Assim que despertaram, Eurico e Félix puseram-se a andar. Segundo Eurico, faltava pouco até chegarem no próximo destino. Eurico parecia mais a vontade com Félix e seguia cantarolando pelo caminho. Quando chegaram ao cimo da montanha uma vista espetacular surgiu diante dos seus olhos. Era uma pradaria a perder de vista, uma vegetação rasteira cobria o chão, o céu azul cobria toda aquela extensão como se fora um véu. Em todos lados haviam flores das mais variadas, algumas nunca vistas antes por Félix.
Avistaram ao longe alguma coisa que caminhava em suas direção. Quanto mais aproximavam-se mais nítida era a imagem e logo perceberam que tratavam-se de três veados. "- Os veados são os animais das pradarias." Lembrou Eurico. Logo que chegaram cumprimentaram-se com o mesmo modo cordial com que os demais animais haviam saudado Eurico.
- Muito bem meu caro, aqui dizemos adeus. Disse Eurico a Félix.
- Mas é um adeus para sempre? Perguntou Félix.
- Não meu nobre, é um adeus até o dia do Cordeiro. Agora tens que seguir com nossos amigos até seu próximo destino, será uma belíssima viagem.Félix passou sua mão sobre a cabeça de Eurico, numa despedida cheia de saudades, mas sem nenhuma tristeza. Félix começou a caminhar com seus novos amigos, mas as vezes olhava para trás em direção a Eurico que logo desapareceu montanha abaixo. Um os veados, o maior dos três disse a Félix: "- Não se preocupe, o dia do Cordeiro não tarda, e logo estaremos todos unidos numa multidão que será como as areias do mar." Félix seguia em silêncio e tentava compreender como os sentimentos que outrora traria-lhe tristeza, agora enchia seu coração de paz.
Depois de algum tempo Félix perguntou: "- E vocês, quem são, quais são os seus nomes." O veado mais alto e com um par de chifres com dezasseis pontas disse: "- Somos os guardiões desta pradaria. Meu nome é Alfeu e estes são Rubem e Bernardo." Félix perguntou: "- Desde quando animais recebem nomes de humanos?" E Bernardo respondeu: "- Desde quando os homens passaram a receber nomes de animais. Já reparou que mesmo os anjos receberam nomes como os dos animais? Por exemplo Miguel e Gabriel." E Rubem logo acrescentou: "- Eu conheci um cavalo que chamava-se Gabriel." "- Gabriel?" Disse Félix. "- Não confundam o rapaz." Disse Alfeu. E continuou: "- No paraíso somos todos iguais, anjos, homens e animais. Temos apenas missões distintas. Veja, o próprio Filho de Deus é chamado de Cordeiro, então por que um veado como eu não pode ser chamado de Alfeu?" Félix respondeu: "É verdade, faz sentido!" E continuaram a caminhar.
O céu ficou ligeiramente escuro, apenas o suficiente para as estrelas aparecerem. Era uma imagem impressionante, a pradaria e o céu pareciam tocarem-se no horizonte. Félix nunca tinha visto estrelas tão próximas e tão bonitas. A lua não estava no céu, tal como o sol também não estava quando era plena a luz do dia. Alfeu explicou que nem a lua nem o sol eram necessários, pois o próprio Deus era a luz dos seus.
Eles caminharam até que chegaram a um rio. Alfeu recomendou que eles esperassem por ali até a luz do dia. Todos deitaram nas margens do rio e adormeceram. Quando despertaram o céu já estava claro. Félix olhou para o rio e ficou impressionado, pois suas águas eram claras e brilhantes como um cristal. Alfeu disse que era necessário passar para o outro lado do rio.
Quando entraram na água e iniciaram a travessia, Félix percebeu que a água tinha uma temperatura agradável, sua correnteza era suave e suas águas convidativas para um mergulho. Félix ao mergulhar viu um número muito grande de peixes, de diversas cores e tamanho. Eles não fugiam de Félix, ao contrário o rodeavam como que surpresos. Quando chegaram do outro lado do rio Félix observou que as águas do rio haviam feito com que sua pele e vestimenta também brilhassem. Quando perguntou que rio era este, Alfeu respondeu que era um rio cuja nascente era debaixo do trono do Cordeiro.
As águas do rio serviram para purificar Félix, conferindo a ele um aspecto celestial. Félix estava ainda mais feliz, a cada passo percebia que estava aproximando-se do Cordeiro. Ele perguntou se todos os que iam em direção ao Cordeiro passavam pelos mesmos lugares. Mas Alfeu respondeu que não, haviam vários caminhos, cada um preparado para um tipo de pessoa. Não se tratava de um mero caminho em direção ao Cordeiro, mas um processo importante pelo qual cada um deveria passar para estar preparado para o grande encontro. O próprio Cordeiro havia preparado cada um dos trajetos, todos eles eram apenas vias, enquanto o Cordeiro era o próprio caminho que atraía os seus para si mesmo. Cada via era resultado da experiência de cada um é um processo indispensável para preparar cada um para o grande encontro.
Depois de um tempo de caminhada chegaram a um poço, Félix com seus braços fortes tratou de tirar água do poço e servia aos seus companheiros enquanto também tirava água para si próprio. Não é que estivessem com sede, mas que beber a água era algo prazeroso. Alfeu fez questão de lembrar que o nome daquele poço era Poço de Jacó. Quando Félix perguntou o motivo do nome todos riram e disseram que era uma referência ao patriarca Jacó, que durante sua vida na terra gostava muito de poços.
Continuaram a caminhada até que a pradaria ía aos poucos ficando para trás dando lugar a uma vegetação mais agreste até que chegaram a uma região de areia seca. Félix sentiu que era hora de mais uma despedida e de recomeçar uma nova etapa em sua jornada. Logo apareceu um eremita, vestido com tecidos escuros, sandálias nos pés e com a cabeça coberta por uma túnica. Mais uma vez a cordial saudação e o início de uma nova caminhada pelo desconhecido.
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A Caminho do Paraíso
General FictionUma história emocionante da vida após a morte de um jovem de vinte seis anos vítima de uma doença incurável. Os primeiros momentos após a morte, sua caminha em direção ao seu destino final, os horrores e as belezas do caminho narrados numa história...