Cap 1

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Não sou e nunca fui aquele tipo de garota que tem muitos amigos, na verdade só tenho um e eu não posso afirmar que ele é meu amigo de verdade. Ele só anda comigo, por que frequentamos a mesma igreja e ele ama bajular o reverendo, mais conhecido como meu pai.

Estou voltando da escola, com o meu suposto "amigo", como em qualquer dia comum. E ele tagarela sem parar, falando algo sobre meu pai ser incrível, de como eu tenho sorte de tê-lo e blábláblá. Não que eu não me orgulhe disso, afinal ele é meu pai. É só que depois de um tempo você cansa de só ouvir isso e das pessoas só se aproximarem pra isso. É desgastante. E quando ele começa a falar essas coisas, que no caso, é sempre. Eu não falo mais nada e nem presto atenção algumas vezes, devo admitir. Por que será que todos repetem o mesmo? Pra que tanta bajulação? Eu nunca vou entender.

Assim que paramos na frente da minha casa, espero que ele termine mais uma frase de adoração e me adianto:

-Tenho que entrar- lhe lanço um sorriso forçado e antes que ele se ofereça para me levar até a porta, saio correndo.- Tchau John, até amanhã.

Quando escuto ele responder, já estou dentro de casa. Sorrio ao sentir o bafo da cozinha, mamãe deve estar cozinhando. Vou até a cozinha e como o esperado, mamãe está olhando algo no forno. Analiso a bancada, onde tem pão assado e... Ervilhas? ECA. Quando volto a olha-la, ela me encara com pesar. Me aproximo dela e lhe dou um beijo. Pego um copo e me sirvo de água.

-Como foi seu dia?- ela sorri e me encara curiosa como sempre. Ela parecia estar sempre à espera de algo novo, mas eu sempre acabava a decepcionando.

-Foi normal- lhe lanço um sorriso, puxo uma cadeira e me sento.- Teve prova de e inglês e um trabalho de Geografia, que fiz com John- falo por fim e noto que aquela pontinha de expectativa que estava tão viva em seu olhar se esvair em poucos segundos. E para disfarçar ela estampa um sorriso amoroso e volta a agir normalmente, como se nada disso tivesse acontecido. - Então, o que teremos para o jantar?- mudo de assunto.

-Sophie?- ela nota que eu estava encarando fixamente a vasilha de ervilhas e chama minha atenção. -Me desculpe, filha.- ela suspira- Seu pai me pediu para que fizesse elas hoje.- olho pra ela e vejo culpa em seu olhar, me levanto e vou até ela. -Me desculpe, mesmo. -ela insiste, eu sorrio e a abraço. Passamos um tempinho assim, até que escutamos um carro entrar na garagem. -Suba e vá tomar um banho, quando tudo estiver pronto eu lhe chamo.- ela beija a minha testa e volta a fazer o jantar.

Pego minhas coisas e subo. Vou até meu quarto, largo as coisas da escola, pego uma muda de roupa e vou para o banho. Depois que saio, seco o cabelo e pego alguns deveres para adiantar, já que o jantar ainda não estava pronto.

Acordo com uma batida insistente na porta. Me levanto, ainda um pouco grogue por causa do sono, vou até a porta e a abro.

-Me desculpe, acabei pegando no sono- falo pro meu pai, que me encara um pouco descontente.

-Tudo bem- ele olha para o quarto e vê os livros espalhados e passa a mão na minha cabeça, sorri e deposita um beijo na minha testa.-Vamos descer, o jantar já está pronto.- então desço com ele e sentamos para o jantar.

Depois que oramos, nos servimos e começamos a comer silenciosamente.

-Sophie?- de certo modo, eu já pressentia que ele iria acabar chamando minha atenção.

-Pai- levanto o olhar do meu prato para encara-lo.

-Quer que eu lhe passe as ervilhas?- pergunta ele, enquanto me encara. Desvio o olhar e fico em silêncio, enquanto encaro a vasilha na minha frente. -Você sabe, que muitas pessoas não tem o que comer, nem uma porção ervilhas. Todo alimento é sagrado.- sua voz havia ficado séria, assim como seu olhar que agora me penetrava e eu podia sentir sem nem mesmo olhar pra ele. Senti a tensão cair sobre a sala de jantar, enquanto ele aguardava em silêncio eu pegar a vasilha que me oferecia. Voltei meu olhar para minha mãe, ela encarava o seu prato, sem nem piscar. Antes que ele voltasse a falar algo, me adiantei e peguei a vasilha sem encará-lo e me servi.

-Obrigado- falei quase como um sussurro.

-Não há de que.- ele deu uma garfada e depois de engolir voltou a falar comigo.- Então, como foi no seu teste de inglês?

-Fui bem, tirei a maior nota da classe.- falei, enquanto encarava o prato e assim que eu dei uma garfada, ele desviou o olhar.

-Muito bem- ele me elogiou, mas eu não sabia se era pela nota da prova, ou por ter comido aquela coisa nojenta. E então ele começou a falar sobre algo com a minha mãe, que não prestei a atenção por estar tentando não cuspir todo o meu jantar. Quando finalmente dei a última garfada, percebi que minha mãe me encarava preocupada. Quando levantei o olhar, percebi que agora os dois me encaravam.

-Sophie, seu pai tem uma noticia para lhe dar.- ela disse e me lançou um sorriso.

-Bem, eu recebi uma proposta- ele me encarava, um tanto animado.- Eu recebi uma proposta para ser reverendo de uma igreja maior do que a daqui, e eu aceitei.

-Onde?- perguntei, enquanto o encarava.

-Washington- ele falou despreocupadamente.

-Essa não é a cidade que vocês nasceram?- pergunto com uma pontada de curiosidade.

-Sim- responde minha mãe, com um sorriso estampado no rosto que eu nunca havia visto antes. Ela aparentava estar bastante contente. Sorrio em resposta, por ver ela daquela maneira.

-Com a sua licença?- assim que meu pai assente, me levanto e pego o prato para levar até a pia. Mas antes que eu atravesse a sala, minha mãe diz que deixe ali que ela cuidaria daquilo e que eu precisava descansar.

Não tento faze-la mudar de ideia, pois eu sei que provavelmente não conseguiria. Então eu subo, me arrumo e deito para dormir. A ultima coisa que me lembro antes de adormecer, é de estar chateada, por eles decidirem as coisa sem se quer, me perguntar o que eu achava e eu ser sempre a última a saber.


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