Capítulo 3

47 5 1
                                    

E de surpresa em surpresa, o inesperado. E quando o inesperado lhe sorri, como não lhe sorrir de volta?

Camila Custodio

🌊🐙🌊

Ele abria os olhos lentamente, piscando e franzido o rosto. Parecia estar a ponto de vomitar.

No momento em que eu o vi desmaiado na entrada da caverna, eu imediatamente acordei Jade, que assim como eu ficou surpresa por encontrar um desconhecido ali; afinal, conhecíamos todos na Ilha e ver alguém que não era dali foi surpreendente e um pouco assustador. Mas talvez tenha sido assustador mesmo o fato do jovem estar nu, sem roupa, sequer algo para esconder suas partes íntimas, que ficavam à mostra para qualquer um ver. Nesse caso, eu e Jade.

- Pela Deusa Íris, Roménia! O que ele faz aqui? - Disse Jade pondo as mãos sobre o coração.

- Pergunte à Deusa, ora essa! - Respondi cutucando-o com o pé, e de repente só senti ele o agarrar e me puxar pra baixo, fazendo com que eu caísse no chão cheio de areia e pedras.
No segundo seguinte ele estava em cima de mim, com as mãos no meu pescoço e seus dente a mostra, parecendo um bixo.

- Soo...coo..- tentei falar mas ele estava apertando demais minha garganta, eu quase já não conseguia respirar - ...paaraaa... - falei batendo em suas mãos, meu rosto ficava cada vez mais vermelho e de um momento a outro escutei minha irmã gritar e vi os braços dela ao redor do pescoço daquele louco.

- Solta ela seu desgraçado! Demônio do mar! Morra! - Jade gritava apertando seus braços ao redor do pescoço dele, que justamente me soltou e se virou pra Jade que o soltou imediatamente e foi dando passos pra trás, enquanto ele se levantava e caminhava até ela.
Tentei me levantar mas o ar me faltava e sentia minha cabeça como se estivesse dormindo; tudo parecia devagar,borrado.

Ele estava a ponto de atacar Jade, mas, de repente, ele começou a gritar, parecia estar a ponto de chorar, e só então eu vi o que havia em suas costas. Haviam muitíssimos pontos vermelhos inchados e sangrando. Eu sabia o que era; afinal, vivíamos na praia e a maioria das pessoas já tinha levado uma ferroada de uma arraia.
Ele se largou de joelhos no chão, curvado de tanta dor.

Jade e eu ficamos nos encarando e de repente o selvagem desmaiou, caindo de cara na areia.

- Você está bem? - Disse minha irmã chegando ao meu lado e me ajudando a levantar do chão. - Eu achei que ele ia te matar. - Diz ela com lágrimas nos olhos.
Geralmente não choramos, quase não temos motivos para isso, mas acho que quando vemos a quase morte de alguém querido, o choro é inevitável.

- Tá tudo bem... - sussurrei pondo a minha mão na garganta, sentindo como ela parecia estar inchada.

- O que vamos fazer agora? Olha só... - ela apontou para a entrada da caverna onde dava para ver que a tempestade havia parado e que já era de noite. A maré estava um pouco mais baixa. - ... nós poderíamos ir embora e deixar esse demônio ai. Ninguém vai sentir a falta, não é?

- Dedé, eu acho que se a gente deixar ele aqui, ele vai morrer. Eu não me perdoaria.

- Você é louca né? Esse mostro demoníaco quase te matou e você quer ajudar ele Romênia? - ela disse pondo as mãos na cintura.

- Eu sei...- sussurrei e tossi -... e se a gente levar ele até a vila... - tossi mais um pouco e a cada movimento minha garganta doía mais.

- Tá tá, não fala nada. - Ela foi falando e se pondo ao lado do homem. - Vamos apoiar ele e levar até a vila, mas...- disse pra mim -... se ele nos atacar de novo, a gente joga ele no mar e deixa os monstros engolirem ele. Sério mesmo Romênia!
Assenti com a cabeça concordando com ela. Mesmo que a razão mandasse eu deixar esse louco por ali, meu coração dizia para ajudar, afinal, se ele venho do mar, era um presente dos deuses; assim como todos nós somos.

Assim, eu e minha irmã conseguimos, depois de muito esforço, fazer aquele monstro apoiar-se em nós. Aos poucos passos fomos saindo da caverna com a água batendo em nossas canelas e o demônio sobre nós.
Só rezei à deusa que nos mantivesse viva até chegarmos à vila.

🔱

Muito tempo depois, no qual se tornava cada vez mais difícil caminhar, a fome nos assolava, e para variar o homem pesava muito. Não que fosse gordo, notei, mas sim tinha músculos bem definidos. O seu abdômen era formidável; em si, todo seu corpo era formidável, tirando o fato de que ele era um assassino e que estava nu.

- Eu não consigo mais Menia! - Disse Jade suspirando e largando o homem, fazendo com que eu tivesse que aguentar todo seu peso.

- Jade! - tentei gritar quase indo ao chão, ao que ela, tão tapada, se deu conta de que não conseguiria com todo aquele peso e me ajudou. - Que tal... se a gente caminhar só mais um pouquinho... Eu acho que estou escutando algo... - sussurrei sentindo minha garganta seca.

- Okay. Mais um pouquinho e chega, vamos sentar e dormir por ai mesmo. - Jade disse apoiando o braço do brutamontes no seus ombros. Começamos a caminhar.
E finalmente quando estávamos a ponto de desistir, vimos luzes, parecia fogo, e onde havia fogo, havia pessoas.
Jade começou a gritar, e a luz parecia chegar cada vez mais perto, então vi que era uma tocha e que quem a carregava nada mais era do que Rozier.

- O que é isso?! - ele exclamou surpreso nos olhando. - O que...?

- Ajuda, por favor. - Implorou Jade, ao que Rozier chegou perto de nós e pegou o homem.

- Como é pesado! E quem é ele?

- Não sabemos, só precisamos levar ele à mama, ele está ferido nas costas. - Respondeu-lhe Jade.

- E febril. - Disse Rozier - a cabana da mama está perto; peguem-o dos braços que eu o seguro pelos pés.

- Sim senhor. - Respondi sorrindo a Rozier. - Obrigada.

- As ordens, eu acho... - ele disse dando de ombros e pegando os pés do homem. - Vamos lá garotas, vamos ajudar este pobre coitado.

Eu e Jade nos olhamos, acho que ambas pensamos o mesmo; de pobre coitado o monstro não tinha nada.

Amor do mar Onde histórias criam vida. Descubra agora