CAPÍTULO III

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          Era sexta-feira, Anna e Matt voltavam à pé da escola, colocando o assunto em dia, ambos contando sobre aulas chatas e alunos estranhos de suas salas. A casa de Matt chegava primeiro por esse caminho. Enquanto paravam para se despedir, ainda rindo de seus episódios escolares, ouviram um ganido de animal vindo do quintal. Era estranho, já que não havia nenhum bicho na casa de Matt. Correram para os fundos, deixando para trás o portão aberto. Quando terminaram o corredor, a cena era apavorante; Linus enfiava três das agulhas de tricô de sua mãe em um gato amarelo, provavelmente de alguém na vizinhança. Era um misto de desespero do animal em fugir e gargalhadas de Linus. Matt, como quem ficasse cego momentaneamente, arremessara para longe o irmão, num ódio que o deixara até mais forte. Anna mal conseguiu tirar as agulhas do bicho e ele correu para a mata, logo depois da cerca da casa. Por sorte, Linus ainda não sabia onde ficavam os pontos mais perigosos do corpo do gato, tampouco tivera força para enfiá-las muito fundo. Ainda assim, estava muito machucado. Os dois amigos vasculharam a mata até onde conseguiram, mas logo começou a escurecer e nada mais era fácil de enxergar. Anna até confundiu uma pilha de folhas com o bichano.

Cada um foi para sua casa, remoendo aquela cena cruel e assustadora, tentando buscar respostas. Mas elas não vinham.

Aquela foi a noite em que Anna teve seu primeiro pesadelo em meses. Mal sabia que aquela seria a primeira de muitas noites mal dormidas, e que a visão de seu guarda-roupa, de frente com sua cama, se tornaria tão repetitiva. Ela voltou a dormir quando quase amanhecia. Matt, por sua vez, relatou o ocorrido para seus pais, bofeteando o irmão a cada lembrança, mas sendo repreendido pelos pais por isso. O pai dos irmãos ouviu calado e não se manifestou. A mãe justificou dizendo que era uma "traquinagem feia", mas coisa de criança, que não tem noção da maldade. Por muitos minutos o irmão mais velho tentou argumentar, dizendo que o caçula precisava de acompanhamento, que ele havia lido sobre casos parecidos em um livro de psiquiatria forense, mas a mãe apenas ridicularizava suas tentativas. Ao ir para seu quarto, Matt trancou a porta, e, como Anna, não conseguiu dormir. Sua mente criava miados ao longe cada vez que seus olhos ameaçavam se fechar.

O Lado Sombrio Do QuartoOnde histórias criam vida. Descubra agora