Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas

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Lá estava eu novamente, sentada e esclusa, apenas observando todos ao meu redor quando poderia estar me divertindo — mas, pensando bem, aquilo era para mim uma monótona diversão.

O barman — um homem já de certa idade e cabelos grisalhos — perguntou-me novamente se queria algo para beber, com um certo tom de pressa, curiosidade e raiva. "Ainda não estou com sede." respondi quase que num engasgo, receando que ele se frustasse ainda mais. Talvez pensasse que eu estava atrapalhando o seu "negócio", sentada numa das banquetas que poderiam sustentar um cliente que lhe desse lucros. Mas aquilo de certo modo me aconchegava, saber que pelo menos alguém ali falaria e se "importaria" comigo.

À minha frente — há uns bons metros — encontrava-se uma mesa dupla repleta de pessoas. Como eram felizes! Ou fingiam muito bem. Eu podia sentir, ou melhor, saber com certeza sobre a falsidade naqueles sorrisos brandos. A velha Cora era a única feliz ali, comemorando seu aniversário de casamento com o marido que já falecera. Tinha um espírito bom. Abigail fingia muito bem estar casada, entretanto, com uma aliança metida no dedo, e um sotaque inglês que adquirira do suposto marido, Clarence. No entanto, não tirava os olhos e pernas de Connor, sentado à sua frente, ao lado da mãe, Cora.

Era apenas dedução, claro. Mas não arriscaria um palpite. Era fácil adivinhar toda a trama, visto que seu marido não estava presente. Quem diabos deixaria sua esposa à trabalho? Outro fato é que disseram estar muito chateados por não poderem conhecer seu marido. E por ultimo, os olhares lascivos trocados entre Abigail e Connor, que tinham a pouca vergonha de fazer isso explicitamente na frente de todos.

Entretida, levei o copo vazio à boca, dando-me conta da bobagem que acabara de fazer, me desfiz deste batendo-o com certa brutalidade na bancada de mármore. Isso serviu como uma campainha para o velho, que logo voltou, perguntando-me novamente "Está com sede agora?"

—Força do hábito!

Disfarcei, em vão. Ele pegou uma garrafa — uma das bebidas mais fracas, mas de coloração bela e aroma um tanto forte. Encheu o copo e o fez escorregar até a minha mão. Apreciei o aroma, enquanto ele se virava e ia atender outro cliente.

—"Por conta da casa."

—Gentileza sua.

Parei de prosa e enrolação e tomei o primeiro gole, sentindo minha garganta arder. Era fraca para bebidas, ou ao menos tentava ser. Queria me sentir mais humana, e para isso, imitava algumas pessoas — mulheres que não passavam do terceiro copo, por exemplo — por mais estúpido que fosse.

Confesso que era uma mania meio que desnecessária da minha parte, mas que podia eu fazer? Havia se tornado um hábito peculiar, e eu não me esforçava para largá-lo — embora quando me visse só, usufruía demasiadamente de drogas e bebidas. Eu confundia à mim mesma com essa dupla personalidade.

Agora minha pequena novela mexicana estava a chegar ao fim. Connor e Abigail deixaram à mesa com uma desculpa esfarrapada de que iriam ao toilette. Mas estavam todos embriagados de tabaco e álcool, e conversas paralelas, risadas e afagos, que não se deram conta do que estava acontecendo. E isso era divertido, para mim, claro, que assistia de longe, como uma telespectadora fiel ao programa.

Todavia, me senti minimamente suja, por estar novamente invadindo a privacidade alheia — mesmo o casal deixando tudo tão explícito. Isso de certo modo me fez virar outra vez para o bar, a fim de esquecer o caso dos amantes — erroneamente, já que sabia que, vez ou outra, olharia discreta e curiosamente para trás.

—Você fuma?  Perdão, não me apresentei de maneira adequada. Lucian Cunningham, e você é...

Eis que surge do meu lado um sujeito desconhecido, que evitei olhar, a princípio, mas fui hipoteticamente obrigada a fazê-lo instantes depois. Era um homem... Razoável, podia assim dizer, olhando-o brevemente. Mas havia qualquer coisa que o diferenciava dos outros, e eu queria saber o que era — embora tivesse esquecido o meu exemplar de Dale Carnegie "Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas".

—Quem sabe?! — tentei sorrir, em vão. Os músculos de minha face pareceram se reunir em uma estranha careta. —Ebony. — . . .

Vamos! Como queres saber algo se não pergunta?! No entanto, eu não sabia sequer como prosseguir. Não era como se não tivesse conversado com outros 'caras' antes, ou como se ele fizesse eu me sentir insegura. Eu somente pensava demais, e falava de menos.




Nocturnal SymphonyWhere stories live. Discover now