Vinte e dois de outubro de 2015, um dia como outro qualquer, onde pessoas nascem e outras morrem, no Hospital Santa Maria em Lisboa encontrava-se internado Felix Vasconcelos de Souza, um jovem com vinte e seis anos de idade, recém licenciado pela famosa Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, acometido de um cancro terminal que havia destruído seu cérebro brilhante numa velocidade impressionante.
Seus últimos dias fora na cama do hospital, hora lúcido e hora inconsciente devido aos medicamentos, aos poucos a morfina parecia não fazer mais efeito, sua respiração ofegante parecia anunciar o final de sua tenra vida e ao seu redor estavam aqueles a quem mais amava, seus pais, irmãos, tios e primos. Exatamente às 16.45h seu coração silenciou-se, sua respiração ofegante rendeu-se a calmaria de um corpo dominado pela morte, sua partida foi silenciosa. Foi como se uma brisa soprasse naquele quarto deixando para trás um corpo inerte e sem vida.
O choro e desespero natural de quem perde alguém tão amado, tão jovem e de forma tão cruel tomou conta de seus familiares que buscavam um no outro o consolo necessário para uma hora como aquela. Felix era um jovem solteiro, talentoso, sonhador, um excelente filho e um bom amigo. Não haveria quem não sentisse saudade de uma pessoa tão especial. Entretanto a vida é assim, termina sem dizer nem quando e nem como.
A saudade é a marca mais cruel da morte, com ela chega a amargura, a solidão e o medo. A morte assusta por causa do desconhecido. Dizem que ninguém tem medo de morrer, mas de como morrer. Mas no fundo é o morrer que realmente assusta. Existe alguma coisa após a morte? Há alguma continuidade da existência ao fim desta vida terrena? Há algo além daquilo que vemos e sentimos? São tantas as perguntas, uma coisa é certa, todos terão um dia as suas dúvidas esclarecidas quando chegar a sua própria hora.
O corpo de Felix ainda sobre a cama do hospital, rodeado por seus entes queridos, quando Felix vê seu próprio corpo e aqueles que estavam por ali. Ele via as pessoas, mas não conseguia ouví-las. Era possível perceber o quanto era amado. Felix percebe que uma outra substância, não física envolvia o seu ser. Ele sentia-se leve, sem dores, sem angústia. Leve como uma pluma podia saltar e subir bem alto e ver seu corpo de cima enquanto descia devagar como uma pluma solta no ar. Logo percebeu que se desejasse poderia manter-se no ar, era algo tão simples como era dar alguns passos. Felix podia subir, descer, atravessar paredes, subir ao piso de cima ou descer ao piso de baixo sem qualquer impedimento. Não havia barreiras, por alguns instantes Felix se deixou distrair por este novo estado em que se encontrava.
Ao olhar para um canto do quarto Felix viu um ser que o observava com certa graça. Era um ser diferente, do seu rosto, pés e mãos irradiavam uma luz, seus olhos eram azuis claros, seus cabelos dourados pareciam de ouro fino. Suas vestes eram simples, impecavelmente brancas, sem costura ou emendas. Foi quando felix notou que suas vestes eram semelhantes. Os dois trocaram olhares até que o silêncio foi rompido por este ser que disse:
- Meu nome é Malquiel, sou um mensageiro enviado com a tarefe de conduzi-lo em segurança até seu próximo destino.
Felix não fazia a mínima ideia de onde seria este próximo destino, mas a presença de Malquiel dava-lhe segurança. Felix olhou pela primeira vez para seus entes queridos, mas não havia nele pesar, mas um sentimento de que brevemente iriam encontrar-se em breve. Neste instante Malquiel estende a mão para Felix que responde com o mesmo gesto. Malquiel segurou-lhe a mão com firmeza e mostrou-lhe o caminho que deviam seguir.
Logo que começaram a caminhar viram-se cercados por um denso nevoeiro. Não era possível ver mais que alguns poucos metros. Felix percebeu que outras criaturas caminhavam em silêncio e de mãos dadas com outros seres a semelhança de Malquiel.
Caminharam durante algum tempo e começaram a deparar-se com seres solitários, uns caminhavam, outros andavam em círculos e outros prostravam-se desesperados sem saber para onde ir. Todos estes seres tinham um semblante de horror e espanto, alguns choravam e outros gemiam, mas era como se não vissem os demais que assim como Felix por ali passavam.
Malquiel segurava as mãos de Felix que parecia assustado com o que via. Um pouco mais adiante uma cratera abriu-se no chão por onde passavam, lá de dentro saiu uma enorme língua vermelha, coberta com alguns fios de cabelo e gosmenta. Outras línguas surgiam em outros lados, estas enrolavam-se nas criaturas solitárias que aos gritos de horror eram tragadas para o seio da terra.
Indiferente ao que acontecia a sua volta Malquiel seguia seu caminho segurando a mão de Felix. A sensação era de que desciam um vale onde o nevoeiro parecia ainda mais forte e os gritos e choros mais constantes. Quando chegaram ao fundo daquilo que parecia um vale o barulho era assustador. Felix ouviu o barulho de aves de rapina que sobrevoavam as suas cabeças quando olhou para ver não podia acreditar no tamanho e no aspecto asqueroso destas criaturas. Eram capazes de tragar de uma única vez estes seres solitários. Em alguns momentos as línguas e as aves disputavam a mesma criatura que em desespero desaparecia tragado por aquele que era mais forte.
Logo começaram a subir novamente e aos poucos estas cenas foram ficando cada vez menos frequentes, ouvia-se ainda alguns gritos, porém, longe e fracos. Felix sentia o ar mais leve e o nevoeiro ia se dissipando a medida em que caminhavam.
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Seu comentário será de grande valia para os próximos capítulos.
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A Caminho do Paraíso
General FictionUma história emocionante da vida após a morte de um jovem de vinte seis anos vítima de uma doença incurável. Os primeiros momentos após a morte, sua caminha em direção ao seu destino final, os horrores e as belezas do caminho narrados numa história...