Relatos comuns de vidas entre o cinza.

3. Memórias do Senhor Gregório.

Ter sessenta e cinco anos neste país não é mole, meus filhos. Estamos passando por tempos de mudanças muito grandes, de pouco em pouco caminhamos para ordem e o sossego, mas até que chegamos lá, muito sangue e lagrimas serão derramadas.

No meu tempo de juventude também passamos por momentos complicados, na verdade este país sempre esteve entre momentos complicados, nunca houve paz por aqui. Mas na minha juventude éramos diferentes. Quem se opunha ao governo eram os malandros truculentos que gostavam de beber cerveja nas esquinas e de transar com garotas de programa, não é igual hoje em dia que qualquer um pode se tornar um rebelde. Havia uma moral perante isso. Homens de bem eram homens de bem, trabalhadores, tinham suas famílias, cuidavam de seus filhos. Rebeldes eram descompromissados, agressivos, mau caráter, trombadinhas. Atualmente o mundo ta de ponta a cabeça e homens de bem se declaram rebeldes, rebeldes criam famílias e o governo explode os dois por nunca saber quem é quem de verdade.

Não que eu apoie o Chanceler Barbosa e seus aliados, eu só reconheço neles a autoridade que lhes foi concedida. Inclusive prefiro a maneira dele de governar do que a do Imperador Samuel de Souza. Os rebeldes de hoje pensam que sabem o que é viver em um governo rígido justamente porque não viveram na época do Imperador Samuel de Souza, aquele sim era casca dura. Hoje em dia o chanceler só impõe alguns toques de recolher, censura alguns programas na TV e controla o dinheiro de toda população. Além do mais, foi justamente o Chanceler Barbosa que trouxe a salvação econômica desse país com seu governo, se não fosse por ele, nós estaríamos completamente quebrados economicamente e destruídos, literalmente destruídos pela grande guerra. Não me envergonho de ter um quadro seu estampado na sala da minha casa.

(desculpa eu tenho que falar meu nome, é?! Ah sim, entendi) Sou o Gregório, Senhor Gregório para os mais íntimos. Sou o padeiro há trinta e cinco anos, casado, tenho dois filhos e três netos. Moro aqui em Mármore há quarenta e sete anos. Vim para cá depois que servi ao exercito com apenas dezoito anos de idade. Sou patriota e tenho muito orgulho de nosso país. Sou católico também, rezo todos os dias a missa de Padre Augusto na TV (acho que é só isso que tenho para falar de mim).

Olha, como sou uma pessoa muito bem vivida, guardo muitas histórias na cartola para contar. Vocês querem que eu conte algo mais intimo? Algo mais pesado? Mais leve? Acho que tenho uma que vai ser muito boa para esses jovens de hoje em dia entenderem melhor a história desse país, vou contar ela mesma.

Essa história aconteceu antes de começar esses dezessete anos de governo do atual chanceler. O nosso governante maior era o seu tio, o Coronel Carlos Brilhante. Carlos Brilhante foi nosso ultimo governante eleito por voto do povo, ganhou em maioria de voto nas duas capitais e nas cinco cidades. O povo estava desesperado pois todo o nosso continente estava sendo ameaçado pela Guerra das Ilhas e como éramos a menor de todas as ilhas, a promessa de que a aliança com a ilha de Pratos (que era é até hoje a ilha mais poderosa do continente) iria ser feita foi o que elegeu o Coronel Carlos Brilhante. Fomos para guerra aliados da ilha de Pratos e saímos vencedor. Nosso povo nunca foi tão feliz em uma escolha antes, e acredito que não conseguiu ser até os dias de hoje.

Nesta época eu já tinha mais ou menos quinze anos de profissão como padeiro, trabalhava na panificadora mais famosa país, a Panificadora Alfa. A fábrica era enorme e tinha quase uma centena de padeiros, todos eles fazendo pães para serem vendidos em todo país. Ganhávamos bem mas trabalhávamos muito, pois as leis trabalhistas eram muito diferentes das de hoje em dia. Eu passava o dia todo na fabrica, quase não tinha tempo para minha esposa e para os meus filhos. A situação era tão complicada que para fazer sexo de vez em quando eu tive arrumar uma amante dentro da fabrica, ai fazíamos algumas bobagens no banheiro da empresa nos horários de almoço (mas isso você corta na hora de colocar a história porque minha Margarida não pode ler uma coisa dessas em... [risos]).