Quando minha vida se tornou tão tediosa?

Me levantei da cama e dei passos preguiçosos até a janela aberta, forçando um pouco a mesma para fecha-la. Pelo vidro, pude ver um casal andando de mãos dadas pela calçada. O dois pareciam ridiculamente felizes, era de dar inveja. Acabei fechando as cortinas também, logo todo o quarto foi coberto por escuridão.

"Tudo bem por aqui?" virei de costas para a janela e vi minha mãe parada na porta aberta, me encarando como se visse um fantasma.

"Sim."

"Certo. Eu vou sair por algumas horas, não se esqueça de tomar os remédios mais tarde." ela disse, me dando um olhar desconfiado. Mas não se prolongou muito, logo saiu da minha vista e escutei a porta da frente sendo trancada. Boa, ela me trancou.

Ri e me joguei na cama. Apertei para que o filme na tela voltasse a passar e me distraí um pouco com ele. Até que senti meu celular vibrando em minha mesa.

"Preciso ver você hoje. Vá até a ponte perto de sua casa às oito da noite, por favor."

Era apenas isso que dizia na mensagem mandada por Harry. Mas isso não poderia ser mais estranho. Ele sequer havia assinado com o seu impertinente 'H'. Bloquiei o aparelho e assisti sua tela escurecer com as sobrancelhas unidas em confusão. Por que ele iria querer me ver depois de tantos dias sem nenhuma notícia?

Outro fato que me intrigou foi que a ponte da qual ele falava não era nem um pouco perto da minha casa. Eram quase trinta minutos andando, já que eu não teria coragem nenhuma para dirigir um carro, mesmo agora.

Deixei o celular de lado e voltei a abrir as cortinas, o sol acertando em cheio meu rosto. Abri a janela também, eu precisava de ar. Apoiei os cotovelos na abertura e pensei nos prós e contras de ir até ele. Dentre os prós estava o fato de que eu poderia perguntar tudo que queria, mesmo sem a certeza de que as respostas iriam me agradar. Já entre os contras, eu encontrei a sua possível bipolaridade. Não poderia saber como estaria seu humor hoje, nem se ele iria querer responder qualquer coisa que eu falasse.

E ainda tinha o fato de que eu estava trancada em casa. Mas isso era o de menos. A janela estava alí para ser pulada a hora que eu bem entendesse.

                              ××

Às sete horas da noite uma enorme indecisão me consumia. Eu andava de um lado para o outro do quarto me perguntando se realmente era o certo ir. Meu subconsciente já havia decidido que não, mas eu também já havia decidido que ele não sabia de nada. Um frio na barriga também estava marcando sua presença em mim, junto com uma espécie de nervosismo. De brinde eu ainda estava roendo as unhas.

Me lembrei da minha medicação e fui com passos apresados até a cozinha. Enchi um copo com água e tive a pequena pílula em mãos, ingerindo-a com uma certa dificuldade. Culpei meu nervosismo, não minha falta de habilidade com remédios.
Fui até a porta da frente e conferi, eu realmente estava trancada. Isso poderia ser um sinal ou um empecilho usado para me confundir. De qualquer forma, estava funcionando. O grande relógio da sala me avisou que faltavam vinte minutos para as oito.

O que você tem a perder?

Era como se uma vozinha persistente continuasse martelando isso em meus pensamentos. Mas, sim, eu não tenho mais nada a perder. Se os tempos fossem outros, eu poderia dizer que a situação toda valia minha honra. Só que eu já havia a perdido à tempos também.

Corri até meu armário no quarto o retirei de lá a primeira roupa que vi, junto com meus sapatos brancos. Coloquei tudo mais rápido do que alguma vez já fiz e tentei dar um jeito em meu cabelo com os dedos enquanto desligava todas as luzes da casa, menos a do meu quarto, e tranquei a porta do mesmo. Quando minha mãe chegasse, ela poderia pensar que eu simplesmente adormeci.
Analisei a altura da queda pela janela e cheguei a conclusão de que caso algo desse errado, eu quebraria uma perna ou um braço. Encaixei meu celular no bolso da calça e me preparei. Passei uma perna pela abertura e me apoiei na decoração com flores, passei a outra e finalmente fechei a janela, deixando meu corpo cair na grama. Bom, pelo menos não quebrei nada.

Me levantei e tirei a sujeira de minhas calças com as mãos. Prendi meu cabelo e comecei minha não tão curta caminhada.

As ruas ao meu redor estavam, na maioria, ainda claras, me passando uma certa tranquilidade. Quando cheguei à uma área mais afastada, avistei um grupo de homens com cigarros na boca, dizer que eles pareciam não muito bem intencionados era o eufemismo do século, eles me olhavam com se fossem leões e eu carne crua. Apressei meus passos e entrei em um estabelecimento qualquer, reconhecendo como uma farmácia depois. Minha única intenção era despistar a atenção deles.

Sai dali pouco tempo depois e continuei meu caminho, vi no celular que já se passavam das oito e torci para que Harry não tivesse ido embora.

Depois do que pareceram bons dez minutos, cheguei a tal ponte. Enxerguei, encostado na curta parede que circundava a mesma, uma sombra masculina. Suspirei de alívio. Dei uma pequena corrida até ele.

"Ei! Eu estou aqui." chamei-o, com um sorriso indiscreto no rosto. Mas ele logo desapareceu quando a sombra tomou forma e me encarou. Não eram os olhos verdes que eu esperava.

"Sentiu minha falta, Lucy?"

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Quem vocês acham que é? Pensem bem.

P.S: Talvez hoje tenha att dupla para compensar a demora... O que acham?

All the love xx

Green | H.SOnde histórias criam vida. Descubra agora