Prólogo.

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Alguns meses antes...

O barulho das botas entrando em contato com o chão asqueroso era um dos poucos sons que se ouvia em um raio de oitenta quilômetros, fora a sua respiração que estava um pouco descompassada no momento - culpa do esforço que tivera que fazer uns minutos atrás - assim como o barulho de várias goteiras que formavam aquele lugar. Queria ter um espaço melhor para realizar seus trabalhos, mas aquele fora o único que apareceu disponível no momento em que precisou. Uma cabana no meio do nada, ótimo. O lugar poderia ser um lixo, com portas e janelas enferrujadas, madeira podre castigada pelo tempo e alguns móveis velhos que cheiravam a mofo. Mas para ele aquilo estava perfeito, bom até demais.

Cidade? Longe. Pessoas circulando por perto? Nem sonhando. A civilização estava bem distante, tornando toda a diversão ainda maior. Afinal, como ele deixaria que seus brinquedinhos fizessem barulho, se alguém estivesse por perto? Nem lembrava como tinha conseguido encontrar aquele lugar, era tão bem escondido que passava despercebido aos olhos de qualquer um, menos aos dele.

O som de uma respiração pesada se tornando presente, fez com que ele acordasse de seus pensamentos. O seu mais novo brinquedo estava acordando, perfeito. Estava sentindo falta da sua brincadeira favorita, ficar obrigatoriamente um tempo parado era uma tortura. Isso, tortura. Essa era a sua palavra preferida entre muitas outras que estivessem na mesma categoria desta, como dor, sofrimento, tristeza, desgraça. Ah, belas palavras todas estas, pareciam músicas para os seus ouvidos.

Aproximou-se mais da pequena porta que levava ao que ele chamava de, quarto de diversões, conseguindo ter uma visão perfeita do corpo dela, devidamente amarrada a grande maca hospitalar. Notou que a agitação começara a atingir o corpo delicado da garota presa. Adorava ver passo a passo de todo aquele processo, cada estágio atingido pelas escolhidas. O primeiro de todos era o estranhamento. Acordar presa em uma maca hospitalar no meio do nada era sim bastante estranho para uma pessoa que nunca tinha passado por nada parecido. Era engraçado o fato de como todas eram iguais, malditas.

Notou que ela estava perto de atingir mais um dos estágios, desespero. Ao perceber que estava em um lugar estranho, presa e não conseguia se soltar, esse era o momento em que começava a ficar completamente desesperada, o que as faziam gritar. E como ele odiava com todas as suas forças essa parte, nunca gostou de barulho e aguentar gritos finos, clamando por um socorro que nunca viria, era um saco e lhe causava uma profunda dor de cabeça. E assim que viu que os gritos começariam, tratou de dar inicio ao que tanto aguardava. Que a brincadeira comece.

— Shhiu! Não precisa gritar...  - disse calmo ao entrar no campo de visão da garota. Fazendo-a levantar os olhos assustados em sua direção.

Dando início a mais um estágio, medo. E ao chegar naquele momento, todo o seu propósito fazia sentido. O lugar por onde elas deixavam que aquele estágio transparecesse, os belos olhos. Era esse o motivo delas estarem ali. Os belos e profundos olhos verdes esmeralda.

— O-quê? - notou a completa confusão da bela garota em sua frente e isso fez com que um sorriso sádico crescesse em seu rosto. Caminhou lentamente até uma grande maleta que estava posicionada no canto superior da sala, sentindo que ela o acompanhava em todos os seus movimentos. Ainda com o sorriso preso em seus lábios, levou o objeto o colocando na enorme mesa velha que ficava mais próxima da maca. Destravou o fecho revelando todas as ferramentas que eram necessárias para o momento. E isso fez com que a menina ao seu lado ficasse ainda mais assustada. — Por favor, não me machuca, por favor.

Rolou os olhos, impaciente, odiava com todas as forças esse estágio, imploração. Chegava a ser pior que os gritos - com eles pelo menos se divertia - mas aguentar a mesma ladainha de sempre, era exaustivo.

Por favor, não me machuque. Me deixe ir embora, eu prometo não contar para ninguém sobre você. Não me mate. Eu lhe dou todo o dinheiro que quiser, mas não me machuque.

Por que tinham que ser iguais até mesmo nisso?

— Está tudo bem, querida. Só preciso de uma coisa de você...

— Qualquer coisa, mas, por favor, não me machuca - lágrimas já escorriam molhando todo o seu rosto. A parte do choro também era bastante chata, odiava ter que presenciar aquilo também. — Me fala o que você quer, qualquer coisa...

Ele lhe lançou um sorriso diabólico, totalmente satisfeito com o que acabara de ouvir. Aproximou-se mais da garota, que se encolheu ao notar sua aproximação e deixou que sua voz rouca soprasse perto de seu ouvido.

— Eu quero seus olhos.

InsanidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora