Breno

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Ronan me equipou com um par de óculos de Ski azul fluorescente e segurou minha cadeira. Juntos enfrentamos a neve forasteira de Fishers que piorava a cada esquina. Engoli tantos flocos de neve que em certos momentos havia me engasgado. Passamos por algumas esquinas que faziam a pressão do vento piorar e em alguns momentos tive que ajudar Ronan a empurrar a cadeira. Um tempo depois, o vento havia dado uma trégua para outro round.

—Então, — Ronan falou tirando o gorro da cabeça e balançando os cabelos com as mãos — Você é tão amado, que seus tios preferiram passar o Natal com laticínios do que com você. Qual é a sensação?

—Cala a boca. — falei rindo.

Passávamos por uma rua íngreme e solitária, com apenas uma plantação de quilômetros de arroz como companhia. A plantação qual já estava coberta de neve. Ronan passava a mão em cada raiz para fazer a neve cair. Parecia se divertir.

Neve. O que é neve no sentido literal? — falou entre os dentes. Sabia que um discurso muito sem sentido estava começando. — Neve é algo bom ou ruim? Por que as crianças sorriem quando brincam com elas, mas sofrem quando não querem brincar, mas são obrigadas a passar por uma tempestade horrível para salvar o Natal do melhor amigo?

—Você não é uma criança. — falei.

—No sentido literal?— ele respondeu, e recebeu de mim uma pequena bola de neve nas costas.

A plantação gelada de arroz, cercava algumas casas do lado leste que pareciam trailers de tão estreitas que eram. Todas tinham o mesmo padrão de uma janela e uma porta de madeira escura, porém todas as pequenas casinhas tinham cores diferentes e Ronan me guiava até a de cor azul. Sua casa.

Eu já tinha ido algumas vezes para a casa de Ronan. Ele dizia que ali era o Brooklyn de Indiana, pois todos os seus moradores eram negros. Não era diferente do meu bairro esteticamente; Não havia casas luxuosas enfeitadas, os vizinhos dividiam os jardins e no centro de uma das casas, havia um pinheiro de árvore de Natal bem modesta.

—Foi o Sr. Merryweather que insistiu que colocássemos — falou apontando para o pinheiro. — Ele se acha o dono daqui. Disse que não somos um bairro branco, mas somos tão melhores quanto eles e nossa árvore deveria ser a melhor. Meio idiota, né? Sempre soube que era melhor que Hugo mesmo.

Ele riu e eu acompanhei. Não falávamos com Hugo, mas desde que ele escondeu meu uniforme de Educação Física na última semana de aulas, Ronan faz questão de usar seu vocabulário maldoso com ele.

Passamos pelo pinheiro do sonho americano e chegamos até a casinha azul. Estreita e com um balanço velho do lado. A grama já era rala, e com a neve espalhada me sentia em uma pista de patinação de gelo. Ronan destrancou a porta pesada e pôde sentir logo o cheiro de biscoitos de gengibre sobre a sala.
Era um cômodo espaçoso, com uma mesa larga do lado e uma sala de TV com vários quadros bordados a crochê. Parecia até um museu com tanto de pequenas bugigangas.

Mãããe. Cheguei vivo. — Ronan gritou e se jogou no sofá. Me aproximei dele fazendo de tudo para não bater em nada que fosse aparentemente quebrável.

Uma senhora gordinha com avental de rena e um sorriso acolhedor no rosto entrou na sala. Ela tinha um cheiro de baunilha e de mãe. Eu adorava dona Jane. Nas raras vezes que eu ia para casa de Ronan depois da aula pra pegar o vídeo game, ela me oferecia uma fatia de torta de mirtilo e eu acabava ficando pro jantar. Era tão simpática quanto o filho.

—Breno! Amém que deu tudo certo. — falou se aproximando e dando um beijo na minha testa. — Preciso tentar ligar pro seus tios para avisar que você chegou bem.

Amor Sobre Rodas - Um Conto De NatalOnde histórias criam vida. Descubra agora