sete

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Ela queria esquecer. Esquecendo, ela lembrava.

Era mais uma garrafa vazia sobre a mesa, mais cigarros jogados ao chão. Ela podia sentir o cheiro... Parecia real, ela queria que fosse, uma última vez, uma única vez, ela queria que fosse verdade.

As portas estavam fechadas, sua mãe chorava baixinho. Ela queria que fosse real, sabia que era um sonho, sabia que era terrível, mas ela os via novamente. Ela queria que fosse real...

Ele entrou por aquela porta, estava fechada, ela sabe que estava, mas ele a abriu tão facilmente.

Ele trazia uma garrafa na mão, uma camisa estava enfiada ali dentro, apenas uma gola manchada para fora.

Ele estava louco, olhos injetados, sorriso embriagado, veias pulsando, coração batendo tão depressa, socando, esmagando, chutando, cuspindo, mordendo, cortando seu peito...

Ela o temia, tanto, tanto... Aquela garrafa terrível, aquele líquido... Ninguém o podia parar, ele estava louco, louco, louco.

Ela gritou.

Sabia por que ele estava fazendo aquilo, ele não aceitava aquele não, ele nunca aceitava o não.

A gola da camisa na garrafa começou a queimar. Fumaça, fogo... Ele riu. Ela estava desesperada.

Sua mãe chorava, ela sabia, ela sabia que isso iria acontecer, ela sabia que iria morrer assim que o fogo chegasse ao líquido.

Três segundos...

Dois!

Ela correu, correu, correu...

Abriu os olhos, lágrimas desciam, rastejavam sobre suas bochechas...

Ela se sentia uma bomba, líquido inflamável preso naquele corpo vítreo.

Álcool, gasolina, molotov...

Ela queria queimar como naquela noite. Ela procurava por fogo. A bituca daquele cigarro maldito, um fósforo, a chama do isqueiro, lava de um vulcão abandonado.

Ela queria explodir. Isso a livraria daquelas memórias em chamas. Fogo contra fogo. Ela não tinha escolha.

Eu a tentei salvar. Eu a queria salvar... Eu tentei...

As chamas lambiam as cortinas, como em seus sonhos, como em suas lembranças...

Ela queria queimar as lembranças, uma por uma, ela queria matar os fantasmas. Ah, ela estava louca, assim como ele, estava louca...

Sua loucura não era injetada, nem inalada, nem comprimida... Sua loucura era igual a dele, ela queria matar alguém, alguém que a machucou, alguém que a fez sofrer, alguém que matou algo dentro dela... Ela queria matá-lo... E a si mesma.

Ela pediu pelo fogo, ela queimou.

Eu tentei ajudar...

Juro que tentei...

Tentei...

O que estava fazendo no quarto dela àquela hora?

Estava tentando, como sempre, tentando...

Mas não consegui, como sempre, não consegui...

Ela se foi. Ah, Deus... Satã, que seja! Ela se foi...

A libélula está livre agora. Livre, livre, livre. Como ela sempre quis.

MolotovOnde histórias criam vida. Descubra agora