Capítulo 4 Woke up dead (Kyla La Grange)

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Florence Force acordou ao final da manhã no dia seguinte. Seus olhos mal conseguiam ficar abertos, mas ela tinha a vaga sensação de ter algo muito importante para fazer e de que não devia ter dormido tanto tempo. Mesmo antes de sua vida se tornar o que era hoje, Janice nunca foi o tipo de mãe que se importava em acordar a filha cedo.

A garota se levantou meio trôpega, foi até o banheiro anexo lavou o rosto e só então se olhou no espelho. Estava com os olhos inchados, com olheiras e os cabelos longos e vermelhos estavam cheios de nós. Mesmo assim, ela parecia divina. Não que Florence se achasse mesmo linda, mas qualquer pessoa que a visse, mesmo logo após acordar, diria que ela era o ser mais incrivelmente belo da face da terra.

Ela tratou de escovar os cabelos, os dentes, terminou de lavar o rosto e, sem usar nem a mais leve das maquiagens, vestiu um casaco longo vermelho vivo, calças justas de lã e a bota de couro cru sem saltos. Sem muito esforço poderia parecer com uma daquelas modelos de catálogos de roupas. Por trás de toda a sua beleza ofuscante, ninguém sabia que Florence escondia uma maldição agourenta e um rastro de morte e infelicidade por onde tinha passado nos últimos anos.

Pircy a tinha alertado. O que ela vinha fazendo nos últimos anos não era viver, mas sim se esconder e, mesmo isso não tinha dado certo, já que ela sempre acabava encontrando problemas. Florence precisava ser ela mesma, mostrar-se para as pessoas e viver sua vida, sem se importar com o que aconteceria.

No entanto, quando essa rebeldia passageira ia embora, ela pensava nas pessoas que estaria colocando em risco voltando para a sociedade. Ela não entendia como as almas que seriam entregues ao apanhador eram escolhidas, não entendia o magnetismo que exercia no sexo oposto e não entendia como eles sempre acabavam morrendo de um jeito ou de outro enquanto estavam na sua presença.

Mas em Fancywood as coisas seriam diferentes. Pircy a tinha feito enxergar que tudo podia ser diferente desde que ela quisesse e ela queria isso mais do que qualquer outra coisa em todo o mundo. Janice não poderia controlá-la, ou forçá-la a ficar em casa. Florence era livre para fazer o que quiser e sabia que podia contar com a ajuda do jovem Almond. Além do mais, agora ela pensava que estava em vantagem.

Era exatamente esse o sentimento mais transbordante quando ela deixou seu quarto.

Daria cem páginas minhas para que tivesse passado trinta anos sendo lido compulsivamente por ela e não por Vera Almond. Florence Force, além do suprassumo da beleza, era o suprassumo da inteligência.

Tinha uma memória vívida e uma mente aguda e sagaz, mas me incomodava o tanto que ela pensava em Pircy. Ele estava ali, em cada pensamento da garota.

— Aonde você pensa que vai? — perguntou Janice, barrando o caminho da filha no hall.

— Tenho coisas para fazer na cidade.

— Vai se encontrar com aquele rapaz... Florence, quantas vezes vou ver você se culpar e se despedaçar toda vez que um deles for morto na sua frente? Quantas vezes preciso dizer para que você não faça isso? — Janice estava usando um tom de súplica pouco comum, na verdade, ela tinha gostado muito de Fancywood e suas moradoras religiosas e fofoqueiras. Queria ficar no vilarejo por mais tempo e sua filha estava começando a estragar tudo, como sempre fazia.

— Pois é, você sempre avisa e sempre acontece. Mesmo quando eu me mantenho afastada, isso sempre acontece. Se não é o garoto do restaurante que me serviu batatas fritas é o zelador do prédio onde moramos, ou alguém que se oferece para carregar as compras... isso sempre vai acontecer... Eu quero agir diferente. Quero entender o que eu sou, afinal!

— E você acha que Pircy Almond pode lhe dizer quem você é? — Janice riu. — Deixe de ser ingênua Florence, esse garoto estará morto em menos de três meses e você ficará dilacerada se o conhecer bem.

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