A Pequena Sereia - Parte 3 (Final)

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O sol se levantou e, luzindo através do mar, acordou-a. Ela sentiu uma dor aguda. Mas bem ali, na sua frente, estava o belo príncipe. Os olhos dele, negros como carvão, a fitavam tão intensamente que ela baixou os seus, e percebeu que sua cauda de peixe desaparecera e que tinha um bonito par de pernas brancas como as que qualquer menina desejaria ter. Mas estava inteiramente nua e por isso envolveu-se em seu longo cabelo, que caía delicadamente. O príncipe perguntou-lhe quem era e como chegara até ali, e ela só pôde olhar de volta para ele com seus olhos de um azul profundo, doce e tristemente, pois, é claro, não podia falar. Então ele a tomou pela mão e a levou para o palácio. Cada passo que ela dava, como a bruxa predissera, a fazia sentir como se estivesse pisando em facas e agulhas afiadas, mas suportou isso firmemente. Caminhou com a leveza de uma bolha ao lado do príncipe. Este e todos que a viram ficaram maravilhados ante a graça de seus movimentos.

Deram-lhe vestidos suntuosos de seda e musselina. Ela era a mais bela criatura no palácio, mas era muda, não podia falar nem cantar. Lindas moças escravas vestidas de seda e ouro apareceram e dançaram diante do príncipe e de seus parentes reais. Uma cantou mais lindamente que todas as outras, e o príncipe bateu palmas e sorriu para ela. Isso deixou triste a Pequena Sereia, que sabia que ela própria podia cantar ainda mais lindamente. E pensou: "Oh, se pelo menos ele soubesse que abri mão de minha voz para sempre para estar com ele."

As moças escravas dançaram uma dança graciosa, deslizando ao som da mais encantadora das músicas. E a Pequena Sereia ergueu seus belos braços brancos, ficou na ponta dos pés e deslizou pelo piso, dançando como ninguém dançara antes. A cada passo, parecia mais e mais encantadora, e seus olhos falavam mais profundamente ao coração que o canto das moças escravas.

Todos ficaram encantados, especialmente o príncipe, que a chamou de sua criancinha enjeitada. Ela continuou dançando, apesar da sensação de estar pisando em facas afiadas cada vez que seu pé tocava o chão. O príncipe disse que ela nunca deveria deixá-lo, e ela ganhou permissão para dormir do lado de fora de sua porta, numa almofada de veludo.

O príncipe mandou fazer para ela um traje de pajem para que pudesse sair a cavalo com ele. Cavalgavam juntos pelas matas fragrantes, onde os ramos verdes roçavam seus ombros e os passarinhos cantavam em meio às folhas frescas. Ela subia com o príncipe ao topo de montanhas altas e, embora seus pés delicados sangrassem e todos pudessem ver o sangue, ela apenas ria e acompanhava o príncipe até onde podiam ver as nuvens abaixo deles, parecendo um bando de aves a viajar para terras distantes.

No palácio do príncipe, quando todos na casa dormiam, ela costumava ir para os largos degraus de mármore e refrescar os pés ferventes na água fria do mar. E naqueles momentos pensava nos que estavam lá embaixo nas profundezas. Uma noite suas irmãs subiram de braços dados, cantando melancolicamente enquanto flutuavam na água. Acenou para elas e elas a reconheceram e lhe disseram o quanto as fizera, a todas, infelizes. Depois disso, passaram a visitá-la todas as noites, e uma vez ela viu a distância sua velha avó, que não vinha à superfície havia muitos anos, e também o velho rei do mar com sua coroa na cabeça. Ambos estenderam as mãos para ela, mas não se aventuraram tão perto da costa quanto as irmãs.

Com o tempo, ela foi se tornando mais preciosa para o príncipe. Ele a amava como se ama uma criancinha, mas jamais lhe passara pela cabeça fazer dela sua rainha. E no entanto ela precisava se tornar sua esposa, pois do contrário nunca receberia uma alma imortal e, na manhã do casamento dele, se dissolveria em espuma no mar.

"É de mim que você gosta mais?", os olhos da Pequena Sereia pareciam perguntar quando ele a tomava nos braços e beijava sua linda testa.

"Sim, você é muito preciosa para mim", dizia o príncipe, "pois ninguém tem um coração tão bondoso. E você é mais devotada a mim que qualquer outra pessoa. Você me lembra uma menina que conheci uma vez, mas que provavelmente nunca verei de novo. O navio em que eu viajava naufragou, e as ondas me jogaram na costa, perto de um templo sagrado, onde várias meninas estavam cumprindo suas obrigações. A mais nova delas me encontrou na praia e salvou minha vida. Só a vi duas vezes. Ela é a única no mundo que eu poderia amar. Mas você é tão parecida com ela que quase tirei a imagem dela da minha mente. Ela pertence ao templo sagrado, e minha boa fortuna enviou você para mim. Nunca nos separaremos."

A Pequena SereiaOnde histórias criam vida. Descubra agora