2. Sara DeVillage conhece a paz.

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Você acredita que existam pessoas que nasceram destinadas a cumprir certo papel? Pois eu sim. Acho inclusive que eu nasci pra se encaixar numa parte da sociedade que muitos não sentem prazer nenhum em dizer que fazem parte, mas sentem prazer de sobra em estar nela.

Desculpa começar assim sem me apresentar, é que sou mal acostumada de mais com isso de conversar. Muito prazer, sou Sara DeVillage, a prostituta numero um desse país. Estranho né?! Alguém se orgulhar desse posto. Pois eu me orgulho sim e me orgulho muito. É a única coisa que eu tenho para poder me orgulhar nessa vida, não consigo enxergar razões para não fazer isso. Já transei com as pessoas mais importantes desse país (mas isso não é algo exclusivo meu já que essa merda aqui é afundada em sexo, dinheiro e poder em hierarquia). Até o velho seboso do Chanceler Barbosa já tocou neste corpinho (risos), não só ele, mas todos os seus quatro filhos (incluindo Barbosa IV, o mais novinho) também. Tenho a marca do caralho de quase todos os rostinhos fechados que aparecem na TV durante a tarde, desde o ancora do noticiário nacional até o galã fortão (e viado) da ultima novela. E olha que só tenho vinte e quatro aninhos de idade (risos).

Sexo é a droga que mais dar dinheiro nesse país. Mais do que o álcool, mais do que o tabaco, mais do que as aspirinas, sexo é o entorpecente mais lucrativo. Foi justamente por isso que escolhi ser prostituta. Na verdade no inicio escolheram por mim, com onze anos de idade eu já fazia sucesso dentre os soldados da ocupação rebelde que vinham para o porto da minha cidade natal, a única diferença é que quem lucrava com isso tudo era minha mãe, não eu. Quando eu fiz dezesseis e ela morreu, percebi que ganhava muito mais dinheiro que eu imaginava ganhar com meu corpo, então nem passou pela minha cabeça escolher outra profissão. Eu realmente nasci para servir sexo. Se hoje em dia eu tenho minha própria casa de prostituição com sete meninas, meu carro, minha casa no condomínio mais luxuoso da Central da Cp I e o direito de poder ir a qualquer lugar desse país quando eu quiser, eu tenho que agradecer ao sexo. A ele e a política social estúpida desse país que endurece o caralho e o bolso dessa elite velha, gorda e fedida.

Não me sinto nenhum pouquinho mal em dizer que fiquei rica à custa dos abusos e roubos que o governo faz com a população, até porque não sou população, sou a escória dessa pirâmide social tosca e demente que a própria camada de baixo sustenta. Eu me sinto é muito bem por não ser aceita nesse convívio social de merda, por não poder sentar na praça onde essas mães pobres sentam com seus casais de filhos no domingo à tarde pra rezar a Deus e fofocar da vida dos outros. Me sinto melhor ainda em pensar que no fim das contas os maridos dessas mulheres gastam o pouco dinheiro que tem se masturbando na frente de uma das minhas meninas porque não tem dinheiro suficiente para pagar por uma foda. É justamente por isso que eu sorrio a cada nota contada. Eu já disse que nasci pra isso, não disse?! (desculpa se embolar um pouquinho no que eu falo, é que já estou um pouquinho bêbada [risos]).

Tenho que contar uma história aqui, né?! É pra isso que vocês me trouxeram?! Olha, eu tenho muitas histórias pra contar, já passei por muita coisa nessa vida (apesar da idade). Já estive (e já fiz sexo) em todas as duas capitais e em todas as outras cinco cidades desse país, eu realmente tenho muita história pra contar (inclusive se vocês quiserem posso voltar aqui uma outra hora pra contar uma outra história, não teria problema algum nisso). Mas acho que o momento pede uma história reveladora. Acho que sei bem qual história contar.

Eu tinha dezenove pra vinte anos e estava morando em Mármore (que é a cidade que fica entre as duas Capitais, pra quem não conhece a geografia desse país), numa casa de prostituição de uma senhora muito rica e muito influente da cidade. Eu (como sempre) era o destaque da casa, todos os homens da cidade sonhavam com meu corpo, isso fazia com que as outras meninas sentissem um pouco de inveja de mim, então nenhuma delas gostavam de conversar comigo (a não ser a Bella, que hoje em dia trabalha na minha casa).

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