Lágrimas escorriam no rosto de Gabrielle ao terminar de falar. William não sabia muito bem o que fazer, não era como se eles fossem grandes amigos para ele ir abraçá-la em meio de consolação. Ele preferiu gentilmente colocar a mão no ombro dela.
– Desculpe ter tocado no assunto. – disse ele.
– Tudo bem. Não é como se as coisas estivessem bem, não é? Hoje o Doug saiu em mais uma missão, e mais uma vez eu fico aqui contando os segundos para ele voltar, com medo do que pode acontecer. – respondeu ela enquanto enxugava as lagrimas.
– Ele vai voltar bem. – disse William um pouco incerto. – Posso não conhece-lo muito bem, mas pelo que percebi ele sabe se cuidar.
– Sabe sim... – respondeu Gabrielle, parecendo distante.
– Mas então, o que você faz aqui em cima? – ele se esforçava para mudar de assunto.
– Fico de vigia. Faço questão de atirar em qualquer pessoa que atravesse aquela faixa. – respondeu ela apontando para uma faixa amarela ao longe.
A faixa pintada no chão e por cima dos escombros devia estar a uns bons metros da entrada do shopping e fazia uma volta inteira pelo perimetro que o gigantesco shopping ficava. Também era de se notar que próximo a ela não havia grandes elevações, provavelmente para que não houvesse lugares onde inimigos pudessem se esconder.
– Mas e quem não sabe? – perguntou ele. – Quero dizer, e se alguém não sabe que aqui é a Old Fashion acaba passando a faixa?
– Têm avisos. – respondeu ela direta. – Nós colocamos alguns avisos para que não ultrapassem a faixa.
– E já aconteceu de alguém ultrapassar?
– Algumas vezes... Maioria delas foram uns malucos da Red achando que iam atingir a gente, outras só uns desavisados.
– Já atirou em alguém?
– Uma vez. – retrucou séria.
– Estou te atrapalhando ficando aqui, não é? – perguntou William mudando o foco, depois da resposta seca de Gabrielle.
– Não! Definitivamente não! Os coronéis não gostam muito que nós fiquemos conversando, dizem que nos tira a concentração, mas para falar a verdade, quase nunca acontece alguma coisa. A última vez deve fazer umas duas semanas.
– Menos mal, eu acho. – ele se virou para o horizonte. – Engraçado né? Agora que não tem aquelas centenas de prédios cobrindo a vista, faz parecer que o dia é mais limpo... mais lindo...
– Quem dera fosse! – replicou Gabrielle, abaixando o rifle e admirando o céu junto com William. – Quem sabe um dia não será?
Por alguns minutos os dois ficaram calados, ouvindo apenas o vento passar por eles e rebater nas colunas que suportavam o teto. William admirava o céu e todo seu esplendor e infinidade. Gabrielle já tinha levantado o rifle e agora voltava a vigiar o perímetro.
– Você não fica entediada? – perguntou, quebrando o silencio.
– Às vezes. – respondeu ela, ainda vigiando. – Sei lá, aqui é calmo, quieto, me dá tempo para pensar, sabe? Às vezes penso no passado, às vezes em como vai ser o futuro, às vezes não penso em nada. – continuou ela, seguido de um suspiro. – O melhor mesmo é não pensar em nada.
William olhava fixamente para Gabrielle enquanto ela falava. Parecia para William que tudo que ela dizia terminava soando depressivo. Não que ele fosse o "Senhor Felicidade", mas ela parecia estar constantemente triste. Lógico, a missão que Douglas estava explicava muito e, além do mais, a situação do mundo inteiro explicava a tristeza de qualquer um. Não que William estivesse reclamando, era ótimo ter alguém para conversar, mas esse fato o fez ficar em silencio por mais um tempo. Ele voltou a admirar o céu, e seguindo o conselho de Gabrielle, tentou não pensar nada, apenas fugir do mundo. Por um tempo funcionou, mas aos poucos perguntas começavam a vir a sua mente. Não era como se ele entendesse tudo que tivesse acontecendo. Não era como se ele entendesse qualquer coisa, para falar a verdade. De uma em uma as dúvidas brotavam na sua cabeça, e tudo que o impedia de fazê-las para Gabrielle era o fato de atormentá-la.
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Imunus
General FictionApós a Grande Guerra, o mundo como era conhecido deixa de existir, dando espaço apenas para destruição e mortes. Alimentos e energia são escassos, e um lugar para se dizer seguro, praticamente inexistente. Em meio de muito sangue e lágrimas, William...