Capítulo 1

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Lauren

Da sacada podia ver o azul do oceano se estender até tocar o céu. A brisa marinha jogava meus cabelos para trás, a vista e o cheiro do lugar me traziam lembranças. Era um meio sem fim até agora, um jogo abandonado implorando por atenção.
Mas eu o deixara, seus gritos já não tinham a mesma altura.

Deixei a varanda e afundei no sofá macio da sala. Da minha sala.

- Lauren. - Olhei para Clara, que, sem desejar esconder sua satisfação, ria das minhas reações. O som de sua risada sincera me fizera falta, a encarei sorrindo.

- É tão bom estar aqui... Esse apartamento me traz esperanças em um recomeço, embora habite minhas mais terríveis e antigas memórias.

Ela me olhou com seu sorriso de mãe. O sorriso que todas as mães dão para seus filhos quando estão felizes com eles.

- Vai dar tudo certo, Lauren. Eu confio em você e você pode confiar em mim.

- Eu confio, mãe. A propósito, você me levará até a faculdade amanhã?

- Sim. Depois, passarei uma semana na Geórgia para que você se sinta segura. Mas acho que não teremos contratempos. - Ela se esforçava para esconder a saudade que sentiria. Após quase um ano esperando a filha sair de um hospital psiquiátrico, ter que se despedir em menos de dois dias seria um martírio até para o mais alheio dos corações, mas não tínhamos escolha.

A ideia de um ambiente novo me animava, mas despedir-me mais uma vez seria difícil. Durante o longo ano que passei no hospital, em cárcere, Clara provara ser uma mãe incomparável e, naquele momento, ela era tudo para mim.

Eu era uma pessoa diferente, me encontrei onde muitos se perderiam, em paredes brancas e dias hostis, longe de tudo que eu conhecia. Mas, às vezes, o caminho para se encontrar, é perder-se. Havia tanta coisa que eu queria ver com novos olhos, inclusive os fantasmas do passado.

Abracei Clara.

- Vai ficar tudo bem. - Senti uma lágrima quente escorrer por minhas costas. - Você estará sempre comigo e eu, com você. Te mandarei mensagens, te relatarei meus dias, enviarei desenhos e até poemas... - Ela sorriu em meio ao choro.

- Eu sei. É que... - Seu olhos verdes imploravam para que eu permanecesse em segurança. - É díficil.

- Eu sei, mãe. - A abracei mais uma vez. - Me desculpa por causar isso tudo, prometo remediar em um futuro próximo. - Tentei animá-la.

- Não coloque a culpa em si. - Pediu.

Dei um beijo infantil em sua bochecha, como faria uma criança de dez anos ao receber um sorvete de chocolate.

- Vamos ao cinema. - A convidei.

Ela concordou com a cabeça e alcançou as chaves.

Eu havia lido muito. Me esforçara para ocupar todo o tempo naquele lugar que tenta nos incitar a loucura. Consequentemente, eu tinha encontrado um posicionamento político pelo qual lutaria e, finalmente, me convencera terminantemente de que gostaria de cursar arquitetura. Também tinha evoluído em controlar impulsos e criado uma empatia antes oculta no meu caráter.

Passando pela avenida, eu observava a paisagem convidando pensamentos para invadirem minha mente.

Ela ainda me amava?

Me lembrei das palavras de Eduardo Galeano, não hesitando em concordar mentalmente com o escritor. Eu me conhecia bem, mas a memória sabia mais de mim do que eu, talvez não perdesse o que merecia ser salvo.

Someone New [ 2 Temporada de Confused ]Where stories live. Discover now