17. PULE, COELHO

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Os minutos se passaram com dificuldade, como se quisessem me torturar. Eu já estava ansioso para ver a tal "transição", Victor só piorou tudo quando me perguntou se eu tinha medo dos monstros. Ora, é claro que eu tinha. Um etéreo matou o meu melhor amigo, outros deles invadiram o orfanato da minha antiga fenda. Vamos dizer que parte da minha maldita desgraça tem o nome deles estampado.

- Está pronto, Enoch? - Emma sussurrou.

Estávamos escondidos atrás de um arbusto ornamentado. Tinha a forma de um homem apontando para o céu, que atendia pelo mome de Adam. Acho que nunca vou entender o porquê, talvez alguma referência artística. O único universo artístico que me atrai, porém, é o da vida, cheia de pinceladas bucólicas e engenhosas, até que se acabe com as garras peçonhentas da morte.

A senhorita Peregrine estava lá em pé, encarando o absoluto nada. Ela parecia destemida, apesar de eu não entender a maioria de suas feições. Ela era misteriosa, assim como Pearl von Jayne sempre foi. Nossa atual mentora pegou um relógio de bolso, o que ela carregava quando nos recebeu. Alma olhava para ele a cada 5 exatos segundos.

- Quando a coisa toda vai acontecer? - Perguntei, copiando o tom de voz da garota de fogo. Ela teria mostrado sua peculiaridade minutos atrás, quando fomos banhados pela escuridão. Quase acordei alguns dos syndrigasts com o meu grito de surpresa.

- Daqui a alguns segundos. - Respondeu, sem tirar os olhos da ave. Eu perguntaria como ela teria tanta certeza disso, mas logo desisti quando ouvi barulhos semelhantes a rugidos de um motor.

- Esses são...

- Os monstros. - Victor concluiu meu pensamento.

Estava ainda mais ansioso, meu coração batia com muita força. Mesmo sem ver os etéreos, eu estava nervoso. Apesar dos barulhos agonizantes que os etéreos emitiam, Alma não poderia permitir que as outras crianças ouvissem. Para abafar os grunhidos, ela carregava uma velha e elegante vitrola que tocava uma melodia simbólica, pelo menos para mim.

Sim, eu conhecia a música. Era a que Pearl cantava a maioria das noites para seus filhotes dormirem.

Pule, coelho, pule, coelho, pam, pam, PAM!
Bum, bum, BUM, fazem o fazendeiro e seu pistolão.
Por isso ele não vai comer esse coelho,
Pule, coelho, pule, coelho, PAM!

- Enoch, abaixe-se! - Bloom exigiu, nem tinha percebido que meu queixo estava tão erguido.

No exato momento, cerca de 8 aviões cortaram o céu, deixando um rastro mórbido e amargo de fumaça. Imaginei que fosse algum tipo de gás tóxico que, felizmente, não chegou a nos atingir. Cada um possuia uma espécie de suástica negra em seu corpo, evidenciando a prepoderância de um tal de Hitler.

Depois de assistir atordoado ao "espetáculo", vi Alma girar, delicadamente, o mecanismo de corda do objeto metálico. À medida que ela o fazia, a paisagem mudava de figura. Não era mais noite. Não havia mais monstros, nem sequer aviões ou bombas, que ameaçavam cair sobre nossas cabeças. Tudo estava tranquilo demais, como se nada houvesse acontecido. A música já estava em seu fim.

Na fazenda, nenhum pobre coelho
Vai se dar mal. Porque eu os agarro
Eles brincam e saltam, seja lá onde eu perambule
Então pule, coelho, pule, coelho, pule, pule, PULE!

- E então, gostaram, crianças? - Engasguei-me assim que Alma fez a pergunta.

Ela esbanjava um sorriso irônico e mantinha os braços repousados na cintura. Ela mal tinha virado a cabeça para nós, nem entendi como ela nos percebeu. Victor e Emma se escondiam ainda mais e balbuciavam palavrões. Rendemo-nos e saímos das costas de Adam.

RISE ;; enoch o. ( ✓ )Where stories live. Discover now