O Mágico

2.1 - Ponto de Partida

- Izabel Avery? - Uma voz masculina chamou pelo alto-falante. - Sala 104.

Após ouvir seu nome ser mencionado, Izzie, como costumava ser chamada desde a infância, ergueu o corpo esguio da poltrona de couro azul marinho e ajeitou a blusa de botões que vestia, alisou a saia numa tentativa desanimada de alinhar-se e caminhou pelo corredor estreito em busca da sala 104. Não foi difícil achar a porta correta, já que era a segunda à sua direita. Após bater levemente na madeira por duas vezes, conforme a etiqueta solicitava, a jovem girou a maçaneta e entrou na sala, fechando a porta atrás de si logo depois.

- Aproxime-se, por favor. - O homem disse. - Pode sentar-se aqui.

Havia outra poltrona de couro azul marinho dentro da sala, ela observou enquanto sentava-se que a mobília do gabinete era similar à que tinha na recepção, criando alguma monotonia no ambiente. Acomodou-se e repousou a bolsa e o casaco que levava consigo na poltrona vazia que havia ao lado.

- Obrigada. - A voz dela soou baixa, porém firme.

- Tenho os resultados de seus testes, Izabel. - O homem começou.

- Izzie... - Ela o interrompeu. - Quando me chamam desse jeito, sinto que estou prestes a levar uma bronca de meus pais.

A justificativa da mulher fez nascer um sorriso consternado na face do homem à sua frente. Ele consentiu com um aceno de cabeça e abriu a pasta que continha uma etiqueta branca, com letras de forma impressas, revelando o nome da jovem.

- Pois bem, Izzie. - Ele corrigiu. - Seus testes estão aqui e tive algum tempo para analisar os resultados. Confesso que fiquei impressionado com você e suas habilidades.

- Obrigada senhor. - Ela relaxou um pouco diante daquelas informações.

- Seu perfil é muito desejado nas escolas de aperfeiçoamento ministerial. - Ele continuou. - Esperta, sociável, com facilidade de aprendizado e muita generosidade. Um temperamento manso e humilde, ao que me consta.

- Tenho buscado oferecer o melhor de mim, senhor. - Ela descansou os braços no apoio de sua poltrona.

- Você tem vasto conhecimento bíblico e também participou de muitas ações sociais, eventos de caridade, além de ser parte do corpo musical de sua congregação. - Ele bisbilhotava as folhas, mas não parecia estar lendo nada do que havia ali. - Estudou em escolas para líderes, monitorou acampamentos estudantis e sempre participava de palestras e campanhas para alimentar os necessitados.

- Não entendendo do que se trata tudo isso. - Ela coçou a bochecha duas vezes e soube que seu equilíbrio a estava deixando lentamente. - O que precisa de mim?

Hudson Miller, dono de uma conceituada agência missionária, tinha planos diferentes para a jovem Izzie Avery. Ele encontrou algo além do que os testes que ela havia feito demonstravam, mas tudo isso após meses de observação e pesquisa a respeito daquela moça. O grupo missionário de Miller estava presente em diversos países oferecendo todo tipo de ajuda, e eles necessitavam muito de novos voluntários, pessoas dispostas a dar a vida em nome de algo maior, homens e mulheres que desejassem verdadeiramente levar uma palavra de conforto, luz e vida para pessoas que estivessem desacreditadas, infelizes ou frustradas com sua condição.

- Você fez sua inscrição para atuar na Suíça, Nova Zelândia ou Austrália, estou certo?

- Sim, senhor. - Ela concordou e sacudiu a cabeça levemente. - Está escrito na minha ficha.

- Temos outros planos para você, Izzie.

- Como assim? - A expressão dela caiu em descrença. - Mas sua assistente disse ao telefone que eu havia sido aprovada, por isso viajei de Dallas até aqui.

- Eu sei disso. - Miller fechou a pasta que continha o nome de Izzie escrita na etiqueta. - Não disse que foi reprovada, mas que seus planos não estão de acordo com os nossos... Talvez não estejam de acordo com os d'Ele também.

- Do que se trata? - A respiração dela tornou-se pesada e a sensação de sufocamento, comum quando as coisas fugiam ao controle, começou a  dar sinais através de suor em suas mãos. - O que querem de mim?

- Vamos designá-la para a Califórnia. - O homem sentenciou e recostou na poltrona negra. - Sei que parece sem sentido, considerando suas aptidões e seus interesses, mas pensei a respeito por muito tempo. Estamos montando uma base de missionários naquele lugar e precisamos de pessoas como você para ajudar na orientação e organização do lugar.

- O que há de especial naquela cidade?

- Ainda não sabemos ao certo, mas todos temos um propósito que precisa ser alcançado, não é mesmo?

Lizzie voltou para o hotel em que se hospedara com algum pesar. Precisou buscar conforto em suas orações e pediu alguma orientação à Deus sobre o que fazer em seguida. Miller concedeu 12 horas para que a jovem decidisse ou não aceitar aquela missão tão inusitada. Ela dormiu naquela noite sem saber o que responder ao homem no dia seguinte.