Capítulo I. Selena

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Lá estava ela, largada, abandonada, sem esperança ou vontade de viver, a razão para existir havia sido tomada, a dor a cegou, o sofrimento a ensurdeceu, a ausência de prazer a aleijou, e a falta de esperança a deixou muda. Selena não passava de uma casca vazia, em nada lembrava um dia a mulher que já fora, a vida daquela mulher havia sido extirpado dela como Leora havia sido... como Leora havia sido tomada.

Uma aura de derrota pairava e atormentava a alma da mulher de Umbrey, ela procurava em bebidas e drogas o que lhe faltava, como o afogado que buscava incansavelmente a superfície para respirar. E em sua própria visão ela já havia chegado ao fim, ao fundo do poço. Sozinha, sem seus companheiros, e sem vontade de viver.

- É isso, acabou. Acabou a guerra, acabaram as batalhas, os tratados e as sociedades... Acabou a caminhada e a investigação, Acabou tudo inclusive o que restava de mim.

Selena dizia a si mesma enquanto pedia mais um gole da mais forte bebida que seu dinheiro conseguia comprar. Enquanto virava garrafa atrás de garrafa para aliviar seu sofrimento, tentando esquecer o que sua mente entorpecida fazia questão de lembrar a todo o momento. "PORQUE VOCÊ FEZ ISSO?" era a pergunta que mais ecoava em sua mente, e ao mesmo tempo ela sabia a resposta, ela lutava e relutava em aceitar, há tantos anos tentando e até agora não conseguia aceitar. Por mais obvia que fosse a resposta era impossível conviver com ela.

- E agora? Como vou passar meus dias sem você? Tudo o que eu tinha se foi. Tenho certeza de que todos seguiram suas vidas e estão felizes... – tomava mais um gole de sua bebida enquanto se via em outro devaneio – não quero tirar essa tranquilidade de nenhum deles – bebia enquanto chorava – não, não depois de tantas batalhas e sacrifícios. Todos merecem o descanso, mas... mas... Céus!!! POR QUE? Por que você me deixou, sua desgraçada?!

Selena praguejava e balbuciava palavras ofensivas e maldições para si e sua amada. Seu choro era longo, triste, um lamento eterno e doloroso de uma alma com um propósito distorcido e sem brilho. Um misto de ódio e tristeza habitava seu coração pela perda.

Mas como chamar de perda algo que foi arrancado de se si? Não de fato não era uma perda, não foi um infortúnio, não era ruim perde-la era ruim não estar preparada para perdê-la, não daquela forma, não naquele momento. Selena gritava em choro e soluço o mais alto que seus pulmões aguentavam, na falsa esperança que qualquer coisa que fizesse a trouxesse de volta.

– Leora? Leora! Volte aqui, eu estou aqui! Eu vi você correndo! - Selena coloca a mão na cabeça enquanto cai em si que estava perdida em pensamentos novamente – Não, é apenas outra mestiça, outra meia-elfa, mas... eu preciso dela, eu preciso mata-la, preciso de sua alma para trazê-la de volta, preciso de você de volta Leora.

Selena olha para o lado e vê uma imagem distorcida e sem forma que se senta ao seu lado naquela mesa de taberna abandonada na terra de ninguém.

– Pare de me julgar! Pare de me julgar Leora! Você mais do que ninguém sabe o que é estar na pior, você devia me entender. Você ia gostar de estar aqui do meu lado, ia gostar de estar aqui bebendo comigo como fazíamos antes. Como fazíamos, eu ia gostar que estivesse aqui comigo para te abraçar.

– Argh! Estou tendo essas visões outra vez! E outra vez acordo no balcão sozinha e nadando no meu próprio vômito. Com aquela maldita ressaca!!! Mas aí, eu me lembro, da sua voz doce e melodiosa cantando pra mim, ou da sua voz nervosa e agitada enquanto brigava comigo, ou de seu corpo nu e quente entrelaçado ao meu... de sua cicatriz no olho, e de seus ferimentos... Ferimentos causados por aqueles VERMES!!!

Crônicas de Korn: Histórias de um Mundo Desolado.  Parte 1Onde histórias criam vida. Descubra agora