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Ele apenas corria.

A chuva ensopava sua blusa e caía em pingos gélidos que escorriam de seu cabelo e molhavam sua face. Ele não sentia a chuva, era como se ela não estivesse caindo. Apenas olhava para frente e corria, sua visão estava turva e ele gostaria de saber para onde estava indo. Não via um palmo à sua frente. A chuva da estação era grossa e gelada como a água de uma piscina durante o inverno.

Ele sacudiu os cabelos que haviam crescido em função de sua relutância em os cortar. Eles caíam em seus olhos e ofuscavam todo o resto. Como se a chuva já não tivesse feito isso. Seus joelhos tremiam. Ele temia uma queda, mas não se permitia parar, não queria parar. Ele havia chegado ao seu limite. Não conseguia enxergar para onde estava indo, apenas seguia em frente como se não houvesse um amanhã.

Porque talvez não houvesse.

Ele sentiu seus joelhos cedendo. Se deixou levar e caiu.

Não sentiu a queda; apenas sentiu a textura da areia, o cheiro de maresia e sua mente nublada, tudo vindo à tona e se entrelaçando em sua mente.

Ele apenas desejava que não tivesse uma câmera por perto. Não queria um motivo para voltar para casa, apesar de saber que a maknae line estaria atrás dele por toda a cidade. Ele não se permitiu pensar no dia seguinte, no suspiro seguinte, no momento seguinte. Ele se sentia sufocado. Todos aqueles anos tinham lhe dado a experiência de fingir, era uma coisa tão natural quanto respirar. Bastou um único toque para que tudo desmoronasse. Seu castelo de cartas cuidadosamente montado durante tantos anos estava caindo.

Todo aquele tempo, ele apenas aguentava tudo. Sempre que haviam câmeras, ele colocava um sorriso no rosto. Eles tinham chegado tão longe... chegaram a ganhar o mundo. Ele podia dizer que os últimos nove anos tinham valido à pena. Muito à pena. Mas assim como seu objetivo de alcançar o coração das pessoas, ele se sentia incrivelmente vazio. Era um mundo injusto. Ele depositava tudo em suas músicas, tudo o que passara, todas as coisas que gostaria que os outros soubessem.

Ele sabia que não poderia cantar para sempre. Sabia que um dia suas músicas seriam apenas um suspiro rachado na boca de alguém. Mas ele queria continuar, mesmo que não houvesse ninguém para o ouvir.

Nove anos. Mais de três mil dias. Ele estava vivendo seu sonho, mas conforme a vida seguia sentia tudo minguar. Por algum motivo, estava vazio por dentro. Talvez tivesse percebido quanto tempo passara e quanto tudo estava mudando quando Jin fora para o exército, dois anos antes. Talvez o hiatus do grupo tivesse lhe dado um tapa na cara, mas apesar de tudo os seis restantes ainda continuavam unidos.

Então chegou a vez de Yoongi. Ele deveria ter percebido o caminho que as coisas estavam tomando nesse momento. Ele sabia que não eram mais apenas garotos vivendo um sonho, mas sim adultos com responsabilidades.

Aquele momento de suas vidas no qual cantavam para emocionar estava mudando. Novos grupos e a pressão da empresa para qual trabalhavam. Eles precisavam ficar sempre em primeiro. A empresa não ligava para as morais, queria o dinheiro que eles produziam e queriam que eles passassem por cima de qualquer um que se metesse no caminho da fama. Namjoon ainda não sabia como ainda tinha enlouquecido, mas com certeza a pressão e a crueldade da fama tinham feito ele e os outros mudarem. Cada um a sua forma tinha um jeito de lidar com isso. Namjoon escrevia letras que quase sempre acabavam em uma bola de papel amassado que posteriormente seria jogada em uma lixeira qualquer. Ele sempre dava um jeito de fazer com que eles não perdessem a essência de garotos, de jovens, mas a empresa nem aceitava mais suas letras. Pouco a pouco, cada um estava perdendo algo e Namjoon só observava sem poder fazer nada enquanto Yoongi depositava suas preocupações em uma garrafa de vodka ou qualquer outra bebida igualmente destrutiva, Taehyung ficava distante e Jimin perdia a alegria dos olhos para ser substituída pelo cansaço.

Esse era o ponto em que Namjoon sempre parava para pensar: o que a fama realmente estava causando a eles? Nem ele continuava o mesmo, e sabia disso. Quando o grupo entrou em hiatus ele foi bombardeado por propostas e espectativas de todos os lados. Sua cabeça parecia que iria explodir sempre que pensava no quanto ele tinha deixado para trás. Às vezes ele apenas se perguntava se estava fazendo a coisa certa, principalmente quando se lembrava de seu sonho antigo de criança.

Fazia muito tempo desde que ele não parava de trabalhar para fazer algo como se sentar na praia e descansar. Talvez a aproximação do alistamento tivesse tido alguma influência sobre ele. Talvez saber que em menos de doze horas ele estaria se despedindo de todos aqueles que ainda lhe eram próximos e estaria forçando um sorriso para as câmeras a fim de acalmar as fãs e esconder sua angústia haviam tido um efeito sobre ele. Doze horas. Alistamento. Talvez o fim de tudo, talvez o começo. Quando embarcasse no avião seu destino ficaria, mais uma vez, incerto. As chances de ele voltar eram altas, assim como as de ele não voltar. Seu estômago se revirava ao pensar nisso.

Ele só queria saber se tinha valido à pena. Se o esforço mudaria algo. Sua amargura em relação ao alistamento era tão grande que ele fugira de seu apartamento para pensar, pois sabia que a maknae line apareceria para o consolar. Ele não queria isso. Ele só queria um lugar onde pudesse depositar a angústia para fora, liberar o que escondeu por tantos anos pelas ARMYs. Fingir era tão natural para ele que tinha se tornado quase como respirar.

Ele não sabia mais quem ele era.

Namjoon olhou para o céu, para a noite estrelada que o encarava. Ele quis saber o que fazer. Ele queria saber porque estava ali. Só não podia voltar para casa.

De alguma forma estranha, ele se sentia vazio por dentro.

De repente, seus pensamentos foram interrompidos por uma voz. Uma bonita voz que vinha de algum lugar ali perto. Ele se levantou cuidadosamente e a seguiu, poucos segundos antes de reconhecer a música. Um filme começou a se passar em sua mente em questão de segundos.

Under the Sky [BTS]Onde histórias criam vida. Descubra agora