Capítulo {Olivia}- Um.

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Eu  não queria sair da minha cama pra nada. Sabe quando os pés não querem se mexer, as pernas fazem de tudo para não dar um passo, elas realmente lutam com força, e os olhos, ah, os olhos. Nem pense em abrir. Eles não querem ver a luz do sol. Chegam a arder e queimar com toda essa iluminação.

Com todo o esforço mental e espiritual, me levantei da cama e fui ao banheiro, tomando um banho que me deixou com a vontade no total de zero por cento de sair dali. Mais uma luta. Vamos lá Olivia, você consegue. Me arrumei de um jeito desleixado -como sempre- e desci para o café-da-manhã nada em família.

Meus pais são separados. Eu não sofri com o divórcio, eu nem tinha nascido. Minha mãe conta que eu tinha exatos três meses de vida dentro da barriga dela, e meu pai à deixou para ficar com uma outra mulher. Aquela na qual você olha e lembra daquelas mulheres todas artificiais, bronzeadas e nomeadas de "gostosas" por homens completamente apaixonados por bundas e peitos. O que aconteceu com o amor ? Deve nem existir mais. Meu pai hoje é bem rico e mora em uma casa de praia que eu diria ser quase uma mansão, em Malibu, no noroeste do Condado de Los Angeles, na Califórnia. E eu, moro com minha mãe em Los Angeles. Nossa casa é bem simples, e praticamente vivemos da pensão do meu pai, e de salários de alguns trabalhos que minha mãe faz por ai. Cada dia é um. Eu gostaria de ajudar, mas ela fala que se eu for para algum lugar longe dela, pode acontecer algo. Simplesmente é uma chatice ter leucemia linfoide aguda. Leucemia são cânceres da medula óssea e do sangue. 

     Fui diagnosticada aos doze anos. Eu estava passando muito mal a dias mas minha mãe não tinha horario para me levar ao médico. Quando fomos, estava com anemia altíssima. Depois, o médico falou para não preocuparmos, não era anemia. Era leucemia. E bom, eu certamente me preocupei. Fiz o tratamento por cinco anos. Aos quinze anos consegui medula. Estou bem agora, só preciso de ir sempre ao médico e tenho imunidade baixa.

       Percebi que mamãe não estava em casa quando peguei um papelzinho rasgado de um saco de pão, escrito "mamãe foi trabalhar de garçonete hoje" com uma letra bem pequenininha. Sorri, e sai de casa, trancando a porta de acesso. 

       O dia estava frio, caminhei até minha loja de doces favorita, que era na outra esquina. Abri a porta bem rápido me "jogando" lá dentro e sem ver quem estava por lá, fui falando com minha amiga, Ana:

"Ana, que cheiro gostoso, o que temos pra hoje?" 

Meu sorriso se desfez em um segundo e eu fiquei vermelha. Não era a Ana, era um moço. Parabéns Olivia, você pagou mico. O moço estava sorrindo, quase que segurando a risada. 

"Pode me chamar de Matthew. Ana tirou uns dias de férias."  O garoto disse com sua voz grossa e rouca.

"Me desculpa. Eu achei que ela estaria aqui." Falei ainda envergonhada. 

"Bom..." Ele disse sorrindo. "Temos Cheesecake de chocolate para hoje."

Eu tenho certeza que meus olhos brilharam só de ouvir a palavra "cheesecake" . Pedi um pedaço e comi com toda a vontade do mundo. Juntei meu dinheiro amassado que estava em meu bolso e passei para o tal de Matthew. 

"Volte sempre." Ele disse, ainda com aquele sorriso no rosto.

"Na verdade eu sempre estou aqui." Foi a última coisa que eu disse antes de sair por aquela porta. 

E provavelmente não volto tão cedo. Sei que vou ficar com vergonha sempre que entrar naquele lugar, mesmo que seja a Ana de novo.

Enquanto eu caminhava lentamente de volta para casa, meu celular começou a vibrar no bolso da minha calça. Atendi meu pai que estava me chamando para ir para Malibu. 

Olhar para a cara a Bettanie, se gabando com seu celular novo, seu biquíni importado de Paris, suas unhas que foram feitas por uma manicure particular, e seu cabelo loiro-oxigenado ? Não, obrigada. 
Mas por outro lado, faz tempo que não passo uns dias com meu pai. Mesmo com essa distância e discordâncias, ele pagou todo meu tratamento. Aceitei por fim. Em uma semana, eu estaria em Malibu, tendo que suportar toda aquela Bettanie e, nossa... Já estou agoniada. 

Os Olhos de Olivia - Por Eduarda X.Where stories live. Discover now