Capítulo 1

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Em meio às ruas — que ora eram movimentadas mas agora estavam completamente vazias, — o vento frio se espalhava juntamente à neblina e os pingos gelados da chuva de Novembro. Sobre as sacadas e janelas das residências, foram colocados panos brancos com o símbolo da família real de Petroia, um leão-das-montanhas alado pintado de roxo e o fundo dourado, além do lema da família Swan. Da Leoa de Petroia se erguem as asas da esperança. O luto pouco a pouco assolava os cidadãos, que se aproximavam da praça principal de Storybrooke. Ali a cerimônia fúnebre se iniciava. Todos sabiam que o destino do recém falecido eram os braços acolhedores de Kikun, o Deus da morte e das passagens. Porque a morte para os petroianos não era nada além de uma passagem, uma transição. O que, obviamente não livrava a ninguém da dor da perda, principalmente os entes queridos que ainda restaram.

— Hoje, nós nos despedimos de um grande homem. Ele era bondoso e leal. Aquele que um dia se tornaria nosso rei. A família Swan chora, e com ela estamos de luto. O reino de Petroia jamais será o mesmo. Robin, duque de Locksley, leva consigo parte de nossa alegria. Que os Deuses permitam que sua alma descanse em paz. Aguardemos pelo seu retorno dentro do ciclo das vidas, onde o encontraremos novamente e celebraremos mais uma oportunidade na roda das reencarnações. — Sidney, braço direito e assessor da família Swan terminou o seu discurso inflamado.

Seus cabelos crespos estavam grisalhos, as rugas próximas aos olhos e as marcas de expressão no rosto negro eram os sinais que demonstravam o cansaço derivado de uma vida de trabalho e dedicação ao seu reino. A idade avançada chegava, e com ela um preço alto a se pagar. Perto dele estava George, o rei. Um homem sério e introvertido. Poucas vezes era visto em praça pública. Preferia passar seus dias recluso em seu gabinete no Parlamento do reino, ou na casa de campo com a família. 

No entanto, pela primeira vez ele chorava na frente da população inteira da capital. As lágrimas desciam incontroláveis. A tristeza dominava seu peito. Para George, enterrar um filho não era natural sequer aceitável. São os filhos que devem enterrar os pais. Mas ele sabia que a brevidade da vida humana não encerrava a eternidade da vida espiritual. Naquele mundo, nós estávamos apenas de passagem e George compreendia que Robin jamais deixaria de ser seu filho.

Mesmo assim, desejava trocar toda sua riqueza e glória para ter a companhia de Robin apenas mais uma vez. De seus quatro herdeiros, o mais velho era o mais próximo. Era inevitável que sua memória o atormentasse com os momentos mais marcantes que passara com o filho. As caçadas esportivas nos fins de semana, as transmissões dos jogos de Tacobol acompanhados dos amigos mais próximos e as doses de conhaque com café nas tardes frias de inverno. Tudo isso agora parecia distante e inacessível. Além, é claro, das inúmeras reuniões e sessões no parlamento, onde ele ensinara tudo que sabia ao príncipe.

Robin era o mais apto a governar o reino quando George finalmente renunciasse devido ao avanço da idade. Possuía alguns problemas cardíacos e o estresse da vida política o deixava ainda mais debilitado. Mas, depois da perda do herdeiro, deveria preparar Alexis às pressas. Ela era a caçula e única mulher dos filhos que restaram. George precisava ser rápido e assertivo, pois tinha apenas alguns meses para a abdicação ao trono. Na verdade, ele tinha uma segunda opção, muito mais apropriada e óbvia, mas seu orgulho o impedia que a escolhesse.

Ninguém da nobreza se pronunciou à imprensa, que ficou aglomerada no portão onde aconteceu o processo de cremação e recolhimento das cinzas do príncipe. Não fazia mais parte da cultura moderna petroiana tal ritual, mas Robin tinha sido categórico quando adicionara a cláusula ao seu testamento. Sua vontade era ser guardado próximo aos túmulos de seus avós, seguindo os costumes milenares de seus Ancestrais e isso fora respeitado. Quase todos os componentes da família real mantinham suas tradições, diferente dos petroianos mais comuns. O processo de cremação acontecia, antigamente, numa pira feita de madeira sagrada e o falecido coberto de ervas para que se misturassem ao odor do corpo queimado.

A Leoa e a CorujaOnde histórias criam vida. Descubra agora