Parte Um - Decisão

165 12 2
                                    


Luna é o nome dela.

A garota de longos cabelos ruivos caídos pelas costas, quase até abaixo da cintura. Olhos castanhos e sobrancelhas grossas, sua marca.

Sua antiga casa se encontra em chamas, tudo perdido, ruindo com o fogo e a tristeza de Luna. Foi por sua culpa que isso aconteceu, agora seus pais estão mortos. Ela chegou tarde demais.

Fuligem cai ao seu redor e mancha ainda mais sua alma ferida, doía mais que as cicatrizes que leva no corpo, marcas das lutas com os guardas reais naquela manhã para fugir do castelo. Tudo para conseguir avisá-los a tempo, para se salvarem... mas agora, Luna ergue o capuz protegendo sua cabeça e caminha para a floresta com as lágrimas.

Já é noite, levou quase um dia inteiro de caminhada até a casa, para agora sair sem rumo entre as terras do reino de Julius. O Rei que mandou fazer aquilo com sua família, por sua traição.

Luna é sobrinha do antigo rei, que morreu quando ela ainda era um bebê. Escolheram Julius, com a promessa de que o filho dele no futuro se casaria com ela, para unirem duas linhagens nobres de Allamanda. Dizem ser auspicioso para o reino, trará glória para a família real. O problema é que Luna não quer se casar com o príncipe Renan. Ela sempre foi apaixonada por seu amigo de infância, Lucas. E este, agora a encontra com um abraço apertado.

—Foi minha culpa, Lucas... — Ela se permite chorar nos ombros dele. Angústia, revolta e a perda forçando seus olhos a se encherem de lágrimas intermináveis. — Eles não sabiam, eles foram atacados dormindo, meus pais...

—Shii... — Lucas prolonga o abraço, abaixando o capuz para alisar os cabelos de Luna, acalmá-la. Reconfortá-la. — A culpa não foi sua, Luna. E sim daquele tirano que chamamos de rei! Rei Julius pagará por isso...

—Mas eles vão me caçar, agora que fugi do castelo vão me procurar e ofertar recompensa a quem me encontrar. Eles vão me matar! — Luna sente como se o mundo esteja desabando lentamente sobre sua cabeça, imagens de seus pais passando em sua frente, desespero batendo-lhe a porta. — Não tenho para onde ir, eles vão me encontrar, eu...

Mesmo Luna sendo descendente do antigo rei, nunca fora tratada como membro da nobreza. Apenas filhos têm esse poder em Allamanda e ela é sobrinha do falecido. Morava em uma casa simples, seu pai era lenhador e a mãe, tecelã. Luna nunca teve acesso ao castelo livremente, mas sempre soube que seu futuro estava reservado como futura princesa de Allamanda, como desejo de seu tio, que não teve filhos. Agora o que diria ele, sabendo que seu pedido feliz era uma promessa infeliz na vida de Luna?

—Hey, Luna, olhe para mim! — Ela chora escondendo o rosto entre os cabelos, com a floresta escura, a pouca luz vem da lua. É possível sentir o cheiro de fumaça, fogo por perto. — Luna, confie em mim. — Ele segura seu rosto molhado com as mãos, fazendo-a olhá-lo, pedindo amparo. — Não vão fazer nada com você, mas... você sabe o que fazer. O que precisa ser feito.

Luna ainda o olha, incapaz de desviar os olhos daquele azul dos olhos de Lucas. Ele sabia que agora seria impossível fugir dos guardas do Rei Julius, seriam caçados até a morte.

Lucas não tem família, vive sozinho como ferreiro e várias vezes pediu a Luna que aceitasse fugir com ele. Outros reinos, tantos lugares onde poderiam tentar achar a felicidade. Mas esse pensamento, a sensação de felicidade, a esperança de ser assim novamente, parecia distante demais para Luna.

—Lucas... é perigoso demais...

—Case-se com Renan. — As palavras parecem duras, frias como pedras. Luna não acredita no que Lucas diz, pensou que ele fosse dizer para... — É a única forma de te aceitarem. Você estará em segurança...

—Não! Lucas? — Ela se afasta dele, surpresa e magoada. Porque todos pareciam querer machucá-la hoje? — Do que você está falando? Não posso me casar com alguém que não amo!

Aquelas palavras fizeram Lucas se calar; ele abaixa os olhos para a terra coberta de gravetos e folhas secas, animais pequenos grunhindo no escuro.

—Você pode aprender a amá-lo. — Ele diz lentamente.

—Você está ouvindo o que está dizendo?! Lucas, não posso fazer isso. Eu...

—Você se sentirá infeliz, nos primeiros dias. Achará que tudo está errado e que falta alguma coisa, mas os dias vão passar. As estações, os anos... a tristeza vai passando e você poderá se sentir segura, feliz por alguns momentos. Talvez capaz de amá-lo, como ele diz te amar. Você ainda será feliz, Luna.

Alguns instantes se passam enquanto um apenas olha para o outro. Luna quer sair dali correndo e nunca mais vê-lo, nunca mais se quer pensar que ama aquele garoto desde os treze anos. E sabia que era recíproco... agora ela não sabe mais de nada. Não tem mais nada a não ser uma coisa a dizer:

—Se é assim que você quer... Voltarei ao castelo de Allamanda. 

A promessa de AllamandaOnde histórias criam vida. Descubra agora