Capítulo XX

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Eu aprendi que ela não escolhe cor de pele, gênero, classe social, crença, idade, lugar, data, hora, momento...Ela é esperada enquanto é inesperada. A presento a vocês a morte.

Foi ela quem visitou aquela casa e levou para si Benjamim. É ela o motivo de estar em um cemitério, cercada de pessoas vestidas de pretos e aos choros. Ela é a causa de Anne chorar caída no chão, com Kiel e Maxon a abraçando fortemente.

Não fui muito chegada ao Tio Ben, mas ele sempre foi muito bondoso comigo. Mesmo assim, aqui e agora em seu funeral, com uma linda e enigmática melodia de piano soando como musica de fundo enquanto seu caixão é posto e enterrado a sete palmos a baixo da terra, eu não consigo derramar nem uma lágrima sequer.

Talvez, penso eu, que seja por que ainda não fui capaz de processar que ele está morto. Ha exatamente dois dias atrás ele estava vivo, e uma de minhas melhores lembranças de sua pessoa é a imagem dele sorrindo e me dando um livro para ler. "Nada melhor que um bom livro". Ele me disse.

Algumas horas depois estávamos todos de volta a cena do crime, que tenho agora a angustia de chamar de casa, lotada de pessoas que estavam no funeral, e passavam por mim me dando leves tapinhas no ombro e outros chegavam a me abraçar. Eu não mereço mais atenção ou solidariedade quanto Anne e Kiel, que foram criadas por ele. Mal consigo olhar para Anne, pois odeio ver a tristeza estampada em seu rosto.

Eu sempre fui fraca...não consigo nem ser forte o suficiente para olhar nos olhos de Anne ou mesmo Kiel e conforta-las. Subo as escadas e me tranco no meu quarto. Eu havia passado por um longo interrogatório quando também fui levada a um hospital, por conta de meu desmaio - havia desmaiado assim que Stevon desapareceu- Foi doloroso contar detalhe por detalhe a meu pai e Maxon que também insistiu em ouvir tudo juntos da policia local. 

__ Sim, eu vi Stevon... - Essas palavras saíram queimando por minha garganta, quando meu pai pediu para que eu falasse com mais certeza o que eu vira.

Eu não queria que ele fosse um assassino, porém agora haviam provas contra ele. Essas provas  eram o suficiente para me fazer sentir repulsa por ele e qualquer sentimento negativo que antes fazia questão de ignorar. Eu fiquei deitada na cama, sem vontade nenhuma de dormir ou levantar para fazer algo.  Apenas deixei o luto me tomar conta, e a pior parte era saber que não era pelo tio Ben. 

No dia seguinte, tudo parecia sem cor ou brilho, e eu me encontrava em uma melancolia profunda. Desci as escadas devagar em direção a sala e encontrei Anne debruçada em uma mesa, ela estava na companhia de duas mulheres, uma de longos cabelos brancos e sardas espalhadas pelo rosto, seus olhos cor âmbar eram fascinantes a outra morena com os cabelos negros presos em uma trança de lado. Ela possuía varias tatuagens espelhadas pelo braço direito.

__ Bom dia. - Disse educadamente.

__ Muito bom dia, mestre Lauren. - A de cabelos brancos me cumprimentou. Arregalei os olhos e a encarei, acreditando que não ouvi direito o que ela havia dito.

__ Maya é assim mesmo, ignore. Me chamo Serafina e é um prazer conhece-la Lauren. - A morena com a trança se pronunciou.

__ Maya é uma elfa, Serafina uma bruxa. -  Anne informou baixinho.

__ Bruxa não, feiticeira. - Serafina a corrigiu.

Me sentei ao lado de Anne, ficando de frente a duas mulheres. Analisando mais de perto Serafina parecia mais velha, com traços firmes e harmoniosos, já a outra de cabelos brancos parecia ainda uma criança com uma expressão risonha e fofa.

__ Vinhemos prestar pêsames a família de mestre Benjamim. - Maya falou.

__ E onde esta os outros? - Perguntei para Anne.

__ Kiel foi visitar o túmulo de tio Ben com Maxon e seu pai está em uma reunião de ultima hora com os demais lideres...claro, sem a presença Edward. - Anne rosnou ao pronunciar o nome de Edward.

Claro, ele e Stevon deviam estar juntos nessa, mais...e Maxon? Ele também deveria estar incluído, ajudando talvez o pai e o irmão. Pensei.

__ Maxon disse que não está envolvido, mas pede desculpas... - Anne falou monotonamente como se adivinhasse meu pensamentos.- Claro que poucos, além de mim e Kiel acreditam nele. 

Suspirei e abracei Anne, e pude notar o quão pequena e frágil ela parecia.

__ Por que a abraçou, mestre Lauren? - Maya perguntou com uma expressão curiosa e inocente no rosto.

__ Maya, humanos são assim. - Serafina disse repreendendo-a e revirando os olhos

__ Eu estou bem, Lauren. - Anne falou. A soltei e passei a mão em seus cabelos ruivos.

A Elfa ficou me encarando, como se estivesse me estudando e isso já estava me incomodando.

__ Vocês aceitam um pedaço de bolo? - Perguntei, pois detestava ficar sendo encarada de forma tão fixa e obvia. 

__ Sim. - Serafina disse, sem tirar os olhos ônix de mim também.

__ O que é rolo? - Maya perguntou.

__ B.O.LO, maya, B.O.L.O. - Serafina corrigiu. 

__ Bem, eu vou pegar na cozinha. - Sorri e me levantei indo em direção a cozinha, porém parei na porta.

Ela me trouxe lembranças que ainda estavam bem vividas em minha memória. O sangue em volta do corpo caído no chão, os olhos já sem vida. Balancei a cabeça para tirar as imagens que insistiam em voltar, peguei dois pratinhos no armário. Abri a geladeira e peguei o bolo o botando no balcão. Com uma faquinha de serra comecei a cortar o primeiro pedaço e o guardei de volta na geladeira assim que acabei. Peguei os dois pratinhos com cuidado e já ia sair da cozinha quando lembrei que havia esquecido as colheres. Voltei e deixando os pratinhos de novo no balcão, me virei de costas em direção ao armário, abri a gaveta e peguei os talheres.

Voltei ao balcão sentindo o cheiro de mato molhado invadir meu nariz, e em um piscar de olhos lá estava ele. Com os cabelos loiros molhados, assim como o restante de sua roupa, seus olhos azuis me encarando profundamente, como se pedissem desculpas silenciosas. Me assustei e estava preste a gritar, porém a sua mão tampou minha boca com um pano branco bem a tempo.

Uma fumaça verde nos envolveu, fazendo meus olhos arderem, provocando também uma forte tontura, seguida de enjoou. Cada centímetro do meu corpo parecia dormente e sentia minhas pálpebras pesadas. Consegui ouvir foram os barulho dos talheres caindo no chão e um grito, antes de apagar de vez.

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