Capítulo II

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Tento me concentrar em alguma coisa enquanto espero minha mãe voltar. Ouço mais barulho de bomba e estremeço, mas o êxtase insiste em viajar em pensamentos para fugir da realidade.

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Bato em uma porta e percebo como minha mão está pequena e cheinha. Espero um pouco e bato novamente.

- Papai? - Chamo. Ouço passos se aproximando em minha direção.

A porta se abre e meu pai que está de cabelos castanhos, como quando o via nas fotos do seu tempo de moçidade. Ele abre um largo sorriso e me ergue no ar me dando um beijo na bochecha em seguida.

- O que faz aqui meu anjo? - Me põe no chão novamente.

- Mamãe está lhe chamando para o jantar, papai. - Falo me inclinando para espiar o que havia dentro daquela sala.

- Ah sim querida. Diga pra ela que ja vou, está bem? - Diz ele segurando meu queixo pra desviar meu olhar da sala.

Era um local meio escuro por causa das cortinas, tinha as paredes pintadas de dourado e o assoalho um pouco sujo de terra, tinha uma mesa de madeira, em cima dela havia uma bandeja de plástico que tinha tubos de ensaio com brotinhos de planta encaixados nela. Era o local onde meu pai trabalhava e testava fórmulas, para manter a produção numerosa e de boa qualidade. Lembro daquele lugar... Mas é claro! O porão onde estou.

- Sim papai! - Ele parecia meio apreensivo por eu estar observando seus materias de trabalho.

- Então vá minha querida. - se agachou e depositou outro beijo carinhoso, agora em minha testa. E volta novamente para o porão fechando a porta.

Voltei saltitando para a cozinha. E planejei outra "visitinha" aquele lugar, mas não lembro de ter a feito realmente.

...............

- O que exatamente foi isso? - Falo comigo mesma. Estava confusa, isso foi estranho, uma lembrança recém descoberta. Chacoalho a cabeça ainda confusa.

- Raya? Raya! - Ouço minha mãe me chamar e corro para abrir a porta. - Entre filho, sente-se ali no canto. - Fala com John o empurrando para dentro e entrando também.

Tranco a porta e me viro para observá-los. Mamãe está abraçada a John no chão e me direciona um dos braços para que eu me junte à eles.

  - O que houve mãe? Cadê o papai? - Pergunto enquanto vou em sua direção e sou acolhida por seu braço livre.

Seu semblante que antes era de preocupada agora demonstrava um desespero controlado. Não me respondeu.

- Cadê o papai? - Pergunta John e seus olhos enchem de lágrimas que ameaçam cair.

- Está acontecendo uma revolta Raya, todos os homens decidiram, sem que o imperador soubesse, que iriam atacar o palácio para matar aquele tirano.

Tapo a boca surpresa, já sabia que isso iria acontecer alguma hora, mas não deixou de causar-me desespero pelo que pode acontecer com meu pai. Do jeito que o imperador governava deixava todos furiosos. Ele estava diminuindo drasticamente a quantidade de comida importada (todo o alimento era importado, os solos de Sasprim eram impróprios para o cultivo) e agora todos estavam passando necessidades, os que tinham as piores condições comiam restos do que era despejado do palácio, meu pai tentava ajudar o máximo de pessoas, mas obviamente não poderia ajudar todas. Enquanto o rei desperdiçava comida aos montes fazendo banquetes frequentemente para ele e seus apoiadores que também viviam no palácio, as famílias de Sasprim lutavam para sobreviver com suas migalhas.

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