Marina mudava de posição, mudava de canal, mudava de penteado, mas não conseguia livrar-se da preocupação. Começara a pensar que Diogo era mesmo de mau caráter, que se tinha aproveitado dela para conseguir este plano e livrar-se da prisão.
Algum tempo depois a campaínha tocou. Marina ficou intrigada. Levantou-se, ajeitou o pijama, para não parecer que acabara de acordar, e foi abrir a porta.
- O que é que estás aqui a fazer? Como é que descobriste onde eu vivo? - perguntou espantada.
Ele entrou pela porta, sem pedir licensa, e fechou-a.
- Isso não interessa, o que interessa é que estou aqui! - exclamou ele.
- Não! - gritou ela. Devias estar na prisão. Não acredito que fugiste aos policias.
Diogo pediu para que falasse mais baixo.
- Mas eu não fugi porque não queria ir para a prisão, mas sim porque não ia aguentar tanto tempo sem te ver! - disse.
Marina levou as mão á cabeça.
- Ai não! Isto não me está a acontecer! - exclamou.
Diogo encostou-se á porta.
- Preciso que me deixes ficar aqui. - pediu ele.
Marina recusou-se. Explicou que isso era contra os príncipios dela, e que se a policia descobrisse poria em causa tudo, incluíndo o seu emprego. Diogo compreendeu, e saiu pela porta. Porém, Marina não o deixou sair do edificio. Em vez, chamou-o, e convidou-o a entrar de novo. Não queria que ele fosse apanhado, mesmo tendo a noção que estava a cometer uma loucura.
- Não podes ficar aqui porque, o meu marido Luis ia acabar por perceber que tu és o gajo que anda a ser procurado. Estás no telejornal, Diogo!
Diogo ficou em choque.
- Não há nenhum apartamento por alugar neste prédio?
Marina sentou-se. Tinha a cabeça num torbilhão de ideias.
- Tens as águas fortadas lá em cima. Mas, Diogo, não te podes esconder para sempre. Mais tarde, ou mais cedo, vão te apanhar!
- Mas enquanto não me apanham, eu posso estar contigo. Ouve, eu sei que isto é louco, mas...o que é que eu tenho a perder? A minha vida está perdida, de qualquer das maneiras. Ao menos, quero fazer de tudo para estar com a pessoa de quem eu mais gosto.
Marina esfregou a cara.
- E o dinheiro? Como é que vais pagar? Como é que vais viver, sem poder saír á rua?
Diogo mostrou-lhe muitos maços de notas, que ele trazia numa mala.
- Deve chegar para uns meses.
- Onde é que arranjaste isso? - perguntou Marina, surpreendida.
- Pedi emprestado a um amigo meu...
Marina bateu com a mão na testa, escorregando depois pela cara.
- Se tens um amigo que te empresta esse dinheiro, não tens um amigo que te empreste alojamento?
Diogo abanou a cabeça.
- Não me posso arriscar a andar muito pela rua. E quero estar perto de ti.
Marina achava aquela situação absurda, mas respirou fundo e disse:
- Eu vou telefonar agora para o senhor que arrenda os apartamentos.
E assim o fez.
- Boa tarde, senhor Carlos. Como está? Olhe, estou a ligar-lhe por uma urgêcia. Queria arrendar as águas fortadas do prédio "D.Filomena", o mais rápido possivel. É possivel?
O homem nem sabia o que dizer.
- D.Marina, há muitos papéis por preencher...
- E consegue tratar disso hoje? - perguntou ela, apressadamente.
- Hoje não consigo, D.Marina. Queira desculp...
- Por favor, senhor Carlos! Perciso mesmo! - interrompeu Marina.
- Marina, para que fique legal, não consigo fazer isso hoje!
Marina suspirou.
- É para si? - perguntou.
- É para um amigo que ficou sem casa. - explicou.
- Olhe D.Marina, só lhe vou fazer isto porque confio em si. Eu vou aí entregar-lhe as chaves, e, enquanto não fica legal, eu deixo o seu amigo ficar aí. Depois começa a pagar a renda e regularizamos a situação.
Marina deu um salto de alegria.
- Muito obrigado Sr.Carlos, nem tenho palavras para lhe agradecer.
O senhor combinou que ligaria a Marina quando estivesse á porta do edifício, para ela ir buscar as chaves.
Ao abrirem o apartamento, notaram que estava práticamente vazio, por isso Marina emprestou a Diogo um saco cama, e alguns produtos de higiéne, assim como encheu uma pequena dispensa com snacks.
- É o máximo que posso fazer para não te entregar as autoridades. - disse, muito seria.
Diogo passou a mão pela cara.
- Eu agi por impulso. Secalhar se fosse agora, tinha-me deixado ir no carro.
- Era o que devias ter feito. - concordou Marina.
Diogo sentou-se numa banca da cozinha.
- Marina, quero que respondas sinceramente. Se eu fosse embora, não ias sentir nenhuma falta de mim?
Marina esfregou o olho.
- Ó Diogo, eu ia acabar por seguir em frente. Eu tenho uma casa, um emprego, um namorado, família, prioridades. Enfim, tenho muitos motivos para...seguir em frente... - disse Marina.
Diogo abanou a cabeça repetidamente.
- Tens razão. Eu só venho destabilizar, é verdade.
Diogo estava desiludido e desmotivado com ele mesmo. Se fosse agora, jamais teria saído daquele carro. O problema é que ele amava verdadeiramente Marina.
- E o teu marido?
- Trabalho. - explicou ela.
Diogo assimilou. Fez-se um grande silêncio naquela casa vazia.
- Eu estou completamente fodido. - disse ele, desesperando.
Marina aproximou-se.
- Eu não tenho culpa! Tu cometeste um crime, e devias pagar por ele. Diogo, sabes que és especial para mim, mas, já viste a confusão, o crime, onde me estás a meter? - perguntou, irritada.
- Eu sei, desculpa, tu não mereces.
- Não é isso, Diogo. O problema é que tu não queres ser só meu amigo, queres mais do que isso, e eu não quero nada disso contigo porque não quero trair o meu namorado. Já o fiz, e senti-me que nem lixo.
Diogo fechou os olhos, pensando em tudo ao mesmo tempo.
- Eu quando saí daquele carro, eu não me lembrei das responsabilidades e prioridades que tinhas. Eu só pensava em estar contigo, porque eu gosto mesmo de ti, como... como nunca gostei de alguém! É fascinante, é viciante, é...
Marina corou inevitavelmente.
- Nem sei o que é que hei de te dizer! - exclamou ela, tentando não sorrir.
Diogo mantinha a sua cara tristonha, e os seus olhos mortiços.
- O Luís deve estar a chegar, entretanto. É melhor eu descer. - disse ela, caminhando para a porta.
Diogo acompanhou-a.
- Já agora, onde sabias onde eu vivo? - perguntou ela, intrigada.
- Já sabia antes de ter fugido. - contou.
Marina ficou surpreendida.
- Okay, isso é creepy. - brincou.
Diogo abriu os braços no ar.
- Obrigada, vai um abraço? - perguntou.
Marina fechou os seus braços, e virou costas, abrindo a porta.
- Não quero dar-te nenhum abraço.
- Um abraço de amigo! - acrescentou.
Marina abraçou-o.
- És um idiota, sabias?
Diogo riu-se.
- Se tu o dizes...
Marina tentou largá-lo, mas Diogo continuava a envolvê-la nos seus braços bonitos e musculados.
- Já chega, Diogo! - dizia, enquanto se tentava largar.
No entanto, Marina gostava daquele abraço, e tentára-se controlar para não deixar que as situações passassem os limites.
Diogo largou-a e ela foi apressada até ao andar de baixo, onde vivia.
Luís ainda não tinha chegado, por isso, Marina aproveitou e foi preparando o jantar. Fez uma pequena lasanha, partiu-a em 4, e colocou uma das partes num recipiente. Tambén colocou de parte um sumo de pacote e uma peça de fruta. Foi rapidamente levar a refeição a Diogo.
- Voltaste? - perguntou, mirando-a de alto a baixo.
- Ia-te deixar á fome?
Diogo puxou-a para dentro e fechou a porta.
- Não era preciso, eu ficava bem, pelo menos até amanhã. - disse ele.
Marina entregou-lhe a comida.
- Claro, e amanhã quando cá viesse aparecias tu desmaiado...
Diogo mandou uma gargalhada.
- Ao menos livravas-te de mim!
Marina censurou-o com o olhar.
- Não sejas parvinho...!
Diogo foi colocar a comida em cima das bancas da cozinha.
- O Luís ainda não chegou? - perguntou ele.
Marina abanou a cabeça.
- Hm... mas afinal ele trabalha á noite ou de dia?
Marina explicou:
- Há dias em que trabalha de noite e outros durante o dia.
Diogo sorriu.
- Então passas as noites sozinhas? - perguntou, levantando as sobrancelhas.
Marina revirou os olhos.
- Vamos ter tempo, então...
Marina virou as costas.
- ...para dormir, é claro! - completou, na brincadeira.
Marina saiu, desceu as escadas e foi para casa, esperar Luís.