Capítulo VII - O sonho

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A chegada à Fôret não poderia ter sido melhor, mulheres e crianças esperavam pelos guerreiros de Caranfalas no portão da tribo. Pais beijavam suas esposas e abraçavam seus filhos. Ashhar tinha um sorriso dolorido, mas estava feliz. O sábio Lucas olhava todos, sentado em sua cadeira de rodas, com um sorriso de orgulho e calma. Alberto se sentira mais em casa do que se sentia em seu lar, lá em Pernambuco.

Não demorou até que Beto fosse apresentado por seu mestre ao sábio. Apertando-lhe a mão em resposta, Lucas prosseguiu.

- Rapaz, a juventude é tempo doce. Tudo cheira diferente, sente-se diferente. – Olhando o horizonte, ele continuou – Nem toda aventura é boa, mas toda ela nos ensina algo.

- Como temer os Lumière.

- Não, meu jovem. Nos ensina a enfrentar quem se deve de forma justa e limpa. Não se deve fechar os olhos para a injustiça. – Lucas o olhou com compaixão - O mundo já tem dores demais, as pessoas já têm dores demais, cada uma sente do seu jeito, às vezes dores físicas, às vezes emocionais e justo por isso devemos respeitá-las e prevenir para que o mundo não gere novas situações sofridas. Isso, Alberto, é ter o mínimo de compaixão e senso de justiça.

Vendo o rapaz ficar pensativo, Lucas abriu um sorriso largo.

- Seja bem-vindo de volta, dominador. – Virou-se então para Ashhar – reuní alguns chefes de famílias que não foram com vocês, a maioria entendeu a necessidade de treinar o rapaz e defender a tribo de ataques que possam vir a acontecer. Adiantei parte de seu trabalho, fiz o que pude, agora é com você.

Pondo a mão em cima de uma pedra verde e opaca que ficava presa na ponta frontal do apoio de braço de sua cadeira de rodas, Lucas havia feito algo especial: sua cadeira começara a andar sozinha, sem que ninguém a empurrasse.

Vendo a feição surpresa de Alberto, o elfo resolveu explicar.

- O velho Lucas é um feiticeiro. Não se impressione. Ele não pode andar com seu cajado, atrapalha a cadeira, então ele fez os braços da cadeira com a madeira dela, com uso da magia ele se movimenta. É só isso.

Poderia ser só isso para Ashhar, mas para Alberto não. Para nosso brasileiro era mais um mistério a se resolver.

- Aqui não achamos feitiçaria, magia e dominação muito diferentes, para nós, o que difere as três é o tipo de força vital que lhe tira.

- Ashhar, as vezes sinto falta do meu lar, na verdade, falta da família. Nunca me senti tão bem como me sinto aqui em sua tribo. Mas minha esposa me faz falta.

- Acredite, - O elfo respondeu com voz falha – eu o compreendo. E posso te garantir que logo menos, quando não esperar, terá em suas mãos a chance de ir vê-la.

- Mas e tudo que está acontecendo aqui?

- Seu dom é importante, saber usá-lo e saber o risco que isso apresenta, também. Mas nada na Terra ou em Atlas é mais importante que a família.

- Entendo.

Abraçando o jovem como provavelmente abraçaria o filho que nunca teve, Ashhar saiu, levando Alberto para sua casa e o instalando ali, onde ele justificou ser mais seguro por hora.

Beto deitou-se para acalmar os pés doloridos de cavalgadas e longos trechos a pé, bebeu uma garrafa que não conhecia, com um líquido de gosto forte e meio alcoólico, minutos depois caiu no sono e sonhou.

Em seu sonho viu uma criança de colo, deitada num berço que se auto balançava, dormia como um anjo. Sentiu o cheiro de sua Marieta, cheio de lírios, um cheiro tão forte que perfumava toda a casa, a linda mãe da criança era sua própria esposa, que estava deitada numa cama próxima ao berço, mas não notara a presença dele. Ele, sem nada entender, tentou acordar sua amada, ela por sua vez, não parecia o ouvir. Ele decidiu, então, pegar a criança, mas as suas mãos, por mais próximo que estivessem, não conseguiam tocar a criança no berço.

Na agonia, ele acordou.


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