Negação

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                No meio daquela escuridão seu corpo parecia cair, era lento. Um vento frio cortava seu rosto, era assim que conseguia sentir seu corpo. No entanto, sua mente estava intacta, produzindo todo tipo de teoria. Lembrou de tudo que lhe fora ensinado sobre o céu e o inferno. Fez uma lista de coisas boas e ruins que havia feito até aquele momento.

"Serei punido? Mas já fiz tantas coisas boas, isso não é justo".

Para cada boa ação que lembrava ganhava um ponto, e logo em seguida retirava um ponto quando lembrava-se de uma atitude negativa. Acabou perdendo as contas, talvez assim fosse melhor e se as coisas ruins somassem mais pontos? Sua mente estava torturando-o.

"Será que é isso? É Assim que é a morte? Essa sensação de cair para o infinito e ter que me julgar?". Eram tantas perguntas que sua agonia só aumentava.

- Não – Sussurrou a voz que estava lhe acompanhando, um sussurro quente a centímetros de seu rosto.

- Você ainda não está morto.

"Ainda não estou morto" a frase reverberou em sua mente. Se a morte ainda não havia consumido a vida, quanto tempo lhe restaria? "Se", "tempo"...

"Se eu tivesse me sentado a mesa com meus pais... Se tivesse acordado no primeiro alarme... Se não tivesse aceitado esse emprego..." Tudo poderia ser diferente, cada passo que ele deu ou deixou de dar naquele dia poderia mudar seu destino.

- Tente abrir os olhos, Arthur – A voz era sempre calma e confortável.

- Não consigo, estou com tanto sono – Dizia sem ao menos tentar.

- Besteira, abra logo esses olhos! – Essas palavras secas fizeram seu corpo estremecer. Sentia seu corpo novamente, e havia uma sensação de formigamento em todo a extensão de seu corpo.

Lá estava ele, estirado no chão, planando sobre ele estava sua alma, perplexo não conseguia parar de olhar para seu corpo estirado no chão, seus olhos arregalados, sua boca aberta com uma expressão de pavor, havia marcas de lágrimas em seu rosto.

Aproximadamente dez pessoas o cercavam, todos curiosos, velando seu corpo sem nada poder fazer, logo a frente, Arthur viu os corpos dos polícias também estirados, tudo estava um caos.

Seus olhos marejavam e isso ardia, teve vontade de gritar e expurgar toda aquela angústia que flamejava em seu peito, ele olhou em volta tentando entender o que estava acontecendo.

- Arthur, meu caro, me de um momento de sua atenção – Finalmente percebera a figura por trás daquela voz macia. Um sujeito incomum, sua voz fazia jus a sua aparência. Um ser andrógeno, esguio, com uma forte maquiagem em seu rosto, principalmente nos olhos. No entanto, o que mais chamou atenção foram seus cabelos brancos, sem saber o motivo, ao olhar para aqueles cabelos, lembrou-se de sua avó.

Uma explicação, tudo que ele queria naquele momento era entender o que estava acontecendo, seus olhos imploravam por isso.

- Como disse antes, você ainda não está morto, meu bem. Seu corpo está mortalmente ferido, e mesmo que chegue resgate, seu destino sou eu, a Morte. :)

"Então a morte é isso? Não sinto dor, não sinto saudades, só não queria morrer desse jeito estúpido...".

Em vida, sua personalidade era absolutamente tímida e reservada. O fato de todos os noticiários retratarem sua morte, exibirem seu rosto e entrevistarem sua mãe, que certamente fará um escândalo, chorando, gritando e lamentando a perda de seu único filho, tudo aquilo o irritava.

Talvez o mais irritante fosse a falsa pena de amigos e conhecidos no facebook, como se não fosse o suficiente os jornais, ele conseguia ver todos eles deixando mensagens no seu mural, lamentando a sua morte, curiosos indo a seu perfil tentando entender como ele havia morrido... Aquilo, apesar de tão pequeno, foi a gota para explodir.

Num rompante de sentimentos sua voz explodiu num berro estrondoso "NÃO POSSO TER MORRIDO DESSE JEITO!!!" repetia isso incansáveis vezes, entre lagrimas e soluços. Berrava tanto que parecia uma criança que conhece apenas seis palavras.

A Morte deleitava-se com seu sofrimento, parecia que o desespero de Arthur era uma comédia divertidíssima.

- Calma jovem. Eu vou lhe dar uma chance de viver – Como sempre suas palavras flutuavam como navalhas afiadas e cortavam-lhe os ouvidos.

- Como? Você disse que meu destino era morrer! – Disse entre lagrimas e soluços.

- Verdade, eu disse isso mesmo. E de fato, seu destino é morrer nesse meio fio. Eu estimaria que em pouco tempo você seja considerado morto, talvez um pouquinho mais que três minutos – O sorriso no canto da sua boca carregada de maquiagem já estava irritando.

- Mas... – Continuou a Morte, agora olhando de uma forma que gelou sua espinha, um semblante assustador – Eu posso mudar seu destino. :)

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⏰ Última atualização: Jan 22, 2016 ⏰

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