Capítulo 4

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DESPERTAR 

Os soldados selecionados para acompanhar Krisna à Montanha das Grutas estavam paramentados com espadas, adagas, equipamentos básicos para a viagem como cordas, odres, sacolas, alimentos e caixas de primeiros socorros contendo longas tiras de tecido de algodão para enfaixar, bálsamos para feridas, além de unguento contra picada de insetos. Os soldados vestiam calças e blusas marrons, corselete de couro e casacos de pele que os protegeriam do frio intenso. Krisna cavalgava seu corcel negro, o Briônidas, seu companheiro de muitas viagens e algumas batalhas. Seguia à frente, junto ao capitão Roger por quem tinha grande afeição, pois sempre tinha uma palavra amiga nos momentos difíceis, tratando a todos com respeito independente do cargo que ocupavam. 

A temperatura caíra e um odor de sal marinho e terra molhada invadia as narinas dos viajantes. Krisna adorava aquela ilha e não suportava a ideia de que algo muito ruim pudesse macular seu paraíso. Trotavam velozmente sobre a estrada de terra,deixando um rastro de lama pelo caminho. 

Vez ou outra Krisna olhava para trás como se estivesse sendo seguida. No entanto, tudo parecia calmo, a não ser pelo som dos cascos dos cavalos no chão de terra e as batidas frenéticas de seu coração. Ela precisou usar de toda sua força de vontade para não deixar transparecer em seu rosto o temor que lhe invadia as entranhas. Seus soldados precisavam de confiança e coragem e ela não podia fraquejar. 

— Senhora? — chamou Roger. — Lá está a Montanha das Grutas. 

Uma extensa linha escura e repleta de buracos era o que se podia enxergar do ponto onde estavam.  

  — Estou vendo. Preparem-se, soldados. Deixaremos os cavalos escondidos e bem amarrados e seguiremos o restante do caminho a pé — ordenou Krisna que estava nervosa e transpirava muito. Usava uma larga calça de couro, camisa e luvas de lã,botas de couro que protegiam seus pés delicados do frio intenso do Invernoso e um casaco de pele de urso. 

À primeira vista, a Montanha das Grutas parecia um imenso queijo esverdeado cheio de buracos sobrepostos. O mato dominava o lugar e apenas em alguns pontos podia-se ver algumas árvores de galhos baixos e quase sem folhas. 

Um estrondo fez tremer a terra e quase os derrubou. 

— O que foi isso? — perguntou ela assustada com o barulho. 

— Malditos estrangeiros! Estão usando explosivos para extrair as pedras brilhantes — enfureceu-se Roger, sacando sua espada e rumando em direção a uma gruta onde se via uma nuvem de poeira saindo da terra. 

— Roger, volte! É perigoso! — gritou Krisna, mas seu apelo não foi ouvido devido a outro estrondo mais forte que o anterior. 

Cinco soldados que seguiram junto ao capitão voltaram trazendo seu superior ferido. Tinha sido atingido por uma pedra e fraturara o braço que antes segurava a espada. Krisna correu até ele e forçou-o a beber um líquido verde feito de ervas curativas, que amenizaria a dor que deveria estar sentindo. Enfaixou o braço ferido com as tiras de tecido, amarrando-as ao pescoço do soldado. 

— Meu bom amigo, por que foi se arriscar? Amos? — chamou virando-se para um soldado jovem, quase um menino, de cabelos negros presos numa trança que ia até a cintura. 

— Senhora — respondeu Amos, solícito. 

— Quero que volte para a aldeia e leve o capitão. Não há como tratar desse ferimento com o que trouxemos. Ele precisa de cuidados urgentes.

— Não, minha senhora, eu tenho que ficar! — queixou-se,tentando se levantar, o que só o fez gemer de dor. 

— Não está em condições de opinar, meu amigo. Amos, faça o que ordenei e avise Niso. Precisamos de reforços aqui. 

— Sim, minha Senhora. Dois soldados levantaram o capitão e o colocaram sobre o dorso de seu cavalo, que seria puxado por Amos de volta a aldeia. 

— Roger, cuide-se. Não se preocupe comigo. Farei como o planejado e aguardarei os reforços se necessário. 

— Desculpe-me por estragar tudo — disse Roger, abaixando a cabeça, envergonhado. Preferia morrer a deixar sua Senhora desprotegida. 

— Não há porque desculpar-se. Vá com Amos. Nós ficaremos bem. 

Krisna sabia que enfrentariam perigos quando chegassem à montanha, apenas não contava que seriam tão dolorosos. Ver o capitão daquele jeito partia-lhe o coração, mas não podia deixá-lo ficar. 

— Preparem-se, soldados, pois vamos subir a montanha.Iremos sem pressa, atentos a qualquer movimento. Se virem alguém, não ataquem a não ser que sejam atacados. Não viemos aqui para matar esses estrangeiros e sim para prendê-los e impedidos de continuar o que estão fazendo — orientou Krisna, que os separou em dois grupos. Cada qual seguiu um caminho que levava à entrada de uma grande gruta onde ocorreram as explosões. 

Um forte pressentimento deixou-a momentaneamente zonza. Olhou para trás ressabiada e nada viu de estranho. Sua boca estava ressecada e suas mãos tremiam apesar das grossas luvas. Nunca sentira algo assim. Parecia que a terra gritava em seus ouvidos lamentos de dor. Orou aos Deuses que a protegessem e a todos os anilianos. Como resposta a seus apelos, começou a chover forte, o que dificultou ainda mais a subida. 

Relâmpagos  rasgavam o céu e a terra começou a tremer violentamente. Por um segundo fugaz, Krisna vislumbrou um vulto se aproximando do sopé da montanha, às margens da estrada. Logo a seguir, amontanha rachou e todos caíram rolando. A última coisa que Krisna ouviu antes de desfalecer foi um ruflar de imensas asas, que foi se distanciando da montanha, até não se ouvir mais nada.

Fim do capítulo 4.

A Deusa de Anília e Outras Histórias (primeiros capítulos)Onde histórias criam vida. Descubra agora