O Dia de Voltar [Conto]

Capítulo 4 - Ser livre

- Eu sinto. Pensei que você não viria.

- Matthew foi um bom homem.

- Sim, ele cuidou de você a sua maneira e eu agradeço por isso.

- Mas não consegui chorar sua morte - completou. - Tão seca estou, Alfie? Não me restou nada dentro?

- Não diga isso, Lucie... Cada um sofre a seu modo.

- Não chorei por papai, não chorei pela senhora Worcester, não chorei por meu marido. Não sou mais capaz de sentir, Alfie. Durante todos os dias do ano me sinto incapaz de sentir e quando chego aqui, em nosso dia, a felicidade é tão forte que já não me lembro se há motivos para chorar.

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- Você me daria algo?

- Algo?

- Sim, agora é a sua vez de me dar algo para me alegrar no dia 12.

- Peça.

- Me beije, Lucie.

Ele se aproximou silenciosamente e ela se jogou em seus braços. Tantos anos, tantos anos se passaram e as bocas ainda se conheciam, ele ainda lembrava-se do sabor dos lábios dela e ela ainda sabia as maneiras mais eficazes de deixá-lo de joelhos, rendido diante do prazer e do amor que combatiam em seu interior.

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- Ethan está casado e eu não consigo ser agradável com sua esposa - Lucie contou.

As rugas já tinham lugar cativo ao redor de seus olhos, os cabelos já estavam brancos, inclusive sua boca se tornara rigida, mas para ele ainda era a mais bela das damas.

- Ela é uma moça ruim? - perguntou esforçando-se para desviar os olhos da beleza madura de Lucie.

- Não. Anneliese não é ruim, mas não posso deixar de invejá-la - confessou com vergonha.

- Por que, Lucie?

- Ela lutou para casar-se com o homem que ama, lutou de um jeito que eu nunca fui capaz de fazer.

- Há muita diferença. Está moça estava apaixonada por um Duque e você estava apaixonada pelo mordomo da casa de sua família.

- Acha que a ela teria importado? Acha que a mim isso importava? Para mim você é o meu Duque, assim como para ela não haveria distinção se Ethan fosse o mordomo. A invejo, pois bateu o pé e disse ao mundo que não abriria mão de viver sua história de amor.

- É passado, Lucie.

- Pode ser o futuro, Alfie, basta que se case comigo.

- Você enlouqueceu?

- Case-se comigo e me faça deixar de invejar o amor dos outros enquanto vivo o meu.

- Eu ainda sou o mordomo.

- E eu ainda o amo.

- Não. Não penso deixar que você destrua sua vida e seu bom nome. Tudo que lhe disse naquele dia a quase quarenta anos atrás continua a valer.

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- Abrace-me, Alfie.

Ele a abraçou e enquanto a tinha em seus braços deixou que toda sua coragem aflorasse.

- Faça amor comigo, apenas uma vez - pediu em voz tão baixa que ela mal escutou.

Lucie ergueu os olhos e fitou o rosto do homem que amava. Alfie já não era um garoto, era um senhor e ela uma senhora, mas o amor que os unia ainda a fazia sentir-se jovem e feliz. Com a imprudência típica dos adolescentes ela assentiu e ele a puxou para um beijo apaixonado.

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- Você não pode estar falando sério, está doente, Lucie, não pode viajar para a propriedade de seu irmão. - Anneliese tentou ser a voz da razão, mas sua sogra continuou a insistir.

- Preciso ir.

- Mamãe, não se atreva a levantar-se desta cama, a senhora já não é uma jovenzinha. - Brandon segurou os ombros da mãe e a deitou novamente nas almofadas. O médico acabara de sair e dissera que Lucie não estava nada bem.

- Ora, Brandon, mencionar a idade de uma dama é uma insolência sem limites, atroz até para você que é o rei da vulgaridade.

- Não citei números. - O rapaz defendeu-se.

- Me sentiria menos humilhada se tivesse citado.

Brandon riu, ele era o único que achava graça nas espetadas de Lucie.

- Apenas deite-se e descanse, sim? Prometo que no ano que vem a senhora poderá ir para esse seu misterioso compromisso anual.

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- E onde está este homem? - perguntou Anneliese.

Lucie acabara de lhe contar a história e a nora estava estupefata.

- Não sei, não entendo porque ele não veio.

As duas esperaram por horas, mas Alfie não apareceu. Ele nunca mais apareceria.

Lucie chorou, pela primeira vez desde a morte de sua mãe, ela chorou ao perder alguém. Alfie era seu amante e seu amor, ao perdê-lo ela entendeu o que se sentia quando lhe arrancavam um pedaço. O que a confortava era saber que tivera Alfie por um dia a cada ano e teria as lembranças para sempre.