Todos os dias nesse castelo eram iguais aos outros, nada de grande acontecia, mas isso mudaria com a chegada de Dimitri, noivo da minha irmã mais velha, Lúcia. Essa vai ser a primeira vez que conheceremos um dos monarcas dos 4 reinos, pessoalmente. Dimitri virá para conhecer Lúcia, também para a entrega dos presentes e para acharem que estão decidindo algo sobre o casamento arranjado deles. Eles são noivos desde que Lúcia tinha 5 anos e Dimitri 7. Na época do acordo nossos pais, os reis, foram até o reino de Luxor, reino de Dimitri para selar o contrato de casamento.
Lúcia não se incomodava em casar com um mero desconhecido, dizia que era parte de ser uma princesa, mas para mim aquilo não parecia correto.
Eu não estava feliz com minha vida, mas tinha mais liberdade que minha irmã, ela era treinada desde que nasceu para ser a rainha e a esposa perfeita, eu era obrigada a fazer todas as aulas de etiqueta e tudo que meu pai achasse que era necessário para formação de damas, mas eu também praticava esgrima com meus irmãos mais novos, além de ser uma ótima Amazona. Mesmo fazendo tudo isso nunca tive a aprovação do meu pai, ele parecia me odiar e boa parte do tempo ignorava minha existência.
- Vamos Elise, hora de nossos estudos. - A voz doce de Lúcia ecoou em meu quarto. - Hoje vamos aprender sobre os quatro reinos.
- Como você consegue ficar tão entusiasmada com tudo?
Lúcia sorriu e segurou minha mão.
- Eu só estou feliz. -Disse sorrindo.
- Feliz pela chegada do noivo que você nunca conheceu? - Indaguei olhando em seus olhos verdes.
- Elise, casar com Dimitri faz parte...
- De ser uma princesa. - A interrompi- Eu já sei disso.
- É minha obrigação com próxima rainha.
- Não é não, como rainha você deve tomar suas decisões.
- Você sabe que não é tão fácil, papai nunca iria admitir que fizesse isso.
- Eu sei, mas não é certo!
- Nem tudo nesse mundo é certo, El.Caminhamos lado a lado pelos enormes corredores, indo em direção a sala de estudos, olhando para Lúcia pude ver mais uma vez o quanto seu rosto era angelical, ela possuía os mesmos olhos de nossa mãe, olhos cor de esmeralda, seu cabelo sempre arrumado era loiro escuro e possuía cachos pesados nas pontas, que iam até a altura de seus quadris, suas bochechas coradas, um belo sorriso e maquiagem impecável. Ela era o pacote completo era linda, inteligente, culta e parecia mais princesa do que eu seria na vida, até mesmo a tiara que usava ficava melhor nela do em mim. Enquanto ela havia puxado para minha mãe, era a versão mais nova e sem as linhas de expressão de nossa mãe, eu tinha os traços do meu pai, meus cabelos eram da cor do carvão assim como os meus olhos, meu cabelo não possuía aqueles cachos semelhantes a Lúcia, eles eram lisos e iam até minha cintura.
A ironia era olhar no espelho e encontrar traços do meu pior inimigo em mim mesma. Ele era tão frio e só pensava no poder e ao me ver no espelho sentia a mesma coisa em mim.
Deixei meus pensamentos de lado quando chegamos em frente a sala e meus irmãos já estavam nos esperando sentados nas cadeiras douradas envolta da mesa redonda de carvalho, totalmente em silêncio e muito longe da inquietude habitual deles, estavam sonolentos ainda.
Kaylon, Aley e Drian eram trigêmeos, todos eles possuíam os traços da nossa mãe, apenas o nariz e o formato da boca de nosso pai. Eles são muito parecidos, apenas com pequenas diferenças nas cores dos olhos, Aley tinha os olhos azuis então usava uma pulseira azul no braço, Kaylon tinha os olhos castanhos claros, então usava uma pulseira marrom e Drian também tinha olhos azuis, mas usava uma pulseira vermelha para que não fossem confundidos.
- Atrasada novamente?
- Esqueci do horário, me desculpe senhora, Martin. Abaixei a cabeça como um pedido de desculpas.
- Vamos logo, entrem.
Depois de suas palavras secas entrei junto a Lúcia e nos sentamos ao lado de Edsel meu irmão mais novo e a versão masculina de nossa mãe, que estava no chão brincando.
- Hoje vou contar a história dos quatro reinos e como eles se dividiram assim. - Disse a senhora Martin se levantando de sua mesa com um livro em suas mãos- A duzentos anos atrás no ano de 2020 o mundo entrou em uma guerra muito grande, existiam países que eram como os nossos estados e cada um deles estava em conflito, esse conflito durou cerca de cinquenta anos e era movido por simples sede de poder.
Acho então que meu pai deve ter se inspirado dali para querer tanto poder.
- Elise? Está prestando atenção?
- Sim, senhora.
Ela me olhou desconfiada.
- Essa luta foi sangrenta, foram usadas armas nucleares e por pouco nosso mundo foi destruído, mas então aconteceu uma reviravolta, as quatro famílias mais ricas se juntaram e resolveram dar fim a essa guerra, as famílias Ivanon, Vernez, Alcatre e sua família os Delaner dividiram o mundo em quatro reinos, Luxor, Zinion, Cadir e o reino de vocês Landri, o povo havia se enganado muito e não conseguiam por si próprios escolher um governante que não fosse corrupto. Eles começaram juntado suas forças e reunindo os exércitos que já estavam em batalha, eles não eram contra o povo e sim contra os governantes que declaravam a guerra. Vendo isso o povo se uniu a essas quatro famílias e venceram esses governantes assim tomando o poder.
- E o mundo havia sofrido muito com as guerras? Como resolveram isso?Indaguei
- Ótima pergunta, o mundo havia tido muita devastação e os quatro reis e rainhas entraram em acordo que toda a degradação deveria ter fim. As indústrias e fábricas foram fechadas, árvores foram plantadas, os rios foram limpos e esse processo durou por muito tempo, mas como sabem agora tudo já está aberto novamente, mas sem que haja poluição.
- A aceitação dos reinos foi sempre pacífica? Inteligente como sempre indagou Lúcia.
- Não, sempre tiveram os que eram contra esses reinos e os números estão aumentando com o passar do tempo, mas cabe a você reverter essas revoltas. -Ela sorriu- Lúcia como rainha vai poder mudar isso, ela pode ser a diferença e a aceitação do povo a essa monarquia.
- Farei tudo que for preciso para o meu povo!
- Sábias palavras, Lúcia. - Disse a voz de meu pai entrando na sala - Palavras de uma rainha.
Lúcia correu até ele e o abraçou.
- Papai, não sabia que já tinha retornado.
- Majestade.- A senhora Martin reverenciou meu pai.
- Acabo de retornar, deixe me ver como está a futura rainha.
Ele segurou o rosto de Lúcia em suas mãos e encarou seus olhos.
- Linda como sempre!
- Obrigado, papai.
- Agora deixe me ver os meus filhos, venham aqui Kaylon, Aley, Drian e o pequeno Edsel.
Ele fez aquilo de propósito, dizer o nome deles era como dizer que apenas eles eram seus filhos e me reduzir a mobília da sala.
Aquela cena comovente onde os filhos abraçam o pai que havia passado semanas distante deveria ter me causado algum sentimento comovente, mas só me causou sono.
Os meninos sonolentos e até mesmo o pequeno Edsel, que agora estava quase dormindo enquanto brincava com uma das criadas no tapete correu até meu pai.
Como de costume ele ignorou a minha presença, chamou os outros para tomar o café da manhã enquanto eu fiquei na sala procurando na estante de livros algum que eu já não tivesse lido.
- Vejo que não ocorreu nenhuma melhora na relação de seu pai com você.
- Senhora Martin, não existe relação entre meu pai e eu.
- Não consigo compreender o motivo pelo qual seu pai sente tanta repulsa por você, por mais que você seja um pouco distraída é muito inteligente, eu prestei atenção em você. - A senhora Martin falava pausadamente. - Dizem que você cavalga melhor que seus irmãos e com uma espada pode derrotar até mesmo seu pai.
- Não se trata disso, acho que ele ainda nutre ressentimento pela quase morte de minha mãe no meu nascimento.
- A rainha quase morreu no parto?
- Sim, ela teve complicações e o médico mandou que escolhesse qual das duas salvar, minha mãe ordenou que me salvasse, mas meu pai disse que já tinham uma filha e que no futuro poderiam ter outra. - Enquanto falava a senhora Martin me olhava comovida. - Por sorte o médico conseguiu estabilizar minha mãe e me tirar com vida, mas meu pai ainda me odeia, por ele eu nem teria nascido.
- Sinto muito, Elise.
- Já não me importo mais com isso, esse aqui. - Peguei um livro de mitologia que havia lido apenas uma vez.- Vou levar esse hoje.
- Boa leitura!
- Elise? Indagou uma voz atrás de mim.
Me virei e encontrei o rosto pálido e quadrado de Lucian, seus dedos magros e grandes eram os que haviam me ensinado tanto a tocar piano.
- Lucian, já está na hora?
- Sim, sua irmã vai te encontrar na sala de música logo, seu pai irá assistir a aula de hoje.
- Ah, meu dia ainda pode piorar.- Respirei fundo.- Até mais tarde senhora Martin.Caminhei atrás de Lucian, ele tinha apenas 30 anos, mas já andava como um idoso.
- Você sabe o quanto foi injusto eu ter que aprender a tocar piano.
- Mais uma vez com esse assunto. - Lucian soltou o ar. - Seu pai queria que sua irmã aprendesse violino e eu achei que você tinha o dom para o piano e eu acertei, você é muito habilidosa e toca lindamente, se contente com isso.
- Tudo bem, Lucian!
Lucian abriu passagem pela porta e pude ver que além de meu pai minha mãe se encontrava na sala repleta de instrumentos musicais e pinturas de famosos artistas. Ao lado dos meus pais estavam meus irmãos em torno dos dois. Sorri para minha mãe e ela retribuiu com um sorriso maior e acenou para mim.
Pelo visto o café da manhã teria que esperar.
Caminhei até o piano preto e branco e me sentei, respirei fundo e olhei para Lúcia que já estava pronta, acenei com a cabeça e fechei meus olhos deslizando meus dedos pelas teclas de Marfim, o som era completado pelo som do violino de Lúcia.
Minha mente se perdia mais a cada nota que tocava.
Abri os olhos quando toquei a última nota e vi minha mãe com lágrimas nos olhos.
- Isso foi lindo. - Disse ela enquanto todos inclusive Lucian e meu pai batiam palmas.
- Foi lindo, Lúcia.
- Derrick, as duas foram lindas. - Disse minha mãe querendo acabar com aquela situação com meu pai e repreender suas palavras - Minhas duas meninas.
Lúcia sorriu.
Enquanto Lúcia abraçava nosso pai e ele prestava atenção em cada palavra que ela pronunciava, fiquei encarando as teclas mais uma vez.
O toque da mão suave de minha mãe me fez encarar seus olhos esmeraldas.
- Não ligue para aquilo.
- Sabe que não me importo mais com isso, mamãe.
- Não é porque não se importa que pare de doer.
- Estou bem, vá ficar com os meninos, vou para meus aposentos ler.
- Tudo bem, Elise.
Repousando um beijo em minha testa ela se juntou a Lúcia e a meu pai que nem notaram minha saída.
Caminhei sozinha pelos corredores, os olhares dos guardas caíram sobre mim, seus grandes músculos e armas me deixavam desconfortável. Apenas os guardas reais e alguns poucos escolhidos nos Estados possuíam armas.
Sempre quis conhecer o mundo fora daquelas paredes, saber como era lá fora, os guardas me reverenciaram e eu continuei em direção ao jardim.Passei o resto da manhã lendo sentada em um galho de uma árvore no jardim, enquanto meus cabelos dançavam com a brisa e minha pele bronzeada brilhava em dourado.
Olhando ao longe tentei vislumbrar por de trás dos muros, mas eles eram altos demais, longes demais, inatingíveis demais, fiquei imaginando como seria do lado de fora, como seriam os reinos, mas meus pensamentos foram interrompidos quando ouvi a voz de meus irmãos.
- Elise?
- Elise?
- El? Ouvi a voz de Lúcia e de meus irmãos.
- Vou descer em um minuto.
- Nosso almoço está na mesa e papai também.
Me lancei de cima de um galho ao outro e desse outro para o chão.
- Um dia você vai acabar se machucando. Advertiu Lúcia.
- Até esse dia chegar vou continuar pulando dessa forma.
- Podemos ir, estou com fome. Disse Aley.
- Podemos, quem chegar por último perde a sobremesa. Gritou Lúcia.
Me coloquei a correr, passando por todos eles, mas chegando perto da mesa esbarrei em alguém, era meu pai.
Seus olhos me encararam com fúria, mas a chegada de Lúcia fez com que ele fosse até ela me deixando de lado.
Me sentei ao lado da ponta da mesa onde minha mãe sempre ficava, a mesa de madeira clara tinha lugar para 32 pessoas, então ficar na ponta contrária à de meu pai me deixava a uma distância ótima dele.
O aroma da comida se espalhou por todo o salão.
- Temos que brindar Janessa.
- Brindar a quê meu querido?
- Brindar ao casamento de Lúcia e Dimitri e a sua chegada em breve.
Todos ergueram as taças e brindaram a Lúcia e Dimitri, mas eu não achava aquilo algo bom, não ia brindar a infelicidade da minha irmã, por isso me mantive comendo em silêncio e sentindo o olhar de meu pai sobre mim.
![](https://img.wattpad.com/cover/80067558-288-k18168.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Sucessora
FantasyEla só queria conhecer o mundo, conhecer o mundo depois das enormes barreiras do castelo, não pensava em se apaixonar ou na mera possibilidade de assumir o trono. Ninguém esperava nada dela, inclusive ela mesma. Sua irmã mais velha e próxima rainha...