Agora estava no final do segundo ano e as coisas pareciam ter um final feliz apenas quando fugisse para capital. Primeiro, apenas deixou estar e obrigava-se a escutar insultos sujos e mentiras horríveis a seu respeito. Ele jamais conseguiu entender o motivo das pessoas ou melhor, a maioria esmagadora dos garotos o tratarem daquela forma. Os olhos de Wellington encheram-se de ódio. Só faltou a baba de cachorro com raiva.
-Sai fora bicha do demônio – falou com desespero. Olhou para o lado quase que pedindo ajuda para Bruno na humilhação. Nem para humilhar servia. Coitado. Júlio lembrou o dia em que começou a revidar. Estava em meio a uma aula de Educação Física e acabara de errar um saque, então, os garotos começaram a dizer que havia errado, pois estava assado. Olhou para seu tio, casado com Lavínia, o professor de Ed. Física. Nunca conseguiu decifrar a expressão em seu rosto. Sentiu um misto de fúria e vergonha e ainda corado rebateu: “ Inveja mata”. Não sabia o que fazer. Os garotos se entreolharam furiosos e iriam responder quando Alex mandou todo mundo calar a boca e voltar para o jogo. Não foram somente nas aulas de Ed. Física que isso aconteceu. Júlio sabia que discutir com eles não levaria a lugar nenhum, portanto, ficou em silêncio os olhando com falta de apreço.
-O que foi? Ficou quietinha rápido demais, BONECA! - Júlio teve vontade de dizer muitas coisas para ele. Mas bastou um olhar desprezível, quase psicopático para fazê-lo recuar.
Ele não passa de uma sombra, uma imitação barata do Wellington, que não é nada, nada mesmo. Pensou consigo. Enquanto encarava Bruno, não percebeu que Wellington saiu de seu lado para sentar junto a Júlio. Segurou com força o queixo do garoto e o fez encara-lo. Instintivamente Júlio tentou afastar-lo com as mãos, no entanto, ele era muito mais forte e segurou as duas de uma vez só sem fazer muito esforço. Sem ter outra escolha, o olhou. Seus olhos negros irradiavam um brilho estranho que fez Júlio sentir medo e recuar.
-Escuta! Não vai responder meu amigo? - disse virando a cabeça de Júlio a contra gosto para Bruno que, soltou um sorriso torto e amedrontado. Com rapidez, prendeu seus braços atrás das costas com uma mão e com a outra deu uma chave de braço. Júlio não teve medo. Wellington não teria coragem suficiente para machucá-lo. Pelo menos não na frente da escola inteira. Enquanto se retorcia, Júlio passou os olhos ligeiramente pelo saguão mas, ninguém estava olhando para eles. Para variar. Ele começou a pressionar com mais força seu pescoço.
-Me solta... tá... sufocan... sufocando! – disse relutante. Percebendo que a situação estava ficando complicada Wellington o soltou dizendo mais asneiras:
-É pra você aprender quem é que manda viadinho! Da próxima vez que me responder quebro teus dentes! – falou com raiva elevando o tom de voz e apontando com o dedo na cara de Júlio que virou o rosto respirando ofegante para não rir de tanta hipocrisia. Ele só podia rir. Houve uma época em que essas coisas o deixavam realmente abalado.
As pessoas mudam e começam a rir da própria desgraça, pois a vida é uma imensa tragédia, e porque acrescentar mais sofrimento se posso rir do nada.
"BRING" O sinal soou. Foi muito cômodo para situação. Júlio aproveitou a distração e correu rápido. No caminha de volta para sua clase, Wellington gritou no meio dos outros alunos que a contra gosto voltavam às suas salas:
-Ainda não acabamos - Júlio olhou com ódio para ele, que cerrou os dentes, enraivecido.
Voltou a andar em direção a sua sala. Era a última do corredor e ficava ao lado do auditório. Ele entrou na sala e sentou, onde, desde a 5ª série se sentava: a penúltima carteira ao lado da janela. Verônica, costumava sentar atrás dele. Na fileira ao lado sentavam as velhas amigas dela. Desde o fim da 8ª série quando ela foi embora para o Mato Grosso junto com a mãe, Júlio havia ficado completamente só.
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A verdade e suas formas abstratas
RomanceEm um espaço de privamento e violência, vive Júlio, de A verdade e suas formas abstratas. O romance é uma espécie de transformação progressiva. No início, Júlio é vítima da violência do pai, da intolerância religiosa da avó e do preconceito na escol...