O Plano de Valentyn

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O professor Roberto era um cara legal que morava a duas quadras de onde eu fazia o curso. Homem solteiro, de 25 anos, era o xodó de muitas alunas. Algumas queriam só a casquinha daquele sorvetão, outras ignoravam o fato de ele ser sexy e simplesmente queriam amizade, talvez até paternidade, mas eu era uma daqueles raros casos que não queriam nada, apenas um relacionamento profissional entre aluno e professor. Diferentemente de minhas professoras de Literatura, Gramática (minhas vizinhas) e Matemática I, meus professores de História, Matemática II e Física (meu outro vizinho). Por três deles serem meus vizinhos, conheço muito bem a vida deles. A professora de literatura é casada com um médico muito gato e é minha vizinha da frente. A professora de gramática é minha vizinha da esquerda. Solteira, ela vive lá em casa ou eu na casa dela. Nos conhecemos desde que eu tinha 5 anos. Amigas de infância, eu e ela já aprontamos boas traquinagens. Ela tem 23 anos e é um doce de pessoa. Meu professor de física é meu vizinho da direita. Cara legal, quando preciso de ajuda no dever de casa eu bato na porta dele. Ele mora com a irmã que tá no terceiro ano do ensino médio, outra garota legal. E ainda tinha Esperanza, minha amiga que morava atrás de minha casa com minha professora de Matemática I. A janela do quarto dela era de frente a minha. A professora era tia de minha amiga. Os pais de Esperanza estavam viajando e deixaram ela com a tia. Mas ela não se importa pois, morou a vida quase toda com a tia mesmo. Então eu morava perto desse povo todo e nós moramos em um grande condomínio, que para 70 casas há uma piscina (E o condomínio tem 420 casas duplex. É quase um bairro). Eu moro há uns 4 quilômetros da escola, então no dia em que meus pais não podem me deixar, carona é o que não falta.

Agora eu estava dentro do carro do professor. Depois de muita insistência ele conseguiu me levar ao curso. E, detalhe, o policial Felipe estava no banco de trás do carro. Ele não largaria do meu pé, pelo visto. Ainda com cara de poucos amigos e um coração dilacerado, resolvi pegar minha bolsinha de emergência e limpar meu rosto. Peguei um lenço umedecido e comecei a trabalhar em melhorar minha aparência. Foi quando Roberto decidiu iniciar um diálogo. Ele podia até ser legal, mas eu não estava nem um pouco a fim de conversar.

-Ele era um grande amigo seu? – perguntou. Eu apenas afirmei com a cabeça.

-Ele não era um amigo. Era mais do que isso não é? – perguntou Felipe entrando na conversa.

Olhei para ele pelo espelho que estava me olhando. Ele não estava mais fardado. Ele usava uma camisa social, calça jeans e tênis. Sem o uniforme ele parecia um garoto. Desviei o olhar, me concentrei em passar ao menos uma base no rosto e balancei a cabeça negativamente.

-Erika. – o professor atraiu minha atenção novamente – Eu sinto muito.

Por essa eu não esperava. Aquilo me desarmou. Não esperava que ele dissesse isso. Achei que ele iria dizer que não acreditava no meu não silencioso mas, não me julgou. Apenas repetiu o que a maioria tinha dito para mim o dia todo. Tomei coragem e perguntei:

-Pelo quê?

-Por ter acabado do jeito que acabou.

-Não foi culpa sua. Foi escolha dele.

-Então por que choras? – perguntou o policial.

-Porque no fim, as lembranças doem bastante. Porque tudo fica guardado na memória. Cada palavra, cada abraço, cada sorriso... Tudo é armazenado.

Depois disso, todo o trajeto foi o mais silencioso possível. Ao chegarmos no meu curso, agradeci a carona, abracei o professor e sai do carro. Tentei prestar atenção o máximo possível na aula, mas, com um policial atrás de mim, a professora direto olhando para mim e meus pensamentos no espaço, foi difícil. Peguei o ônibus de sempre para ir para casa. Ignorar um policial estava sendo difícil. Ao chegar em casa, estava tudo escuro e vazio, como sempre. Tirei os sapatos, fui a cozinha beber água e me joguei no sofá de três lugares. Nossa! Como eu estava com sede e cansaço! Ignorei o Felipe que estava sentado no sofá de dois lugares olhando para mim. Quando estava quase dormindo, meu celular começou a tocar.

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