O dia seguinte passara lentamente, tanto Anna quanto Matt não sabiam o que dizer um pro outro, o que tornava o silêncio desconfortável. O que os dois amigos concordaram, em uma das pequenas conversas que conseguiram estabelecer de manhã, foi que deviam ficar de olhos abertos sobre Linus, já que os pais não estavam consternados com nada daquilo. Anna, que já tinha um prazer nato pela leitura, não teve que se esforçar muito para começar uma vasta pesquisa sobre comportamentos perturbadores de crianças tão jovens, afinal, ela não conhecia tantas crianças assim para ter uma opinião sólida do assunto, e começou naquela tarde mesmo. As informações que surgiam na tela de seu computador eram chocantes; ela não imaginava que alguém tão jovem pudesse manifestar ações tão bizarras ou perversas como as que ela lia. No entanto, não havia elementos suficientes para analisar o irmão de seu amigo com muita propriedade, as únicas coisas que destoavam nele eram a história da fralda e o episódio do gato - que ela queria mesmo esquecer.
Sua primeira descoberta foi que crianças que sintam prazer em maltratar animais podem demonstrar o perfil de um psicopata, mas não é possível diagnosticar uma criança como psicopata ou sociopata ou qualquer "pata" que o valha, pois ela pode apresentar apenas um comportamento incomum que desaparece com a idade... Pesquisou também sobre o uso tardio de fraldas, que também não foi um bom sinal, especialmente porque Linus optava por não ir ao banheiro, e sempre queria que a mãe o limpasse, nunca o pai. Anna sentia pavor dessa imagem, uma criança com fezes e urina iguais a de um adulto tendo que ser "manuseadas" pela mãe. Essa, com certeza, já estava com seus pecados pagos pra vida inteira... Argh!
Mais tarde, compartilhou com Matt o que havia lido, e o amigo, ao contrário dos pais, ficava apavorado. Ele disse à amiga: -Anna, eu não pude sequer dormir sem trancar a porta. Tenho certeza de que há algo errado nisso. Eu sempre soube. Meu irmão nunca foi um bebê normal, ou ele chorava por horas, sem trégua, ou não emitia um único ruído, mesmo com fome ou estando sujo. Assim que tinha compreensão das coisas, fazia questão de morder o peito da minha mãe quando ia mamar, mas só quando ele via que ela não estava preparada, depois gargalhava com o grito dela! E mesmo assim ela continuou amamentando por meses! Acho que minha mãe não deve ser muito normal também...
Os dois amigos ficaram ali, por horas, divagando sobre os casos de Linus ao longo de sua curta vida, e, quanto mais ouvia, mais Anna se incomodava. Foi no meio de uma história de aniversário, em que o caçula havia furado todos os balões para a festa, que Linus surgiu na escada. Ele descia lentamente, degrau por degrau, apoiado ao corrimão. Ele encarava os dois adolescentes, com severa atenção. Não disse uma única palavra. Quando chegou ao térreo, sorriu discretamente e disse: "-Miau!". Com a mesma calma, seguiu pra cozinha, procurando um bolinho de chocolate.
Os jovens entreolharam-se e, naquele momento, sabiam que não podiam assistir a tudo inertes.
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O Lado Sombrio Do Quarto
Mystery / ThrillerOs medos e descobertas de uma mente adolescente em transformação...