Capítulo 1

139 10 1
                                    

Hoje acordei e nem precisei de tentar me lembrar do sonho que tive, nem tive de dar palpites. Aquela memória nunca sairía da minha cabeça...
Só havia uma maneira: tinha que fazer algo, como por exemplo mudar de árvore (eu geralmente dormia no ramo mais alto de uma árvore, do tipo: "tree sweet tree" ou "árvore doce árvore"). Sim, era o que ia fazer, algumas mudanças fazem bem, e mudar de árvore era um bom começo.
Não precisava de arrumar as minhas coisas já que, eu não tenho nada de que precise, geralmente improviso. Agarrei umas frutas caídas no chão e fui a um riacho que encontrei seguindo o seu som.
Passei as minhas mãos pela água e comecei a esfregar a terra das frutas e lembrei-me de uma memória antes do meu rapto, memórias como esta eram muito raras já que eu tentava muitas vezes afastar esses pensamentos e o sentimento de saudade que vinha com eles. Lembrei-me do cheiro da minha mãe, pêssego... São poucas as frutas que conheço: laranja, maçã, banana e pêssego. Lembro-me do toque dos seus dedos suaves... Lembro-me de sentir carinho. Só não me lembro da sua cara, ou dos seus cabelos...
Não me consegui controlar e lágrimas escorreram-me pelo rosto e fiquei ali sem me aperceber das nuvens e do vento a mudar.
Vi o meu reflexo e acreditei que a minha mãe era assim. Continuei a ver-me e o meu olhar fugiu para a imagem das nuvens, aí acordei das minhas ilusões e fugi, corri dali a sete pés. Sabia graças a esperiência própria que cá na selva se começa a chover não para dias a fio e as margens do rio transbordam. Já fui levada pelas águas enfurecidas pela tempestade aos sete anos, por sorte o meu cabelo ficou preso numa árvore (o que não deixou de me magoar).
Mas agora que estava a correr, já era tarde de mais: lá na selva o clima mudava drasticamente em poucos minutos e a tempestade  já tinha começado.

AbandonadaOnde histórias criam vida. Descubra agora