Duas semanas depois, numa manhã de vento frio em novembro, Holly parava de trabalhar para fazer sua hora de almoço, quando alguém entrou no jardim, deixando-a consternada.
- Bom dia - Pierce cumprimentou-a. - Fui informado de que você estava trabalhando aqui. Seu rosto está vermelho como uma rosa Felícia. Está pronta para almoçar?
- O que está fazendo aqui? - ela inquiriu, apreensiva.
- Tive vontade de dar um passeio pelo campo e, como queria vê-la de novo, torturei Fujiko até ela me dar o seu endereço.
- Não vejo por que você queria me ver de novo, sabendo que não gosto de você... e nunca vou gostar.
- Conhece o ditado "Nunca diga nunca"? Dizer que vai sentir para sempre o que sente agora é um tanto radical, não acha?
- Que diferença faz para você? Já tem noventa e cinco por cento do sexo feminino caindo a seus pés. Por que precisa me conquistar, também?
- Sinto-me atraído por você, Holly, desde a primeira vez que a vi. Mas, na ocasião, você tinha dezenove anos, era pouco mais que uma criança. E eu estava envolvido com sua irmã. O que você fez depois do jantar foi a coisa mais engraçada que já vi. Adorei seu senso de humor e admirei sua coragem ao se expor daquela maneira.
Surpresa pela declaração, Holly não sabia o que dizer.
Passara todos aqueles anos culpando-o por não ter achado graça em sua brincadeira. Agora, ele confessava que, por trás da máscara de reprovação, havia escondido sua admiração. Seria possível?
- Ouvi falar de um bom restaurante perto daqui. Na esperança de persuadi-la a almoçar comigo, reservei uma mesa para dois, antes de deixar Londres. Vai aceitar o convite e me dar a chance de provar que, o que quer que eu tenha feito no passando, não sou um homem tão mau?
Seria difícil recusar um convite tão persuasivo. Especialmente vindo de um homem cujos atrativos não poderiam ser negados, nem mesmo por seu pior inimigo.
- Está bem... mas ainda não entendo por que minha opinião faz diferença para você.
Quando saíram do Jardim onde Holly estivera trabalhando, caminhando na direção da casa que estava sendo construída pelo casal que a contratara, Pierce falou:
- Fale-me do seu trabalho. Vejo que a casa é nova, mas o Jardim parece muito velho.
- A primeira vez que o proprietário viu o lugar foi de seu avião particular. Você tem um avião?
- Sim, mas vim de carro. Quando a distância a percorrer é curta, prefiro dirigir. Imagino que o jardim tenha sido o que atraiu o proprietário.
- Sim, por ser tão grande. Porém, ele descobriu que a casa ao qual pertencia foi demolida há quarenta anos. Então, comprou o terreno para contribuir uma casa menor e mais funcional que a mansão original, mas quer que o jardim seja uma reprodução daquele projetado por Harold Peto, no início do século. Os teixos foram plantados por ele, e há muitas outras plantas escondidas no mato.
- Quem fez o trabalho de detetive? O proprietário ou você?
- Eu, na maior parte. Adoro esse tipo de descoberta.
- Quando vai terminar?
- A casa ficará pronta na primavera. Até lá, o jardim deverá estar em condições de ser entregue ao jardineiro que o casal vai contratar.
- Já está comprometida com outro trabalho, depois desse?
- Mais ou menos. Cuido de alguns jardins e a revista House and Garden vai publicar uma matéria sobre um deles no número de janeiro, o que deverá me proporcionar trabalho extra. De onde conhece as rosas Felícias?
- Vi algumas na casa de um conhecido e perguntei que flores eram aquelas. A textura e a cor de suas faces me fizeram lembrar daquelas pétalas. Quando a conheci, você ainda era um botão. Agora, se fosse uma rosa, estaria no ponto para enfeitar um vaso, ou para ser o foco de um quadro de Fantin-Latour. - Pierce sorriu. - Sim, ouvi falar dele. Está surpresa, não é? Deve pensar que sou um burguês fútil.
- Não me passaria pela cabeça que você se interessasse por pitores franceses do século dezenove - Holly admitiu.
- Tudo me interessa. A vida é como um imenso armazém, repleto de produtos de todos os cantos do mundo, de todos os séculos, desde o início dos tempos. É preciso investigar minuciosamente tudo o que há lá dentro, antes de fazer uma escolha com relação ao que queremos para nós. Algumas pessoas nunca vão além de carros caríssimos, roupas de griffe, esse tipo de coisa. Estou começando a descobrir o que há nos cantos obscuros do armazém. Fantin-Latour é um exemplo.
Holly ficou em silêncio, perturbada pela constatação de que, se aquela era a visão que Pierce tinha da vida, ele teria se dado muito bem com seu pai. O professor também virá o mundo como fonte de maravilhas, mas oscilara entre a raiva e o desespero, porque as aspirações da maioria das pessoas eram tão baixas e seus horizontes, tão estreitos.
- Quando foi que descobriu o caminho para o departamento de jardinagem do nosso armazém metafórico? - Pierce perguntou.
- Minha avó me deixava ajudá-la a cuidar do Jardim. Deu-me um pequeno canteiro e algumas ferramentas de jardinagem de brinquedo. Foi assim que tudo começou.
- Aonde esta morando, enquanto trabalha nesse projeto?
- Aluguei um chalé de veraneio. Não tem aquecimento central, mas o fogão antigo mantém a sala aquecida.comprei uma grande quantidade de lenha e um cobertor eletrônico.
- Dorme sozinha o tempo todo... mesmo nos fins de semana?
- Nunca durmo sozinha. Partilho minha cama com um gato adorável. Ele foi operado para não ficar andando atrás de gatas e miando por ai, durante a noite. É uma pena que certos humanos não possam ter igualmente neutralizados. Isso evitaria uma porção de problema.
Pierce riu.
- Olhando para você, ninguém diria que possui noções tão severas. Sua docilidade não passa de uma falsa aparência. Certamente, numa vida anterior, você foi sacerdotisa de uma sociedade matriarcal, onde a maioria dos machos eram castrada na puberdade, com exceção de uns poucos, poupados para fins de reprodução.
- Não sou contra os homens enquanto sexo. Só faço objeções àqueles que têm o sexo na cabeça. Detesto ser tratada como objeto sexual.
- Devia usar burka, aquele traje longo e negro que as muçulmanas vestem, a fim de impedir que os homens as admirem. É claro que não seria nada prático para cavar jardins. É comum paisagistas mexerem com a terra? Sempre pensei que usassem mais uma prancheta do que uma pá.
- Depende do paisagista. Para mim, trabalhar diretamente com a terra ajuda a resolver questões estéticas.
- Concordo, mas quando tenho um problema, vou para o clube e nado. É a mesma coisa. A atividade física repetitiva faz a mente funcionar melhor do quw fica sentado, olhando para o vazio.
Quando chegaram ao local onde os trabalhadores deixavam seus carros, um Jaguar elegante e bem-cuidado, apesar de bastante antigo, chamou a atenção de Holly. Esperava que ele possuísse um carro caríssimo, que chamasse atenção. Porém, ao que parecia, Pierce não precisava sentir-se invejado, como a maioria dos homens. Na verdade, ele dissera exatamente isso havia pouco, mas Holly não acreditará.
Ficou impressionada pelas maneiras de Pierce, que não só abriu a porta do carro, mas também puxou o cinto de segurança para que ela o colocasse. A maioria dos homens não fazia nada disso, nem sabia que esse comportamento já fora um padrão, um dia. O prof. Nicholson, porém, sempre fora um perfeito cavalheir. Holly costumava avaliar os homens comparando-os ao pai, o que os colocava em grande desvantagem.
- Fala-me sobre seu gato. Também tenho uma gata angorá, mas ela dorme numa cesta. Foi presente de uma tia. Como as leis britânicas proíbem a entrada de animais no pais, Louisa, um filhotinho na época, transformou minha casa num abrigo para imigrantes clandestinos. Está chocada?
- Surpresa. Como você mesmo disse, sou uma puritana e, portanto, não costumo desrespeitar as leis deliberadamente.
- Seria capaz de denunciar sua tia predileta?
- Não. E se o gato tivesse recebido todas as vacinas, não haveria o risco de transmitir doenças nenhuma, especialmente a raiva. Minha avó, que viajou pelo mundo inteiro, dizia que os ingleses são paranóicos com relação à raiva.
- Os ingleses são interessantes:ou são os maiores aventureiros do mundo, ou então, tão isolados em sua Cultura, que nem sequer admitem existir outros modos de vida, que podem até ser melhores. Mesmo assim, escolhi viver aqui, em vez de ficar no meu país de origem, ou em qualquer outro.mas, voltando aos gatos, de que raça é o seu?
- Vira-lata, mas muito bonito. Chama-se Parson e costuma me acompanhar no trabalho. Hoje, quando acordei ele já havia saído. Os proprietários do chalé também têm um gato, o que permite a Parson passear à vontade. O lado ruim é que, quando chego em casa à noite, sempre encontro os restos de suas caças pelo chão. Quem cuida da sua gata quando não está em casa.
- Tenho um empregado e uma faxineira. Hooper não mora no emprego, mas passa a maior parte do dia lá. Assim, Louisa não se sente solitária. - Pierce faz uma pausa. - Quem diria! Depois do encontro lamentável que tivemos da última vez, aqui estamos, comparando nossos gatos! Sabia que os japoneses fazem o possível para evitar confrontos?
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Orgulho E Preconceito
ChickLit*Essa história não é minha, é da autora Anne Weale *Plágio é crime Uma cilada do destino... Holly sabia que não era bonita, mas esperava, assim mesmo, que um dia fosse encontrar um homem que a amaria e se casaria com ela O problema era que o único h...