"Quando um tragédia acontece, procuramos alguém para nos livrar da nossa própria dor, e quando não encontramos culpamos aqueles próximos de nós". Downton Abbey
-Você está em um processo de negação – Disse o psicólogo.
Esse homem me irritava mais que meus pais com sua constante atenção.
-Tudo bem – Eu respondi.
Tudo que ele dizia eu sempre conseguia ver duas interpretações, nesta eu vi como algo bom de se fazer no momento.
Eu fui embora ainda mais irritada do que cheguei. Desde que sai do hospital tenho ficado muito irritada, não só por toda situação, mas pelas noites mal dormidas. Eu não tinha flash do que ocorreu, mas em todas as noites desde então tenho acordado por que estava sufocando. Apenas essa sensação horrível ficou cravada em minha memória, atormentando-me durante as noites.
Mais difícil que lidar com meus próprios demônios foi lidar com as pessoas.
Obviamente o que aconteceu foi parar na mídia, eles não mostraram meu nome ou meu rosto, mas deram tantas informações sobre mim e Luiz, que quem nos conhecia soube na hora o que passamos.
As pessoas publicavam em minha página no facebook, com mensagem de apoio e revolta, compartilhavam minhas fotos como símbolo de luta. Isso me fez querer morrer.
Eu não queria que ninguém soubesse. É vergonhoso, humilhante demais. Eu queria esquecer tudo que aconteceu, mas as pessoas não deixavam, um lembrete constante de tudo que eu passei, revivendo minha angustia.
Exclui todas as minhas redes sociais.
Nunca soube o quão importante era minha liberdade, até perde-la.
Recebi um mês de afastamento do trabalho e agradeci muito por isso. Tinha que sumir por um tempo, até que as pessoas esquecessem do ocorrido e logo outra tragédia ocupassem suas mentes.
Além das noites mal dormidas, do mal humor e segundo meu psicólogo "processo de negação", passei a ter crises de ansiedade e logo estava tomando inúmeros remédios de tarjas pretas. É tão fácil essa medicalização! Ir ao psicólogo ele dizer seus problemas e passar remédios como se fosse a solução.
Como se o remédio fosse acabar com as minhas lembranças, com meu medo, com o que aconteceu. A única coisa que ele fazia comigo é me atordoar o suficiente para que eu não pensasse no problema e também em nada ao meu redor, acabando com meu organismo em compensação.
Eu odiava tudo isso.
Decidi ir para o nordeste, no Ceará, aproveitar as praias, ir para longe da mídia do Rio. E foi o que eu fiz. Fiquei um pouco mais de duas semanas lá e foi isso que me ajudou.
Eu mandei um e-mail para o Luiz dizendo apenas que ele precisava sumir durante um tempo, nunca obtive resposta e nunca mais falei com ele desde então. Isso não me deixou magoada, eu não era egoísta, ele precisava lidar com o sofrimento da forma que ele achasse melhor e se está maneira é longe de mim, que assim seja.
Não acredito que possamos ficar juntos novamente, não depois do que aconteceu.
Eu mudei bastante durante este curto período, em todos os sentidos. Tirei os apliques loiros e pintei o cabelo de preto, comecei a usar os óculos em período integral. Não sei se pela minha nova aparência, mas parecia mais velha, mais séria.
Voltei para o Rio três dias antes de começar a trabalhar.
***
Estava passando pelo meu quinto paciente do dia quando recebi flores do pessoal da radiologia.
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Causa et effectus
Mystery / Thriller"Para toda ação existe uma reação de força equivalente em sentido contrário". A vida de Cecília, Luiz e Marcus nunca vai ser a mesma, suas ações vão demostrar exatamente como tudo pode caminhar errado e voltar aos eixos para quem merece, pelo menos...