O despertador tocou ruidosamente acordando Alexander, que se levantou sobressaltado.
Terminado o ritual diário de preparação para mais um dia de estudo, saiu do seu quarto indo na direção da cozinha, seguindo o rasto deixado pelo delicioso cheiro a bolo de laranja. Repentinamente ouve um telemóvel a tocar e, como não havia indícios de o seu dono aparecer, decidiu entrar num quarto que era definitivamente de rapariga. Aproximou-se do objeto e viu que Abigail dormia ao seu lado com um ar gracioso e angelical. Resolveu acordar a jovem.
- Ainda é cedo, deixa-me em paz!
- Mas o teu telemóvel estava a tocar, podia ser alguma coisa importante!
- Não me interessa, se for importante voltam a ligar mais tarde. E já agora, quem te deu permissão para entrares no meu quarto?- inquiriu furiosamente Abigail. Esta levantou-se da sua cama e colocou-se prontamente de frente para Alexander.
- Bem, ninguém, mas ouvi o telemóvel a tocar e como podia ser algo importante decidi entrar e avisar-te…
Abigail interrompeu o jovem:
- Não sei se sabes, mas bater à porta antes de se entrar em algum espaço privado é uma das regras básicas da boa educação, mas claro que desse assunto não deves perceber nada. Afinal sempre viveste na miséria e essas pequenas regras não deviam existir!
Alexander ficou sem saber que resposta havia de dar a estas palavras horríveis de Abigail.
- Posso ter tido uma vida sem riquezas, sem uma mansão e sem facilidades, mas fui sempre honesto, verdadeiro e feliz. Ao contrário de ti que és só fachada! Não abras os olhos antes que seja tarde demais! Olha que o tempo não volta atrás e tu sabes bem disso!
Alex abandonou de seguida a divisão, deixando Abigail incrédula.
- Meu deus! Este chega aqui e já pensa que é tudo dele e que pode fazer e dizer tudo o que deseja. Mas se ele pensa que me afeta com as suas palavrinhas está muito enganado!
A jovem deitou-se de novo na sua cama desejando nunca ter ouvido aquelas palavras duras. Percebeu ainda que exagerara um pouco na sua mensagem e isso provavelmente teria magoado Alexander, fazendo-o recordar de seu pai e de sua mãe, a única família que este tinha e que tinha desaparecido fazendo com que ele ficasse órfão. Apesar da morte de sua mãe, Abigail ainda tinha o seu pai, ao contrário do jovem que não tinha ninguém e permanecia sozinho no mundo. Então Abi decidiu simplesmente tratá-lo minimamente bem, não o ignorar, mas também não o deixar invadir o seu universo.
Como já não conseguia voltar a dormir, resolveu fazer a sua rotina diária e prepara-se para fazer a sua corrida matinal um pouco mais cedo do que o normal. Quando terminou de se vestir desdeu as escadas de sua casa e encaminhou-se para a sala de refeições, onde começou a tomar o pequeno-almoço.
- Bom dia filha. O quê que aconteceu para estares à mesa tão cedo? – Retorquiu Phil, arrastando a sua cadeira para se puder sentar.
- Nada de especial, apenas não consegui dormir mais e então decidi ir correr mais cedo pai. – Mentiu a sua filha. Abi sabia que se descrevesse a verdadeira razão pela qual estava acordada tão cedo o seu pai iria ficar ainda mais desiludido consigo, por isso determinou ocultar esse facto.
- Fazes muito bem Abi! Devias levantar-te cedo todos os dias, fazia-te bem e aproveitavas melhor o teu dia.
- Mas sabes que eu adoro dormir e muitas vezes é mesmo impossível acordar cedo.
Desataram os dois a rir, até ao momento em que o pai de Abi disse:
- És tal e qual a tua mãe, dorminhoca!
A jovem baixou a cabeça em sinal de incómodo, mas pouco depois levantou-a de novo tentando não pensar na sua infelicidade.
- Pai, quando é que levas o meu quadro à galeria da tua amiga?
- Eu disse que o levava mal o acabasses, já está terminado?
- Sim, dei os últimos retoques ontem e passou a noite toda a secar, por isso já está pronto.
- Então vou telefonar para a galeria ainda hoje para saber quando posso lá passar e falar com a minha amiga.
- Obrigado pai, é mesmo muito importante para mim. Mas por favor, promete-me que não o abres e não o vês! Por favor promete!
- Eu prometo filha. Mas porquê que não vais lá tu levá-lo? Eu combino o dia e tu vais lá. Até era bom, para passares a conhecer a galeria e todo aquele espaço.
Mas Abigail não queria ser ela a entregar a sua obra. Não tinha coragem suficiente para enfrentar pintores muito importante e não estava preparada para que receber um “não” como resposta e, por isso, pediu que fosse o pai a ir lá apresentar o seu quadro. Se a resposta fosse negativa, Abi não ficava tão envergonhada e constrangida, pois não estaria na presença dos seus ídolos. A ideia de que a sua arte não seria boa ou mesmo suficientemente boa para estar exposta numa galeria em Beverly Hills fazia-a querer desistir do seu sonho de ser uma pintora mundialmente famosa. Tudo o que Abi sabia sobre a arte aprendera até à sua formatura e principalmente sozinha, não tendo ido para nenhuma universidade. Phil nunca compreendera a verdadeira razão pela qual a jovem nunca quisera ir para a universidade, mas aceitou a sua decisão.
- Numa outra ocasião. Quem sabe no meu próximo quadro. Mal saibas alguma coisa diz-me, não e esqueças por favor. Agora vou à minha corridinha. Até logo pai.
- Até logo Abi, tem juízo!
Ela saiu da sala de refeições encaminhando-se para a porta de saída ouvindo um ruído do que parecia ser uma mota. Mas estranhou, pois em sua casa não existiam desses meios de transporte. Com curiosidade, caminhou rapidamente para o exterior de sua casa, onde viu o seu novo “irmão” montado numa mota nova. Como não percebia nada de motas, não soube concluir se era de uma boa marca ou até mesmo recente.
Recordou-se instantaneamente da grande paixão que Alexander tinha por motas desde pequeno e acabou por perceber que o enorme desejo dele de ter um desses veículos tinha sido cumprido por seu pai, graças à generosidade dele.
A jovem iniciou o exercício que exercia todas as manhãs e admirou Alexander a sair de casa e a desaparecer da sua vista pela estrada em questão de segundos. O jovem era realmente um homem atraente e que as mulheres gostavam de olhar e até comentar, mas a sua fama de “marrão”, “antissocial” ou até mesmo de “pobre” impedia que ele se desse bem num grupo de amigos e tivesse relacionamentos sérios e duradouros.
Mas essas questões eram algo que realmente não o preocupavam seriamente, pois no seu pensamento estava unicamente acabar o seu curso e encontrar emprego.
De repente, o seu telemóvel toca e Abigail é obrigada a parar e a atender a sua chamada.
- Estou a correr Caroline, o que é que foi?
- Desculpa Abi, mas ele ligou-me e disse que quer estar connosco urgentemente!
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Um pedaço de sonho
Ficção AdolescenteDizem que o tempo sara todas as feridas, que há solução para tudo e que o amor é a maior cura para todos os males. Será isto verdade? Será que apesar de todas as mágoas e tristezas se consegue seguir em frente e encontrar uma nova forma de viver? “...