Não sei por onde começar. Meu cérebro anda correndo muito esses dias, e eu não estou fazendo sentido algum, mas esse é o meu forte: a confusão. Eu realmente concordo que eu deveria fazer sentido nisso, mas não é bem o meu forte. Na verdade, acho que foi inútil até agora.
Bom, se é pra eu fazer sentido, melhor eu me apresentar, não é? Meu nome é Lucrécia Croogs. O resto você vai entender depois. Tenho uma cratera no meu coração. É o primeiro buraco de amor verdadeiro em mim. Buracos de amor não são fáceis de se recuperar, viu? São os piores de cicatrizar. E o primeiro sempre deixa uma marca enorme e dolorida, pelo que eu consegui observar em meus amigos. Acho que vai ser um porre aturar essa minha saudade insistente e maluca do meu Amigo. Não, eu não vou dizer o nome dele, mas ele com certeza vai saber de quem estou falando, então só o chamarei de Sr. A, ou de Amigo.
Sr. A foi uma encrenca e tanto, e nunca fui tão rebelde na vida antes de me apaixonar por ele. Na verdade, eu nunca fui tão emocional e impulsiva antes dele, eu costumava usar o cérebro. Ele foi a melhor maneira de descobrir que para amar você não precisa necessariamente usar o cérebro, já que suas emoções te empurram como uma multidão em um show, é alucinante e devastador, te preenche por inteiro e explode em cores. Agora o que sinto está mais para uma grande nuvem preta e chuvosa e as lembranças felizes me desbotam, mas eu acho que é só uma questão de me acostumar.
***
Hoje o dia acordou como eu, chorando. Gosto de pensar que às vezes algo está compartilhando esses sentimentos comigo, não é nada consolador se sentir mais sozinha. Meu pai acaba de bater na porta e diz:
‒ Vai acabar perdendo o ônibus, preguiça.
No que respondo:
‒ Não enche, jamanta.Ah, eu amo o meu chefe! A gente se fala pouco, mas eu o amo, fazer o quê? É o primeiro homem da minha vida. Levanto, me visto e antes de resolver o problema da minha juba vou no quarto do Guto e puxo as cobertas dele.
‒ Lu! Vê se cresce e me deixa dormir, pô. - ele diz indignado. Eu estou de saco cheio disso, se ele quer perder prova eu não tô nem aí. Assim que termino de me arrumar, ele levanta e me dá aquela olhada de "Sua traíra, não me empurra da cama na próxima que você vai ver só" e me empurra. Assim que eu saio, a chuva parece mais calma e eu corro pra pegar o ônibus. Helô sempre guarda o meu lugar, mas acho que hoje preciso de um lugar vazio, não é legal perturbar as amigas com sua tristeza logo de manhã. Mesmo assim ela percebe e me fala:
‒ Ok, já vi suas olheiras, toma uma base e vê se disfarça isso aí antes de chegarmos. Você tá uma monstra, sabia?
‒ Eu sei, valeu por me lembrar maninha.
‒ Você só pode estar ficando sadomasoquista, garota! Aquele idiota só vai notar o que perdeu se você mostrar, e pra isso precisamos dar um jeito nessas covas emocionais que você anda cavando nos olhos, ok? Você precisa ativar a femme fatale que tem aí, e rápido!
‒ Mana, você é realmente inspiradora de manhã, mas eu não estou no clima pra mudança drástica de comportamento, até porque você já ficou bem pior por um cara que valia menos.
‒ Oh! - ela bufa, desgostosa. - Não me meto mais então, sua chata!
É, o dia começou muito bem...***
Assim que chego na escola, Helô me dá aquele sinal e eu sei que meu Amigo está lá. Eu passo e quando estou quase conseguindo ignorar, eu olho. Ele acena a cabeça e eu me viro, cabisbaixa. Impossível não ter essa doce derrota toda manhã, e é claro que Helô me encara com desaprovação, mas eu quase estou mandando ela ir à merda. Heloísa Baker ainda não me conhece tão profundamente, somos amigas há apenas um ano, e mesmo assim ela se vê como minha general e fica tentando me fazer lidar melhor com isso, mesmo quando eu afirmo que a vista de fora é diferente do interior. Ela sempre retruca:
‒ É, mas seu exterior está me mostrando muito do seu interior ultimamente, então use isso como uma dica pessoal pra mudar sua aparência, é deprimente.
Ao contrário de Helô, Olívia sempre foi meu baú de confissões. Ela conhece uma parte da minha história que Helô não faz ideia, e eu prefiro não contar. Ela não precisa saber que nunca namorei um cara antes do meu Amigo e não precisa entender que eu vou me recuperar mais devagar de um pé na bunda, afinal é o primeiro. Prefiro pular o estresse de um surto de Heloísa.
Afinal, onde está a Olívia quando eu preciso dela pra desabafar? É claro, num intercâmbio em Nova Iorque! Pego o celular rapidamente (escondido do inspetor) e marco um alarme pra quando chegar em casa: Sinal de fumaça p/ Liv assim que der!!!
Assim que entro na sala, não encontro a bolsa do Diogo e fico pensando se ele vai aparecer na escola hoje. Ele se tornou um melhor amigo, e eu sempre me sinto anestesiada da realidade com ele. É como se meu sofrimento fosse uma receita de torta de maçã e nós dois cozinheiros inexperientes tentando dar um upgrade nela. O considero como um irmão, e isso é recíproco. No caso eu adoraria um abraço de irmão agora, seria muito bom.
***
Dou uma escapada pra conversar com as garotas antes do sinal, e quando Diogo chega eu lhe dou aquele abraço apertado, mas eu me espanto com a cena que estou assistindo: Sr. A fecha aquela cara de ciúmes mais manjada da história e sai pisando duro. Heloísa se vira para mim e diz:
‒ Mana, você viu o que eu vi?
‒ Não - minto. - Eu estava abraçando o Diogo.
‒ O que tá rolando, Helô? - pergunta Diogo.
‒ "Alguém" saiu pisando duro ali, e pela cara morrendo de ciúmes.
‒ Deixa morrer, foi ele quem decidiu me dar o fora. - eu digo, e instantaneamente sinto que estou prestes a chorar.
‒ Se você chorar agora eu te dou um tapa, mana. - Helô diz, e Diogo cai na risada.O sinal toca, e Helô sai correndo pra sala dela, enquanto Diogo e eu vamos pra nossa. Ele olha pra mim:
‒ Maninha, a gente precisa conversar ou você tá ok por hoje?
‒ Não sei Dig, não sei. Eu te aviso depois.***
Sr. A veio no recreio. Eu queria um tempo sozinha na sala, então eu pedi ao Diogo pra avisar as meninas e ele saiu, mas não durou nem 2 minutos o meu momento sozinha.
‒ Oi. - ele disse.
‒ Fala logo.
‒ Nossa, que estresse!
‒ Nossa, você notou!
‒ Qual é, não te fiz nada! Só quero conversar, tem como?
É claro, você sempre quer conversar, não é, Amigo?
‒ Tá, eu já disse pra falar.
‒ Você tá bem?
‒ Eu pareço bem?
‒ Não muito.
‒ Então...
‒ Para de ser grossa, poxa!
‒ Para de fazer cara de ciúmes por aí, merda! - e tapei a boca. Droga, droga, droga, pra quê que eu fui falar isso?
Ele me deu as costas e saiu, parecia furioso, mas eu realmente não estava dando a mínima pra fúria dele. Eu pareço um zumbi desde quando ele me deu um fora, e ele parece estar tão bem quanto já estava. Meu Amigo radiante como o sol e eu igual uma refeição de urubu, sinto como se o tempo que estivemos juntos tivesse evaporado da cabeça dele. Eu não vou me permitir chorar agora, seria mais que ridículo. Corro pra fora da sala e peço um abraço pra meus amigos, e Diogo já me olha preocupado:
‒ Chorar não?
‒ É, chorar não.Helô e Megan me abraçam e eu me sinto melhor, mas quando Diogo me abraça eu levo um cutucão de Megan. O olhar de Helô já me avisava, mas não deu tempo o bastante pra eu perceber até levar um esbarrão no ombro do Sr. A, que passa quase que cuspindo fogo.
‒ Qual é a dele afinal? - Megan me pergunta.
‒ Fique à vontade para descobrir, amiga.***
Chego em casa e meu celular apita sem parar. Bom, pelo menos já sei que o WiFi não está quebrado e que tem internet.
Lembrete de aniversário no Facebook, ok. Comentários em alguma coisa, ok. Solicitações de jogos, ok.
Carinha brava no Whats... ah, que maravilha, ele vai dar chilique.‒ Que é?
‒ Precisa mesmo ficar abraçando o Diogo na minha frente?
‒ Eu sempre fiz isso, não só na SUA frente, na frente de TODO MUNDO, ok?
‒ Tá >:(
‒ Tchau.
‒ Nossa.
‒ O que é agora?
‒ Nada, se não quer conversar, tudo bem.
‒ Eu tô indo almoçar ‒.‒'
‒ Ah tá."Não, eu não tô indo almoçar, só não quero aturar esse seu papinho de que não era pra ser e que você quer que sejamos amigos como antes. Eu já ouvi demais as suas historinhas e sei como acabam, eu vou ficar aqui chorando e você curtindo e rindo da minha cara com outra garota. Mesmo que você ainda tenha ciúmes de mim eu sei lá o porquê, me deixar em paz ajudaria muito. "
Guardo o celular, despenco na cama e deixo meus olhos virarem as nuvens lá de fora. Deixo chover no meu travesseiro, e os soluços são os meus trovões. É, o céu vai chorar comigo hoje.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Colecionador de Corações
Teen FictionVocê sabe como é bom ter o coração partido? Lucrécia Croogs é uma garota nerd comum, com uma vida nerd comum, até que o "Sr. A" entra em sua vida e leva consigo uma parte de seu pobre coração. Depois desse pé na bunda e de algumas reviravoltas, ela...