2. O dia Z

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São Paulo, Capital, 2019

Duas horas haviam se passado desde que Lucas e Saulo haviam entrado no eletrodoméstico que estava servindo de refúgio, contra os mortos vivos que insistiam em ficar por ali, batendo as mãos sem muita coordenação motora na lataria e incomodando com seus grunhidos intermináveis, semelhante à de porcos.

- E como tudo começou para você? - Perguntou Saulo, molhando os lábios com água - como sobreviveu até aqui?

- Quer saber mesmo? - Perguntou Lucas descrente - é uma história longa e complicada. Para se ter uma ideia nem sempre fui magro como agora, na verdade era bem gordinho.

- Bem filho... - torceu os lábios - estamos meio que presos aqui, os bichos estão lá fora e não tenho pressa de morrer. Acho que tenho um tempo para ouvir.

- Tudo bem então - fechou os olhos.

Ele tentava se concentrar mentalizando seu passado como se fosse viver tudo novamente. Descansou sua arma ao lado e soltou o corpo para relaxar. Não era uma tarefa fácil, pois o barulho de unhas passando pela lataria o incomodava muito.

- Vai demorar para começar? - Resmungou Saulo.

- Tudo bem, foi você quem pediu hein! Tente não dormir, com sorte alguém do meu grupo irá chegar em breve para nos ajudar - disse Lucas lhe mostrando um tom esperançoso para deixá-lo confortável.

Mas... ninguém iria chegar.

Passos Gloriosos, interior de São Paulo. 2016

Lucas Bryan

Um dia antes do acontecimento estava exausto, minha mãe havia tido uma crise terrível em casa. Isso me fez dormir muito tarde, especialmente para quem acordava tão cedo quanto eu. Deitei e fechei os olhos. Aquele maldito despertador antigo da época da minha vó despertou. Abri os olhos para o teto e percebi que eu dormia em um quarto extremamente ruim, cheio de mofo e pó, logo fui pegar minhas roupas e vi que só havia trapos, a tempos não cuidava de mim mesmo.

Fui ao banheiro ainda com os olhos fechados, mesmo assim não esbarrei em nada. Abri a torneira para lavar o rosto para ver se despertava. Aquela água trincando de gelo parecia cortar minha face, me atentei olhar para o chuveiro mas tinha que economizar na conta de energia.

O desânimo me acorrentava de uma forma aterradora, preferia que o mundo acabasse ao invés de mais uma vez ir para aquela empresa. Realmente devo tomar cuidado com o que desejo.

Eu já estava pronto, ainda me sobravam alguns minutos antes de pegar o ônibus fretado da firma, então fiquei bem tranquilo arrumando o cabelo que precisava ser aparado, mas não antes do pagamento pois nem para isso tinha dinheiro. Mas realmente é impressionante como as horas passam rapidamente. Quando me dei conta já devia estar na rua. Peguei as chaves e sai correndo abrindo o portão quando me veio como um tiro na mente a lembrança de que havia esquecido de medicar minha mãe.

- Puta merda! E agora? Ah, acho que um dia sem a medicação não fará diferença - tentava enganar minha consciência - droga, preciso voltar.

Voltei correndo as escadas que não era curta. Cheguei aos comprimidos que eram caríssimos por sinal, lhe dei o remédio e um beijo de despedida, ela ainda tentou me dizer algo haver com paciência, mas fui um tanto ríspido a deixando para correr de volta a rua. Se eu soubesse que aquele seria um de nossos últimos momentos juntos nunca a teria deixado.

Cheguei a rua novamente e por mais um segundo o perderia. Fiquei muito feliz ao ver o ônibus chegando... Feliz modo de dizer pois ainda não queria ter que trabalhar.

Made In Hell - A FugaOnde histórias criam vida. Descubra agora