Capítulo 3: A sintonia

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Não consegui dormir, esperei até que o castelo se encontrasse em absoluto silêncio para poder sair. Vesti por cima da camisola um roupão.
Abri a porta e olhei para todos os lados os guardas deviam estar mudando de turno, era o horário perfeito.
Desci as escadas devagar, meus pés descalços tocavam os degraus frios de pedra sem causar nenhum ruído.
Me escondi atrás de uma pilastra quando vi os guardas, esperei que eles passassem e saí indo em direção a sala de música, fui um pouco mais rápido e nenhum guarda se encontrava em posto na porta da sala entrei depressa e vasculhei uma pequeno armário de madeira procurando papel e caneta.
Ao encontrar abri as cortinas vermelhas podendo assim vislumbrar o brilho da lua cheia que iluminava todo o ambiente fui até o canto da sala e peguei o vaso com os pedaços da partitura e os virei no chão, deitei meu corpo e comecei a juntar os pequenos pedaços para reescrever a partitura. Olhei para o relógio e já passavam de duas da manhã, meu olhos já não conseguiam identificar qual eram as notas, assim cansados se fecharam lentamente após piscadas vagarosas resultando em acabar adormecendo sobre o tapete bege e felpudo da sala de música sobre os pedaços de partitura que eu tentava repassar para o papel.

- Princesa?
- Princesa, Elise?
- Olá, já é de manhã? Indaguei sonolenta.
- Sim, princesa.
Pisquei várias vezes até conseguir visualizar a figura de um imponente guarda que tocava meu ombro.
Me levantei depressa e olhei o relógio exatamente 07:50, apenas 10 minutos antes que todos estivessem na mesa para tomar o café.
Juntei tudo conforme pude e coloquei dentro do vaso.
- Por favor, não comunique nada do que estava acontecendo aqui.
- Não direi nada, princesa.
- Obrigada!
Comecei a correr pelos corredores meus pés batiam fortes contra o chão, estava ofegante quando abri a porta do quarto e me deparei com o horário no relógio era 07:30, o relógio do salão de músicas havia me enganado, dessa vez não chegaria atrasada seria pontual e estaria perfeitamente arrumada.
Fui até o banheiro e abri a torneira para encher a banheira, fui até meu quarto de vestidos e escolhi um vestido, as mangas longas e de cor acinzentada eram cobertas por borboletas, a saía do vestido era coberta por flores pintadas e outras bordadas a mão, além de um corpete de cinza metálico com uma camada de tule transparente que ia até o pescoço onde fazia um pequeno colar de borboletas até o decote do vestido.
Entrei no banho e saí depressa, vesti aquele belo vestido que modéstia a parte me caiu muito bem e fui até minha penteadeira, não era muito fã de maquiagem, mas tinha que ficar o melhor que pudesse, com um delineado pequeno, um batom coral e um pouco de blush pareci mais viva.
Em meu cabelo fiz uma trança embutida de lado onde coloquei alguns pontos de luz e a minha tiara, deixei umas pequenas mechas de cabelo caindo sobre o rosto, borrifei um pouco do meu perfume de cerejeiras cujo cheiro era tão doce quanto a fruta.
Me surpreendi com meu próprio reflexo, o resultado no espelho era melhor do que eu tinha pensado.
Calcei um sapato fechado que possuía um salto não muito alto e cujo o vestido cobria por completo.
Já estava na hora de ir, desci as escadas sem dificuldade e ao chegar à mesa quase todos haviam chegado, faltavam alguns representantes de Luxor, mas até mesmo Vladmir estava na mesa no mesmo lugar de antes.
Achei que algo estava errado comigo quando passei e os olhares me seguiam, até mesmo Lúcia me olhava surpresa.
- Bom dia! Disse enquanto reverenciava e passava por todos.
- Bom... bom dia. Disse alguém cuja voz eu não sabia a quem pertencia.
Caminhei até a cadeira ao lado de Vladmir cuja velocidade para puxar a cadeira para mim foi surpreendente.
Olhei para meu pai e até mesmo ele parecia surpreso.
- Você está linda, Elise!
Sorri como agradecimento a Lúcia.
- Concordo com sua irmã, está muito bela.
- Obrigada, você é muito gentil!
Após alguns segundos de silêncio os lugares vagos foram ocupados.
A comida foi trazida enchendo a mesa, bolos, doces, tortas, sucos, pães, queijos e tudo que possa imaginar para o café estava sobre ela.
Sentado ao meu lado estava um senhor que tinha por volta de 50 anos comia com vontade um pedaço de torta de limão.
- Você é mais parecida com o seu pai do que seus irmãos.
- Sim, puxei os traços de meu pai e Lúcia e meus irmãos da minha mãe.
Tocar naquele assunto me fazia enjoar.
- Elise, por quê não mostra para nosso convidado o castelo? Indagou meu pai, mudando o assunto.
- Você gostaria? Indaguei calmamente e feliz pelo assunto ter encerrado.
- Sim, após o café da manhã seria ótimo.
Enchi um xícara com um pouco de chá enquanto todos conversavam animados na mesa.
Notei que Lúcia conversava com um dos representantes e a todo momento olhava pra mim depois para ele e sorria.
- Vai comer mais alguma coisa princesa Elise? Indagou Vladmir limpando os lábios com um guardanapo.
- Não, já estou satisfeita.
- Me acompanha?
- Com prazer.
Todos mantinham os olhares sobre nós quando saíamos da mesa, Vladmir sorria olhando para trás.
- Você está surpreendente! Disse baixo perto do meu ouvido quando estávamos cruzando o corredor da ala leste, que assumia um tom de dourado com a luminosidade do sol.
- Agradeço... Posso te fazer uma pergunta?
- Acaba de fazer uma. Disse sorrindo.
- Como é o mundo lá fora?
Ele me olhou curioso.
- É lindo.
- O mar realmente é azul? Indaguei ansiosa, como uma criança pequena.
- Você nunca viu o mar?
Neguei.
- É maravilhosamente azul, a água faz ondas e areia é macia.
- Sério? Eu queria tanto conhecer lá fora. Caminhei e olhei pela janela vendo além dos murros.
Vladmir se aproximou e tocou meu ombro.
- Eu queria conhecer todos os quatro reinos, queria viajar por todo o mundo e conhecer tudo que se pode conhecer, tudo que leio nos livros.
- Seus olhos brilham quando fala disso, é lindo.
Sorri sem graça.
- Como é lá onde você vive?
- É gelado fora do castelo, mas é um lugar lindo, eu gosto de ver o por do sol na torre do castelo é uma das visões que mais gosto.
- Você já viajou muito?
- Já, eu viajo sempre com o pai do príncipe, sou como um filho pra ele.
- Você já foi para onde?
- Para os quatro reinos.
Ele deveria saber tantas coisas que eu ficaria dias fazendo perguntas.
- Quantos anos você tem, princesa?
- Dezoito, sou dois anos mais nova que a princesa Lúcia, mas e você quantos anos tem?
- Vinte e dois.
- Assim como o príncipe?
- Sim, engraçado não é mesmo?!
Sorri.
- O que você gosta de fazer aqui, já que não pode sair?
- Eu toco piano, leio meus livros no jardim e converso com Lúcia.
- Interessante, posso estar sendo indiscreto, mas algo me perturbou muito ontem. - Ele me encarou.- Aquela marca roxa em seu pulso e o estado de lágrimas que te encontrei, quem fez isso como você?
Engoli em seco.
- Ninguém, a marca roxa foi por eu ter dormido segurando meu pulso sem querer e as lágrimas foram por causa que eu rasguei uma partitura antiga em um momentos de raiva por não conseguir tocar.
- Está mentindo.
- Não estou.
- Eu vou descobrir a verdade, já que está escondendo. Disse ele com olhos determinados.
Um guarda passou por nós e Vladmir ficou em total silêncio.
- Eu queria muito saber como são as cidades, queria conhecer o povo. Perguntei mudando completamente de assunto.
- Você quer sair daqui?
- É o que mais quero, quem sabe um dia eu não saio, vai ser um sonho.
- Mas você quer ir agora?
Agora? Como?
- Agora?
- Sim, você não quer conhecer lá fora?
- Quero.- Disse entusiasmada, mas algo me veio na cabeça. Como sairíamos dali?. - Como vamos fazer isso?
- Ainda não pensei nisso, mas você vai ter que tirar essa roupa e sair mais discreta.
Corri até ele incrédula e feliz.
- Obrigada!
Ele afagou meu cabelo como se eu fosse uma criança pequena.
O príncipe não confiaria qualquer um para conhecer o reino e decidir se se casaria, o príncipe deve confiar nele, então ele não iria me machucar, pensei enquanto estava hesitando.
- Vou me trocar, volto logo.
- Me encontre aqui em vinte minutos.
Concordei correndo entusiasmada pelos corredores, estava tão distraída que acabei esbarrando em alguém.
- Por que está correndo assim? Indagou ela rindo.
- Lúcia, venha aqui. - Puxei-a para perto. - Eu vou sair do castelo.
- Está louca?
- Não, Vladmir vai me levar para o lado de fora.
- Ele vai te levar? Como?
- Ainda não sei, mas você quer vir junto?
- Não Elise, não quero atrapalhar e estando aqui posso te encobrir e caso algo dê errado eu posso lidar com o papai.
- Obrigada, irmã!
Ela me abraçou forte.
- Cuide-se e volte logo.
- Pode deixar.
Subi a escada correndo, abri a porta do quarto já tirando o vestido e caminhando até o quarto dos vestidos e busquei por algo simples, encontrei um vestido rosa que ia até minhas panturilhas, ele não tinha nenhum detalhe chamativo.
Soltei os cabelos tirando todos os pontos de luz e a tiara.
Coloquei uma sapatilha e desci novamente.
Eu estava tão animada, saltitando ao invés de andar.
Eu ia conhecer o mundo fora daqueles muros, o mundo que eu conhecia só pelos livros, eu enfim conheceria.

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