Primeira acusação

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Fui condenada por alta traição. Acusada de tramar contra meu marido, acusada de tramar contra meu povo. Condenada por tramar contra meu rei.

Não tramei artimanha nenhuma contra aqueles que me condenam. Diferente do que meu rei afirma agora, não usei bruxaria para amarrá-lo.

Mas não me considero inocente desta acusação.
Pelos termos da justiça da corte eu, Ana Bolena, sou considerada culpada por cometer e executar planos contra a coroa da Inglaterra.

Eu afirmo que sou culpada. Não por tramar contra meu rei e meu país mas por orquestrar contra minha rainha, hoje morta, Catarina Aragão.

Tramei junto com meu rei, Henrique VIII, o anulamento de seu casamento com Catarina.

Não engano a mim mesma dizendo que Henrique me iludiu e me usou. Participei de livre escolha desde o início. Tudo por causa da coroa.

Não há nada a dizer em minha defesa, apenas que egoísmo é uma das emoções mais antigas do mundo. E não me condene quando digo que, possivelmente, essa era a única emoção permitida na corte.

O Modus Operandi da corte era quem toma o lugar de quem na escala da nobreza. Aprendi muito nos anos que servi de aia a Lady Margarida e a rainha Cláudia de Valois.

"Nunca deixe que algum homem ganhe seus favores sem ter suado bastante. — dizia Lady Margarida— O golpe no orgulho de um homem é uma mulher que lhe rejeita sem motivo aparente. Nunca se esqueça: atiçar o fogo para depois esfriá-lo aos poucos é o segredo para que uma boa amante consiga seu lugar."

E foi isso que fiz. Graças aos ensinamentos franceses que me fizeram capaz de agir de maneira libidinosa, fui seduzindo Henrique aos poucos. Oferecendo tudo para depois negar.

Negando o acesso ao meu corpo enquanto Catarina ainda fosse sua rainha consegui enlouquecer de desejo Henrique VIII, que já não estava muito satisfeito com a impossibilidade de esposa lhe dar um filho homem.

Aproveitei seu descontentamento, abandonei meus princípios, e investi na sedução do rei. Meu affair com Henrique durou cerca de seis anos.

Não há como me arrepender desses seis anos que passei como amante do homem que amei. Porque eu o amei, não digo que desde sempre foi amor porque não era assim que funcionava na corte. Meu amor por Henrique foi crescendo aos poucos, assim como meu lugar na cama do rei.

Catarina foi expulsa de seu próprio dormitório. Foi humilhada por mim e aguentou tudo com uma dignidade invejável.

No entanto, apesar de não ser comum, o seu casamento com meu rei foi anulado e ela foi obrigada a sair da corte com sua única filha, Maria I.

Se me arrependo de expulsar a irmã de minha filha quando ela tinha 17 anos? Nenhum único ressentimento pesa em meu coração frio. E é por isso que me considero culpada. Eu traí a confiança da Rainha Catarina Aragão e por isso mereço pagar.

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