Capítulo 3

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Quando Miriam percebe o vendedor caminhando diretamente em sua direção, a primeira reação é tentar formular rapidamente desculpas para não comprar nada.

— Não tenho dinheiro.

— Sou alérgica a amendoins.

E, é claro, havia a opção natural de falar apenas a verdade:

— Tenho nojinho, porque não faço ideia das condições de higiene na produção desses pacotinhos que você tem aí. Sem ofensas, mas você não me parece exatamente alguém que tomou banho... alguma vez na vida.

Mas à medida que o Papai Noel empreendedor se aproxima o suficiente, as palavras apenas somem, porque não lhe parece que esteja absolutamente interessado em vender alguma coisa para ela. Ele apenas fica de pé diante dela, projetando uma sombra que envolve toda a moça, sem dizer coisa alguma.

— Posso ajudar? — Ela arrisca finalmente, erguendo o corpo com os antebraços apoiados na toalha.

Henrique apenas ajusta a postura, projetando os ombros numa diagonal que lhe permite equilibrar o pedaço de madeira sobre o trapézio com apenas uma mão, e puxa a barba sintética para o pescoço. Miriam evita esboçar uma reação correspondente ao que sente quando o rosto jovem e bronzeado do rapaz é revelado, a linha mandibular definida e larga, com uma pequenina ondulação bem no meio do queixo, como uma covinha, e um sorriso maroto digno de ser emoldurado. O começo de uma barba natural castanho-escura desponta e lhe passa a impressão de que aparenta ser mais velho do que realmente é.

— Desculpe. Esqueci o que ia falar. — Ele diz, retirando o gorro com a mão livre e, com isso, liberando seu cabelo castanho escuro e molhado de suor numa cascata sobre seu pescoço.

— Ho, ho, ho? — Miriam sugere, erguendo as sobrancelhas e demonstrando, de forma condescendente, que analisa o figurino do rapaz de cima a baixo. Não quer ser exatamente chata, mas aprendeu desde muito nova que mostrar alguma espécie de desprezo e superioridade é uma forma legítima de flerte para boas moças.

— Engraçada. Você é hilária. — Ele diz, erguendo apenas uma sobrancelha e um canto de sua boca. De repente, surge em seu olhar uma determinação, como se tivesse acabado de ter uma ideia. Então, voltando a segurar a madeira com ambas as mãos, começa a fazer uma espécie de coreografia. Dois passinhos para um lado, um chute no ar, dois passinhos para o outro e a mesma coisa, salpicando areia para todos os lados. — Nunca viu um Papai Noel na vida?

Miriam imediatamente olha para os lados para verificar se não há, por acaso, ninguém que conhece ao seu redor assistindo a esse espetáculo constrangedor. Aliviada por não receber a atenção de ninguém, responde no mesmo tom de condescendência:

— Um Papai Noel eu já vi. Um Papai Noel dançarino na praia é novidade.

Com cuidado, Henrique deposita a mercadoria no chão e se acomoda diante dela, bem em cima de onde estava antes o desenho na areia.

— Ei, ei, o que você acha que está fazendo?

Ele estende uma mão.

— Só me apresentando. Henrique, prazer.

— Você não se acha meio folgado, não? — Diz, empurrando o tronco para a frente, para sentar-se de forma correta, assim como ele.

— Acredito que esteja sendo bem-educado. — Diz, ainda com a mão estendida no ar, aguardando a reciprocidade no cumprimento. — E você?

Miriam gira os olhos e o cumprimenta de volta, as mãos grudando com suor e areia, estranhamente agitada e nervosa com esse encontro, mas evitando demonstrar qualquer emoção. Henrique pode parecer um ator de Hollywood, mas isso não quer dizer que não seja perigoso. Ela pode ver na lacuna entre barba e a jaqueta vermelha entreaberta os contornos de um peitoral definido, coberto por uma regata branca, fina e encharcada. Seu impulso inicial é expulsá-lo, mas existe algo em sua aparência que a atrai de uma forma extraordinária. Além disso, estamos na temporada natalina, um tempo mágico onde coisas incomuns acontecem. E não era esse o seu desejo mais profundo? Mágica?

LET IT SNOW - Um conto de Natal brasileiroOnde histórias criam vida. Descubra agora