Capítulo único

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Antes que se dêem à estupidez de pensar que a sociedade marciana é igual à terráquea, deixe-me explicar a minha tradução. Eu não traduzi ao pé da letra. Um dos motivos é que não há tradução literal para todas as palavras do idioma marciano e o contrário também é verdade. Por exemplo, marcianos usam todos um único idioma, sendo assim, a palavra "idioma" não existe no idioma deles.

Eu sou dum planeta qualquer, e apenas vou narrar em português, as coisas que aconteceram com um certo menino marciano.

Seu nome era um nome bem comum em seu planeta, então seguindo a minha lógica de tradução, ele se chamava José.

Vamos começar.

Era uma vez um planeta que não tinha órbita. Ele saia ziguezagueando pelo universo. Era uma vida difícil para aquele povo que vivia ali e não tinha como ter uma rotina, não tinha como marcar o tempo e nem nada do tipo.

Um dia, esse planeta se aproximou de uma anã amarela, e começou a circulá-la. Mas sua órbita estava muito próxima daquele Sol, e metade daquele planeta, morreu queimada enquanto a outra metade aproveitava a noite.

Quando a metade que estava no escuro descobriu o que houve no outro lado do planeta, com muita pressa conseguiram improvisar abrigos no subsolo. O subsolo foi se desenvolvendo bastante em tecnologia e, até hoje, é onde eles moram.

Os habitantes de um planeta próximo, planeta Terra, chamam esse planeta de Marte.

Muito tempo depois de esse planeta estar orbitando um Sol, um menino nasceu. Ele era branco. Os marcianos têm peles entre tons de azul, branco e cinza, pois viveram muito tempo sem um Sol fiel. Aliás, os marcianos vivos nunca se expuseram ao Sol.

Mas com uns 15 anos de idade (anos terráqueos), Zezinho era considerado um adolescente bem diferente do habitual.

— Quais os dois lugares que nunca devemos ir? — Perguntou um tipo de professora na turma de Zezinho.

Zezinho levantou animadamente a mão, ao que a professora o permitiu responder.

— Nunca devemos ir muito mais para o subsolo, para que não morramos torrados pelo núcleo do planeta!

— Muito bem! E qual o segundo lugar?

— A cozinha?

— Não... esse é o que todos sabem, como você pode errar? Quem sabe? — A professora pergunta olhando em volta, indignada por Zezinho não saber algo que era a principal lei de sobrevivência.

— Não podemos ir à superfície, para que o Sol não nos torre. — Respondeu uma menina Bic, recebendo um elogio da professora.

Na realidade, Zezinho sabia a resposta, mas ele era um dos poucos com senso de humor e sarcasmo em todo o planeta. Por isso era considerado estranho e burro. Ainda assim, a curiosidade que ele tinha quanto a ir para a superfície, era imensa! E ele sabia que bastava chegar lá de noite para não ser torrado. Era cinquenta por cento de chances.

Ser torrado era o principal medo de qualquer marciano. Mas haviam tubos que levavam à superfície para permitir que o gás que os marcianos respiram entre no subsolo. Também há câmeras pelas quais ele observam os movimentos da superfície e pelas quais descobriram que haviam outras coisas além deles no universo.

Quase morreram de medo das sondas que os humanos enviaram.

Zezinho era filho de um dos responsáveis pela monitorização dos tubos. Então foi até seu pai e pediu:

— Pai, há algum jeito de se subir para a superfície através dos tubos? Se sim, me dê um mapa!

— Para que quer isso? Tem a possibilidade de se subir pelos tubos até a superfície pois eles se parecem escadas. Foram feitos assim para caso seja necessário voltar até a superfície. Para quê você quer um mapa? Vai subir até lá?

— Não.

— Então tome.

Essa era outra das características de Zezinho. Quase todos os marcianos são completamente honestos e por isso acreditam em tudo que outro diga. Zezinho consegue mentir e desconfiar. Eles também não têm essas palavras: verdade, honesto e nem seus antônimos e derivados.

Zezinho observou o mapa bem simples dos tubos. Havia no mapa, a observação de que todos os tubos são iguais ele sabia qual era o mais próximo.

O garoto se dirigiu até a abertura do tubo e começou a subir. Parou umas vinte vezes para descansar e subir novamente.

Ele havia dito ao pai que estaria na casa de seu amigo pelos próximos dias.

— Bom dia, amigo de meu filho José! Como você está, e como está meu filho?

— Eu estou bem. Mas não vejo seu filho há muitos dias, por isso não sei te responder.

— Meu filho está em sua casa. Ontem ele me disse que passaria alguns dias em sua casa.

— Eu não o vi. Por certo, ele está escondido em algum lugar lá dentro.

— Com certeza. Se o ver, diga o pai dele o desejou bem estar.

— Eu direi.

Já haviam três dias que Zezinho estava a subir quando finalmente chegou à superfície avermelhada do planeta. Ele chegou bem na hora do nascer do Sol, e aí morreu torrado.

Por Quê Você Nunca Viu Um MarcianoOnde histórias criam vida. Descubra agora