Primeira Parte

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8 de janeiro de 1987

Respondo à sua pergunta sobre "o que é bruxaria" em forma de carta. E começarei
com as coisas mais surpreendentes que eu possa imaginar. A maior surpresa sobre bruxaria,
para a maioria das pessoas, uma vez entendido que não somos "adoradores do diabo" nem
"instrumentos do poder do mal" (no verdadeiro estilo dos filmes de horror), é que veneramos
uma entidade feminina, uma Deusa. Também veneramos um Deus. Isto não surpreende
ninguém. Mas reverenciar a Mãe de Toda a Vida, nesta cultura, é inesperado. Tem
implicações espirituais, emocionais e sociais.
Historicamente, as bruxas foram perseguidas por sua crença em uma Deusa. Isso era
politicamente inaceitável num regime patriarcal. A veneração à Deusa teria que significar, por
exemplo, que a terra, a Mãe Terra, seria de novo sagrada. Ela não deveria mais ser poluída ou
explorada por qualquer razão, e se perderia uma enorme quantidade de poder ou lucro obtido
por homens inescrupulosos. Melhor, do ponto de vista deles, venerar um Deus que é todo
mente e espírito e vive lá no alto, longe da horrível e "pecaminosa" Terra.
Na visão espiritual de nosso mundo moderno, a feminilidade há muito tempo não é
considerada tão sacra quanto a masculinidade. A mulher, em todas as religiões patriarcais -
o cristianismo e o islamismo em particular - é vista como aquela que traz o pecado, a
traição, a armadilha ao sexo "santo". Mais próxima da animalidade, pela menstruação e parto,
e da terra. Como pode haver um Deus feminino?, as pessoas indagam. As bruxas dizem que o
parto é o ato criativo original, e que os seres pré-históricos adoravam tanto os deuses quanto
as deusas (principalmente as deusas) desde tempos imemoriais. Isto está descrito nas
mitologias mais antigas, e identificado por inúmeras figuras e esculturas de deusas,
descobertas em sítios arqueológicos, no mundo inteiro.
Hoje em dia, algumas bruxas, rebelando-se contra a cruel supressão da Deusa, chegam a
dizer que somente Ela deve ser venerada. Uma compreensível, mas triste reação. Entretanto,
o Pai de Toda a Vida, o Deus, precisa também de reconhecimento. Ele existe, e Sua omissão
seria tão errada quanto a destruição da crença na Deusa Mãe. E nesta obra não faremos
distinções entre o masculino e o feminino. Quando nos referirmos a bruxas, estaremos incluindo os bruxos. E vice-versa.

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