Capítulo #6

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Os corredores eram largos, vazios e confusos. Apesar de William já ter visitado diversas vezes aquele shopping antes da guerra, nada mais estava igual. Todas as lojas, ou melhor "blocos", cobertos com panos, davam a impressão de que ele andava em círculos. Os poucos blocos que realmente agiam como lojas traziam um pequeno sentido de direção a ele, mas que também causavam diversas dúvidas de o que era alguma daquelas coisas à venda, e de quem compraria um pneu de carro, ou uma bóia que parecia vir de um barco ou cruzeiro.

Indiferentemente, enquanto se indagava com perguntas sem respostas e tentava achar as escadas para o andar de baixo, o estomago de William roncou.

Ele estava muito tempo sem se alimentar direito, mesmo considerando a barra de cereais que Alex lhe entregara e que havia comido. A verdadeira última "refeição" que tinha feito, fora antes mesmo de ter se perdido de Amanda. Um ensopado de pomba que o sogro preparava com certa freqüência nos últimos dias que passaram. Isso com pedaços de pão, quando possível.

Não por coincidência, William passava por uma específica loja naquele momento. O letreiro, escrito em uma placa de papelão, dizia "Doceria Batelle", e com a fome que ele estava, mesmo que estivesse dezenas de metros de distância, reconheceria os pacotes de bolacha e biscoitos em cima da bancada. Ao lado da diversidade de chocolates, balas jarras de suco, William encontrou algo que para ele já estava extinto. Um bolo. Era lindo, aquela cor alaranjada de cenoura com cobertura cremosa de chocolate por cima. Seus olhos brilhavam de acreditar que uma delicia daquelas ainda podia ser encontrada.

Mesmo não sabendo como os vales funcionavam, ele foi consumido pela fome, essa que já era maior do que a timidez de não arriscar perguntar. Ele começou a ir em direção da loja.

Atrás da bancada havia um velho homem sentado numa cadeira estofada. Cabelos brancos, olhos verdes e bem cansados, e com algumas cicatrizes pequenas no rosto, como se tivesse se cortado inteiro. Estava vestido como praticamente todos outros homens, uma camisa e calça social, todo ajeitado. Ao lado, misturando o suco, uma garota, essa que muito mais jovem, aparentando ter a idade de William. Ruiva com a franja cobrindo a testa, os olhos verdes iguais do velho e usando um vestido branco, modelado em seu corpo.

- O-Oi... - disse William sem jeito.

- Oi, bem vindo a Doceria Batelle! - retrucou a garota com uma voz aconchegante. - O que você deseja?

- Eu... er.. Eu sou novo aqui, e-e... gostaria de saber se posso usar um desses vales? - respondeu William tirando os vales correspondentes do bolso.

- Esses vales só servem no bandejão, nos aqui só aceitamos dinheiro. - berrou a voz rouca do velho.

- Desculpe, mas eles só valem para o refeitório, que fica no térreo. - tentou explicar a garota, de forma amigável.

- Ah sim... Obrigado mesmo assim. - disse William, já se virando e saindo da doceria.

Enquanto saía, escutou alguns murmúrios da garota, mas como não conseguia ouvir direito pensou que ela estava falando dele para o velho, porém não ligou. Continuou andando pelo corredor, dessa vez focado em ir para seu dormitório. Ele já tinha passado por muita coisa, queria deitar e processar tudo que havia acontecido.

De repente William ouviu o barulho de alguém correndo atrás dele, seguido de um "Ei! Licença!". Ele se virou e viu garota da doceria.

- Oi! Eu queria pedir desculpas pelo meu avô. Ele é um tanto... grosseiro as vezes. - disse ela constrangida. - Então, conversei com ele e o convenci aceitar o vale. - ela sorriu assim que terminou de falar.

- Obrigado! Mas realmente, não precisa, não quero causar nenhum incomodo.

- Mas não está causando. - uma de suas sobrancelhas arqueou. - Meu avô que chega ser um incômodo as vezes. - ela riu. - Fica tranquilo, depois eu uso esse vale seu num almoço para mim.

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