● II - Eu, uma qualquer. ●

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Assim que recuperei o fôlego que perdera, tentando encher os pulmões com o rastro de perfume francês que Alex deixara no ar ao sair e engoli meus suspiros, causados pelas milhares de idéias pervertidas que aquele homem proporcionava em contato com minha mente fértil, segui pelo corredor, até o banheiro, conforme estava decidida a fazer no momento em que esbarrei com ele.

Parei em frente ao enorme balcão da pia, com várias cubas, e soltei minha bolsa com os cadernos no tampo de granito preto. Olhei meu rosto no espelho por alguns segundos, na tentativa de analisar o que Alex teria pensado à meu respeito e o prognóstico não me parecia favorável. Eu estava de fato horrível e com certeza ele não poderia ter tido uma boa impressão.

Apesar de ter um rosto bem feito, com traços harmônicos e simétricos, eu não deixava de estar parecendo uma mendiga. Meus cabelos, tingidos de preto azulado, contrastavam sobremaneira com minha pele que naquele momento parecia mais branca do que de costume.

- É sempre no dia errado que as pessoas certas insistem em aparecer. Justo hoje? Precisava ser quando eu pareço um espantalho? Que vergonha! E com a sorte que eu tenho ele deve ter namorada ou ser gay... - Eu resmungava, furiosa com a situação. -

- Ah, aí está a nova garota propaganda da "Fundación Hector Mendoza" a Miss Medicina. Eu estava procurando por você.

- Hum, que espirituosa!
Guarde suas gracinhas para quem se interesse Joana.- Falei, erguendo a sobrancelha. -

- O que você estava falando sozinha quando eu entrei no banheiro?

Assim que Joana tocou no assunto, me fazendo lembrar do que acabara de acontecer, foi como se tivessem acendido uma fogueira dentro de mim e um calor intenso percorreu meu corpo todo, me fazendo sentir calafrios.

- Menina você não sabe o que aconteceu! Acabei de conhecer o cara mais lindo que eu já vi na vida. Acho que estou meio que, sei lá, apaixonada...

- Como assim?! Me conte mais sobre isso! - Falou Joana, empolgada, mas ao mesmo tempo com uma ruga de preocupação estampada na testa, percebendo que eu estava radiante.

- Eu havia saído da prova de anatomia, na qual, por falar nisso, fui reprovada.

- Reprovada??? Meu Deus isso é péssimo. - Me interrompeu, chocada.-

- Agora já não penso que seja tão ruim assim. Bem, mas voltando... "eu saía decepcionada comigo mesma pelo fracasso na prova oral, quando de repente, me bati violentamente contra o que por uma fração de segundos pensei ter sido uma parede pintada com perfume. Ao abrir os olhos, perdi a fala e quase a consciência ao ver que estava dentro dos braços do que se assemelhava com a aparição de um Deus Africano, que teve efeito totalmente afrodisíaco em meus sentidos." - Relatei, revivendo prazerosamente cada troca de olhar entre nós e lembrando da sensação de estar prestes à incendiar enquanto estava entre aqueles braços enormes. - A parte boa, é que ele transferiu a matrícula dele para cá e vai estudar aqui no próximo semestre. E adivinha... no segundo ano! Será meu colega! - Completei, dando ênfase à idéia de felicidade que estranhamente sentia por ter sido reprovada.- E a parte péssima, é que ele me viu vestida desse jeito. - Concluí, chateada com minha má aparência em um momento tão especial. -

- É mais preocupante do que eu pensava. Em primeiro lugar, você está me dizendo que está, supostamente apaixonada por um cara que pelas características se trata de Alex Roth.

- Sim!!! É esse mesmo o nome dele! - Senti meu coração saltar do peito ao escutar aquele nome.- Você o conhece? - Perguntei sorrindo, com uma ansiedade infantil. -

- Pelo jeito só você que não conhece. É quase uma celebridade. Ele é filho de um senador com uma socialite, herdeira de uma das famílias mais influentes do país e namora a Diamela Hernandez...

- Não! Não é possível. A modelo?

- Sim. Ela mesmo. Ou seja, não é querer ser estraga prazer mas mesmo você sendo linda, é bem difícil competir com ela. Eu não entraria nessa. Em segundo lugar, me diga que você não está feliz em ter reprovado só para ficar perto de um cara que acabou de conhecer! E por último e pior, você lembra que não namora homens??? Que inclusive sua namorada, Antonela, está à sua espera nesse exato momento na lanchonete da faculdade?

- Verdade! Eu marquei de encontrá-la ao meio dia. Esqueci completamente.

- Bem preocupante! Pelo jeito esqueceu também de você mesma e de suas convicções ao conhecer esse cara. Típico de babacas apaixonadas, que aliás, nunca pensei que fizesse seu estilo.

- E não faz! - Afirmei, respirando profundamente, decidida a esquecer daquele momento patético em que houvera perdido o controle.

- Assim espero. Para o seu próprio bem.

- Obrigada amiga, por me trazer de volta à realidade. Eu devia estar sob efeito da forte emoção de ter reprovado em anatomia. Foi só uma carência momentânea. - Expliquei tensa,no entanto, era à mim mesma quem eu lutava por convencer.

- Tomara. E fique tranquila, não direi nada à ninguém. Agora vamos porque sua linda garota está aguardando você para almoçar. Come on baby!

- Eu sei. Confio em você! Vamos. - Respondi, simulando uma calma que já não me pertencia e carregando um medo do desconhecido que, somado ao descompasso que acometia meu coração ao pensar em Alex, fazia com que eu tivesse certeza de que algo dentro de mim havia se transformado naquela manhã.
Tratei de lavar rapidamente o rosto e ao secá-lo com a toalha de papel, gostaria de ter podido arrancar a cara de boba que passara a ilustrar minha fisionomia desde que o conhecera.

Joana me acompanhou até a lanchonete e ao chegarmos, vimos Antonela sentada sozinha, próximo à janela, pensativa. Ao ver-nos, ela levantou sorridente, puxando para o lado com uma das mãos os longos e brilhantes cabelos louros, enquanto vinha ao meu encontro. Nos abraçamos longamente, antes que ela beijasse minha boca, me sujando toda com o batom vermelho que eu tanto gostava que ela usasse.

O beijo fora diferente. Eu não sentira a urgência em beijá-la como sempre, tampouco sentia saudades, já que há quase uma semana não nos víamos, devido ao confinamento em que me coloquei para estudar. Sentia que algo em mim morrera. Mas o que me tiraria o sono, seria justamente o que nascera em seu lugar.

A Nora Que Os Pais Dele Jamais QuiseramOnde histórias criam vida. Descubra agora