Strangers

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Estava imóvel a mais de cinco minutos, esperando o momento perfeito para agir. Meu dedo hesitava sobre o botão enquanto o ser à minha frente mexia-se de forma delicada e ainda desconfiada. Mesmo que a minha presença já devesse ter se misturado com a paisagem ao redor, ele ainda conseguia capta-la, era como se estivesse se mantendo atento em mim desde que me agachei ali. Sentindo a minha idade começar a clamar para ser respeitada na forma de uma dor escruciante no fim da coluna, pressionei o botão de forma precipitada, assustando o pequeno esquilo com o flash da câmera.

— Merda... — Soltei um suspiro, cobrindo a lente com a pequena capa circular de plástico e me levantando, ouvindo um estalo alto ao esticar os ossos do meu corpo

Para um fotógrafo, o fim de sua carreira se dá de três formas: ou ele não consegue mais enxergar, ou não consegue mais ter a firmeza de apertar o botão no momento certo ou não consegue mais se abaixar num dia de sol para fotografar as coisas mais simples. A forma como meu joelho doía depois de ter ficado flexionado por meros dez minutos me fez temer pelo meu futuro. Talvez começar a caminhar ou correr pela orla da praia fosse uma boa ideia afinal... Sempre que eu tentava, a corrida se transformava me uma sessão de fotos do mar, dos banhistas ou até mesmo de algo mais conceitual como uma garrafa de água enterrada pela metade na areia.

Soltei a câmera e a deixei cair até ser travada no ar pela fita que a prendia ao redor do meu pescoço, aproveitei que minhas mãos estavam livres e penteei os cabelos com os dedos. Os fios, que já haviam começado a ficar grisalhos, haviam se embaraçado e caído sobre meu rosto por conta do vento. Era melhor eu me apressar, tinha que chegar no píer antes do pôr do sol, esse tinha sido meu objetivo ao viajar para um lugar tão longe e tão frio. Pessoalmente, sempre preferi o sol escaldante e o gosto salgado que a água do mar deixava na pele quando passava tempo demais na varanda do meu apartamento.

Enquanto caminhava pela calçada movimentada, pude vê-la. Parada ali no beco à minha esquerda, tocando o muro como se esperasse algo dele que não fosse continuar parado ali oferecendo-lhe apoio. O vento batia em seus cabelos acobreados, fazendo com que seus cachos balançassem ao redor de seu rosto de perfil como se fossem a majestosa juba de um leão da savana. O contraste dos fios com o ambiente cinzento e urbano ao seu redor tocou minha alma de artista, minha percepção aguçada já havia idealizado e enquadrado a foto antes mesmo de eu conseguir alcançar a câmera que pendia na altura do meu estômago e posicioná-la.

Olhei pelo visor, a imagem perfeita para compensar o fiasco que havia sido minha ultima foto. A imagem perfeita para apagar a visão de fotógrafo mediocre que eu vinha tendo de mim mesmo...

No milésimo de segundo em que pressionei o botão com firmeza e decisão, senti os olhos da jovem se chocarem contra os meus. A seriedade de seu olhar foi gravado pelas lentes, transformando a fotografia suave e distante em algo muito mais pessoal.

Passei a mão pela minha barba mal feita, constrangido por ter sido pego. Ela poderia ter ideias erradas sobre o que eu estava fazendo, até na policia eu já havia parado por conta desse meu mau hábito de fotografar estranhos... Não podia ir parar em uma novamente, ia acabar me atrasando para a fotografia do pôr do sol que há tanto vinha planejando. Apenas reencaixei a tampa da lente e caminhei confiante em direção a ela, que se mantinha ali, com a mão direita no muro mas com os olhos fixos em mim. Ela parecia aliviada conforme eu me aproximava, o que era uma reação estranha. Nunca imaginei que uma jovem bonita, em um beco, ficaria aliviada por um homem da minha idade se aproximar após ter tirado uma foto dela...

— Boa tarde... — disse num tom simpático e amigável, mas não o bastante para que pudesse ser confundido com um tom de segundas intenções. — Sinto muito por ter tirado uma foto sua sem lhe comunicar mas...

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⏰ Última atualização: Jul 30, 2016 ⏰

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